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Abellio (SA) – A processão das Sephiroth

domingo 12 de setembro de 2021, por Cardoso de Castro

  

Tradução

Tomamos emprestado as palavras de emanação e de formação à tradição hebraica, mas esta, sempre em uma acepção exotérica, e como se o céu, a terra e o inferno fossem mundos distintos, fala a este respeito de «mundos» e não somente de modos. Esta distinção linear não é ela mesma senão o efeito de uma mundanização: toda religião acaba por degradar sua metafísica em moral a fim de transformar sua ciência secreta em meio de governo, e ela substitui às correlações, relações de linearidade. Antes de ir mais adiante, nos é necessário a princípio assinalar que não é somente de dois mundos que fala a tradição cabalística, mas de quatro, que são na ordem aqueles da emanação, da criação, da formação e da ação. Aqui também, se trata bem entendido de modos do mundo e não de mundos distintos: esta «hierarquia» é aquela da construção dita sefirótica e, dada sua importância, convém aí tomar tempo.

A construção sefirótica, ou Árvore das Sephiroth, que é provavelmente, e ainda mais que o Yin-Yang chines ou o selo de Salomão  , o ideograma teogônico o mais «oculto» da gnose, se apresenta na Cabala   como a superposição de três triângulos sobrepondo um ponto isolado, cada uma das arestas destes triângulos constituindo, assim como este último ponto, uma «sephirah». Há portanto ao todo dez sephiroth, a palavra «sephiroth» sendo o plural de «sephirah». Se compreenderá logo que esta construção, que se propõe representar a processão teogônica, não é em realidade senão o véu atrás do qual se oculta a constituição estrutural desta mesma teogênese, e que, nesta última, não é finalmente dez sephiroth que se deve contar, mas trez, quer dizer a estrutura do duplo senário-septenário simbolizando os pequenos mistérios e velando por sua vez aquela dos grandes mistérios.

Como quer que seja, o triângulo superior é dito representar o mundo da emanação, o triângulo intermediário, aquele da criação, o triângulo de baixo, aquele da formação, e o ponto isolado sob o conjunto, ele somente, o mundo da ação. A notar que a primeira sephirah é designada sob o nome de Kether, o que significa Coroa e evoca consequentemente a ideia de topo. Em realidade, acima de Kether, figura o Ain-Soph, ou o Indeterminado. Mas o Ain-Soph não é uma sephirah. Se mantém acima da Unidade representando o par Pai-Mãe como aí se mantém o símbolo do Indeterminado, que ∞/∞, ao qual não se poderia designar nenhum nível. A notar reciprocamente que não é a última sephirah que constitui a base do conjunto, é esta que se chama Yesod, o que significa Base, e não tardaremos a compreender porque.

Se se dispoe assim o Ain-Soph acima do Kether, a última sephirah, aquela do extremo inferior, denominada Malkouth, se torna a homóloga inversa do Ain-Soph em relação à construção triangulada propriamente dita.

É necessário explicitar o sentido desta superposição simbólica.

Já dissemos que o modo da emanação é aquele da visão transcendental, e que o «céu» e o «inferno» não resultam de outra coisa senão da projeção desta visão, onde o tempo é abolido, em uma visão imaginária e ingênua. O céu e o inferno são assim modos abstratos do mundo, a visão ingênua do que se passa, aos olhos da visão natural, para um extra-mundo. Definiremos como segue o «mundo» da emanação: um modo de processão que a cada estase contém o todo e cujo todo pode sair por ek-stase sem o empobrecer, e, reciprocamente, um modo de processão do qual cada ek-stase é exterior ao todo e pode reentrar nele enquanto estase, sem o enriquecer. É portanto o modo da visão absoluta. É a melhor ilustração do princípio da indivisibilidade da substância. Assim como o sabor da manteiga é inteiramente contido em cada parcela do tablete de manteiga e, reciprocamente, que cada parcela tem o gosto de todas as outras sem delas nada tomar nem nada lhes dar, assim como o mundo da emanação nos aparece como gerando uma participação simultânea de todos em tudo, uma repetição do todo em uma infinidade de parcelas que são cada uma o todo. A este conjunto de propriedades, reconhece-se que não pode ser senão a ideia do senário imanente a toda existência especificada. O modo da emanação sai da unidade divina e reentra nela como o senário sai de seu centro transcendental e aí retorna; é aquele da organização senária enquanto invariante absoluto de toda manifestação. Pode-se dizer que é o «mundo» das ideias-números. Isto será precisado em breve. Mas decorre que este «mundo» não é visto como empíreo separado senão na visão ingênua. As ideias-números são inseparáveis da totalidade de sua processão, quer dizer da dialética terrestre que as inclui no mundo único da manifestação.

