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Perenialistas Transcendencia-Imanencia

sexta-feira 29 de dezembro de 2023, por Cardoso de Castro

  

PERENIALISTAS — TRANSCENDÊNCIA E IMANÊNCIA

Frithjof Schuon  : O ESOTERISMO COMO PRINCÍPIO E COMO VIA

    • O esoterismo, por suas interpretações, revelações e operações interiorizantes, tende a produzir a objetividade pura ou direta; esta é a sua razão de ser. A objetividade explica a imanência e a transcendência, sendo simultaneamente extinção e reintegração. Nada mais é senão a Verdade, na qual sujeito e objeto coincidem e o essencial prevalece sobre o acidental — ou na qual o princípio antepõe-se à sua manifestação -, extinguindo-o ou reintegrando-o, conforme os vários aspectos ontológicos da própria relatividade.
    • Por outro lado, o aspecto de identidade é o da continuidade entre o centro e a periferia; consequentemente, distingue-se do aspecto de analogia como a estrela se distingue dos círculos concêntricos. A manifestação divina à nossa volta e em nós mesmos prolonga e projeta o Princípio e com este se identifica precisamente sob o aspecto da qualidade divina imanente; o sol é realmente o Princípio percebido através dos véus existenciais; a água é, de fato, a Passividade universal percebida através desses mesmos véus. Quanto ao conhecimento, não basta que essa relação seja simplesmente pensada para conferir ao raciocínio um caráter de divindade, portanto, de verdade e de infalibilidade. É certo que, objetivamente, todo pensamento manifesta — sob o aspecto metafísico de identidade — o Pensador divino, se assim podemos nos expressar. Mas esta situação puramente objetiva e existencial, ontológica, se quisermos, é absolutamente geral e mantém-se fora das diferenças qualitativas, de forma que nada tem a ver com a realização subjetiva e cognitiva do aspecto de identidade. Dissemos que, no conhecimento racional ou mental, as realidades transcendentes apreendidas pelo pensamento estão separadas do sujeito pensante; ou, no conhecimento propriamente intelectual, ou feito pelo coração, as realidades do Princípio, que são apreendidas pelo coração, prolongam-se na intelecção; há unidade entre o conhecimento pelo coração e aquilo que ele conhece, sendo o conhecimento como um raio de luz ininterrupto.
    • Como falamos aqui de desvio intelectual, mencionaremos, nesta oportunidade, duas obscurações notórias da perspectiva esotérica, ou seja, a idolatria e o panteísmo, ambas oriundas da ideia de imanência em detrimento da transcendência e ambas comportando protótipos legítimos que, aliás, coexistem com os desvios, e deve-se tomar cuidado para que não sejam com eles confundidas.
    • Aliás, esse conceito, ou simbolismo, está de acordo com o emanacionismo dos gregos, desde que seja considerado segundo a sua própria intenção e não segundo o raciocínio criacionista dos semitas, que é refratário ao mistério da imanência — isto é, da relação de continuidade entre a causa e o efeito — e, por conseguinte, projeta naturalmente a atividade divina no tempo humano. A criação torna-se, então, um acontecimento histórico e um fato "gratuito", isto é, um fato isento das necessidades ontológicas enraizadas na Natureza divina. Na metafísica integral, a dificuldade é assim solucionada: por um lado, o aspecto evidente da descontinuidade entre Deus e o mundo não exclui o aspecto não menos evidente — mas infinitamente mais sutil — da continuidade; por outro lado, a Liberdade divina não pode excluir a perfeição de Necessidade, ainda mais que esta não exclui aquela, segundo as relações exigidas pela natureza de Deus.
    • A gnose é de natureza crística no sentido de, por um lado, estar relacionada com o Logos — do Intelecto simultaneamente transcendente e imanente — e de, por outro lado, ser uma mensagem de interioridade, portanto, de interiorização.
    • Esotericamente falando, há apenas dois pontos de vista a considerar: o da transcendência e o da imanência; conforme o primeiro, a realidade da Substância anula a do acidente; de acordo com o segundo, as qualidades do acidente — começando pela sua realidade — só podem ser as da Substância. Exotericamente falando, o primeiro ponto de vista é absurdo, visto que as coisas existem. E o segundo é ímpio; trata-se do panteísmo, visto que as coisas não podem ser Deus.
    • A transcendência torna o Véu espesso; a imanência torna-o transparente, no mundo objetivo ou em nós mesmos, em virtude de nossa conscientização quanto à Essência subjacente, embora, de um ponto de vista bem diferente, a compreensão da transcendência é um fenômeno de transparência, ao passo que o usufruto natural do que nos é oferecido em virtude da imanência é, evidentemente, um fenômeno de espessura.
    • Vem, a seguir, o segundo ternário, constituído pela Transcendência, pela Imanência e pela Manifestação: essas hipóstases diferem das anteriores pelo fato de pressuporem o mundo. Com efeito, a Realidade divina só pode ser transcendente e imanente em relação ao mundo que ela supera e no qual, ao mesmo tempo, penetra; além do mais, ela só pode manifestar-se num mundo que, por definição, já é manifesto. Esse último elemento, a Manifestação divina ou a Teofania, é o reflexo direto do Princípio no cosmo — são as diversas aparições do Logos — e encerra o desdobramento dos aspectos divinos ou das Hipóstases.
    • A inteligência discerne horizontalmente entre o essencial e o secundário, entre o bem e o mal e, verticalmente, entre o real e o ilusório, o absoluto e o relativo, a substância e o acidente, o permanente e o impermanente. E contempla o real ou o absoluto do ponto de vista da transcendência ou da imanência: ela concebe o real divino além das coisas, ou, pelo contrário, nas coisas, na medida em que estas o manifestam.
    • Em outras palavras, a alma percebe ou realiza a Presença divina hic et nunc, em sua própria relatividade existencial, ao passo que a inteligência e a vontade tendem a atravessar o plano da existência para atingir o Princípio transcendente ou imanente.
    • Em resumo, admitir, aliás, compreender a transcendência do Criador é reconhecer sua imanência nas criaturas.
    • Por um lado, nada se assemelha ao Princípio transcendente e, se existisse apenas esse aspecto da verdade total, o homem deveria renunciar a tudo. Mas sua própria existência prova que a verdade comporta um outro aspecto, o da participação, o que nos permite acrescentar: por outro lado, tudo manifesta o Princípio — que é imanente, permanecendo transcendente — sem o qual nada existiria. Consequentemente, se por um lado existe a opacidade das coisas que nos obriga a procurar Deus além delas, por outro existe a sua transparência, que nos permite aceitá-las procurando Deus; aceitá-las precisamente na medida em que são objetiva e subjetivamente transparentes e não de outra forma. Isto significa que o homem que ama a Deus com sinceridade tem, contudo, o direito de amar uma criatura "em Deus", não contra ele. Ser humano e viver na relatividade não é trair a sinceridade que devemos ao Absoluto.
    • O dilema dos moralistas, limitados pela alternativa do "branco ou negro", resolve-se metafisicamente pela complementaridade entre a transcendência e a imanência.