Da mesma forma, assim como a visão chama o ato, o modo da emanação chama um correlato formativo. O modo da formação é aquele da temporalidade. A cada etapa da processão crística, a terra enquanto fruto se encontra então a integrar uma visão do céu enquanto germe de uma terra ideal mais avançada e uma visão do inferno enquanto casca (ou dejeto) de uma terra já superada. A tradição pode dizer que há sete terras e sete céus, posto que há junto sete estase ou ek-stases, a sétima confundindo a princípio o último céu e a última terra na unidade sem clivagem da deidade. Bem entendido, esta introdução da cronologia no céu e no inferno resulta de uma visão terrestre, ela não é visão absoluta. É que com efeito não se pode falar do céu ou do inferno senão por conta de uma visão terrestre. O céu nem inferno não se conhecem enquanto tais. Não haveria céu ou inferno se não houvesse terra para os imaginar, e o céu e o inferno não são senão suportes dialéticos da frutificação da terra como mundo completo. Visto da terra, o jogo das ideias no céu e das formas no inferno, se se quer aí inserir a cronologia, é como um jogo imaginário, um espetáculo teatral presentificando o drama que será preciso reviver sobre a terra em presença real e não em presentificação.

Estas definições postas, que significam os «mundos» da criação e da ação?

Se a emanação se relaciona ao modo da sincronia e a formação ao modo da diacronia, a criação não senão relacionar à gênese que serve de «passagem» entre estes dois modos no mundo, a ação se relacionando ao apocalipse infernal que serve de «passagem» entre o mundo único e a deidade, fora do mundo. A criação marca a transcendência «intra-mundana»; a ação, a transcendência «extra-mundana» integrando a precedente e a transformando em imanência da deidade no mundo. A criação é a estase de partida fora da deidade; a ação, a estase de retorno. A primeira toma o aspecto de um exílio do Filho «fora» do céu, a segunda de um retorno do Filho «através» dos infernos. A criação é o «nível» ou o «momento» da separação e da encarnação; a ação, o «momento» ou o «nível» da comunhão e da transfiguração. Como a ação se situa sob a terra, em «baixo» da escada dos mundos, a tradição é coerente quando fala da descida aos infernos do Filho. O Apocalipse é o casamento do Filho com a nova Jerusalém, outro símbolo da Filha. A emanação e a formação são portanto ao mesmo tempo envelopadas e separadas pelas duas estases da criação e da ação, elas dela são as ek-stases e reciprocamente. Não encontramos aqui outra coisa senão modelo de uma correlação senária geral, e a relação que existe entre a deidade, a emanação (céu) e a formação (terra), por um lado, a deidade, a criação (gênese) e a ação (apocalipse ou inferno), por outro, é aquele que confronta as três ek-stases de todo ato existencial em modo esférico aberto, o mistério da deidade residente justamente no fato que ela é ao mesmo tempo dualidade de estase e de ek-stase na unidade de um só olhar.

Original

Nous avons emprunté les mots d’émanation et de formation à la tradition hébraïque, mais celle-ci, toujours dans une acception exotérique, et comme si le ciel, la terre et l’enfer étaient des mondes distincts, parle à ce sujet de « mondes » et pas seulement de modes. Cette distinction linéaire n’est elle-même que l’effet d’une mondanisation : toute religion finit par dégrader sa métaphysique en morale afin de transformer sa science secrète en moyen de gouvernement, et elle substitue aux corrélations des relations de linéarité. Avant d’aller plus loin, il nous faut d’ailleurs signaler que ce n’est pas seulement de deux « mondes » que parle la tradition kabbalistique, mais de quatre, qui sont dans l’ordre ceux de l’émanation, de la création, de la formation et de l’action. Ici aussi, il s’agit bien entendu de modes du monde et non de mondes distincts : cette « hiérarchie » est celle de la construction dite séphirotique et, étant donné son importance, il convient de s’y arrêter.

La construction séphirotique, ou Arbre des Séphiroth, qui est probablement, et plus encore que le Yin-Yang chinois ou le sceau de Salomon, l’idéogramme théogonique le plus « occulte » de la gnose, se présente en Kabbale comme la superposition de trois triangles surmontant un point isolé, chacun des sommets de ces triangles constituant, ainsi que ce dernier point, une a séphirah ». Il y a donc en tout dix séphiroth, le mot « séphiroth » étant le pluriel de « séphirah ». On comprendra bientôt que cette construction, qui se propose de représenter la procession théogonique, n’est en réalité que le voile derrière lequel se cache la constitution structurale de cette même théogenèse, et que, dans cette dernière, ce n’est finalement pas dix séphiroth qu’il faut dénombrer, mais treize, c’est-à-dire la structure du double sénaire-septénaire symbolisant les petits mystères et voilant à son tour celle des grands mystères.

Quoi qu’il en soit, le triangle supérieur est dit représenter le [347] monde de l’émanation, le triangle intermédiaire, celui de la création, le triangle d’en bas, celui de la formation, et le point isolé sous l’ensemble, à lui seul, le monde de l’action. A noter que la première séphirah est désignée sous le nom de Kéther, [348] ce qui signifie Couronne et évoque par conséquent l’idée de sommet. En réalité, au-dessus de Kéther, figure l’Ain-Soph, ou l’Indéterminé. Mais l’Ain-Soph n’est pas une séphirah. Il se tient au-dessus de l’Unité représentant le couple Père-Mère comme s’y tient le symbole même de l’Indéterminé, qui est ∞/∞, auquel on ne saurait assigner aucun rang. A noter réciproquement que ce n’est pas la dernière séphirah qui constitue la base de l’ensemble, mais l’avant-dernière, la neuvième. En effet, c’est celle-ci qui s’appelle Yésod, ce qui signifie Base, et nous n’allons pas tarder à comprendre pourquoi.

Si l’on dispose ainsi l’Ain-Soph au-dessus de Kéther, la dernière séphirah, celle de l’extrême-bas, nommée Malcouth, devient l’homologue inverse de l’Ain-Soph par rapport à la construction triangulée proprement dite.

Il faut expliciter le sens de cette superposition symbolique.

Nous avons déjà dit que le mode de l’émanation est celui de la vision transcendentale, et que le « ciel » et l’ « enfer » ne résultent pas d’autre chose que de la projection de cette vision, où le temps est aboli, dans une vision imaginaire et naïve. Le ciel et l’enfer sont ainsi des modes abstraits du monde, la vision naïve de ce qui passe, aux yeux de la vision naturelle, pour un extra-monde. Nous définirons comme suit le « monde » de l’émanation : un mode de procession qui à chaque stase contient le tout et dont le tout peut sortir par ek-stase sans l’appauvrir, et, réciproquement, un mode de procession dont chaque ek-stase est extérieure au tout et peut rentrer en lui en tant que stase, sans l’enrichir. C’est donc le mode de la vision absolue. Il est la meilleure illustration du principe de l’indivisibilité de la substance. De même que la saveur du beurre est tout entière contenue dans chaque parcelle de la motte et, réciproquement, que chaque parcelle goûte toutes les autres sans rien leur prendre ni rien leur donner, de même le monde de l’émanation nous apparaît comme générant une participation simultanée de tous dans tout, une répétition du tout dans une infinité de parcelles qui sont chacune le tout. A cet ensemble de propriétés, on reconnaît qu’il ne peut être que l’idée du sénaire immanente à toute existence spécifiée. Le mode de l’émanation sort de l’unité divine et rentre en elle comme le sénaire sort de son centre transcendental et y retourne; il est celui de l’organisation sénaire en tant qu’invariant absolu de toute manifestation. On peut dire qu’il est le « monde » des idées-nombres. Ceci sera précisé bientôt. Mais il va de soi que ce « monde » n’est vu comme empyrée séparé que dans la vision naïve. Les idées-nombres sont inséparables de la totalité [349] de leur procession, c’est-à-dire de la dialectique terrestre qui les inclut dans le monde unique de la manifestation.

Aussi bien, de même que la vision appelle l’acte, le mode de l’émanation appelle-t-il un corrélât formatif. Le mode de la formation est :elui de la temporalité. A chaque étape de la procession christique, la terre en tant que fruit se trouve alors intégrer une vision du ciel en tant que germe d’une terre idéale plus avancée et une vision de l’enfer en tant qu’écorce (ou déchet) d’une terre déjà dépassée. La tradition peut dire qu’il y a sept terres et sept cieux, puisqu’il y a ensemble sept stases ou ek-stases, la septième confondant d’ailleurs le dernier ciel et la dernière terre dans l’unité sans clivage de la déité. Bien entendu, cette introduction de la chronologie dans le ciel et dans l’enfer résulte d’une vision terrestre, elle n’est pas vision absolue. C’est qu’en effet on ne peut parler du ciel ou de l’enfer que par suite d’une vision terrestre. Le ciel ni l’enfer ne se connaissent en tant que tels. Il n’y aurait pas de ciel ou d’enfer s’il n’y avait pas de terre pour les imaginer, et le ciel et l’enfer ne sont que les supports dialectiques de la fructification de la terre comme monde complet. Yu de la terre, le jeu des idées dans le ciel et des formes dans l’enfer, si on veut y insérer la chronologie, est comme un jeu imaginaire, un spectacle théâtral présentifiant le drame qu’il faudra vivre sur la terre en présence réelle et non en présentification.

Ces définitions posées, que signifient les « mondes » de la création et de l’action?

Si l’émanation se rapporte au mode de la synchronie et la formation au mode de la diachronie, la création ne peut que se rapporter à la genèse qui sert de « passage » entre ces deux modes dans le monde, l’action se rapportant à l’apocalypse infernale qui sert de « passage » entre le monde unique et la déité, hors du monde. La création marque la transcendance « intra-mondaine »; l’action, la transcendance «extra-mondaine » intégrant la précédente et la transformant en immanence de la déité dans le monde. La création est la stase de départ du Fils hors de la déité; l’action, la stase de retour. La première prend l’aspect d’un exil du Fils « hors » du ciel, la seconde d’un retour du Fils « à travers » les enfers. La création est le « niveau » ou le « moment » de la séparation et de l’incarnation; l’action, le « moment » ou le « niveau » de la communion et de la transfiguration. Comme l’action se situe sous la terre, au « bas » de l’échelle des mondes, la tradition est cohérente lorsqu’elle parle de la descente aux enfers du Fils. L’Apocalypse est le mariage du Fils avec la nouvelle Jérusalem, autre symbole de la Fille. L’émanation et la formation sont donc à la fois enveloppées et [350] séparées par les deux stases de la création et de l’action, elles en sont les ek-stases et réciproquement. Nous ne retrouvons pas ici autre chose que le modèle d’une corrélation sénaire générale, et le rapport qui existe entre la déité, l’émanation (ciel) et la formation (terre), d’une part, la déité, la création (genèse) et l’action (apocalypse ou enfer), d’autre part, est celui qui confronte les trois ek-stases de tout acte existentiel en mode sphérique ouvert, le mystère de la déité résidant justement dans le fait qu’elle est à la fois dualité de stase et d’ek-stase dans l’unité d’un seul regard.


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