Filosofia – Pensadores e Obras

objeto

(lat. obiectum; in. Object; fr. Objet; al. Objekt, Gegenstand; it. Oggettó).

Termo de qualquer operação, ativa, passiva, prática, cognoscitiva, ou linguística. O significado dessa palavra é generalíssimo e corresponde ao significado de coisa . objeto é o fim a que se tende, a coisa que se deseja, a qualidade ou a realidade percebida, a imagem da fantasia, o significado expresso ou o conceito pensado. A pessoa é objeto de amor ou de ódio, de estima, de consideração ou de estudo; neste sentido, o próprio eu é ou pode ser objeto. Toda atividade ou passividade tem como termo ou limite um objeto, qualificado em correspondência com o caráter específico de atividade ou de passividade. Ao lado deste significado genérico e fundamental, em que esse termo é insubstituível, encontra-se algumas vezes na linguagem filosófica e na comum um significado mais restrito ou específico, segundo o qual o objeto só é objeto se tiver alguma validade: p. ex. se é “real”, “externo”, independente”, etc. (v. objetivo). No entanto, este segundo significado não elimina o primeiro, mas o pressupõe.

Essa palavra foi introduzida em filosofia pelos escolásticos, no séc. XIII. É claramente definida por Tomás de Aquino de Aquino, que diz: “objeto de uma potência ou de um hábito é propriamente aquilo sob cuja razão (ratio) se inclui tudo o que se refere à potência ou ao hábito em questão. P. ex.: o homem e a pedra referem-se à visão por terem cor; portanto, o que tem cor é o objeto da visão” (S. Th., I, q. 1, a. 7). Essa noção de objeto foi substancialmente retomada por Duns Scot, que definiu o objeto de um saber como matéria (subjectum) do saber, enquanto aprendida ou conhecida. Segundo Scot, uma matéria cog-noscível torna-se objeto conhecido através de um hábito intelectual relativo a esse objeto (Op. Ox., Prol., q. 3, a. 2, nQ 4). Jungius só fazia expressar com mais simplicidade a mesma noção ao afirmar: “Chama-se de objeto aquilo em torno do que versam as faculdades, seus hábitos e seus atos” (Lógica, 1638, 1, 9, 37). Wolff por sua vez dizia: “objeto é o ente que termina a ação do agente ou no qual terminam as ações do agente: de modo que é quase um limite da ação” (Ont, § 949).

Esse significado continuou sendo fundamental na filosofia moderna e contemporânea. A questão do caráter real ou ideal do objeto em geral ou de uma classe específica de objeto (p. ex., dos objeto físicos ou coisas) não teve influência. Assim, pode-se considerar objeto do conhecimento uma ideia (como queria Berkeley), uma representação (como queria Schopenhauer), uma coisa material (como queria a escola escocesa do senso comum) ou um fenômeno (como queria Kant), mas como objeto é sempre o termo ou limite da operação cognoscitiva. No entanto, é Kant quem inaugura o uso restrito do termo, segundo o qual o objeto, ou mais exatamente o objeto de conhecimento é, de preferência, objeto “real” ou “empírico”. Kant diz: “Há grande diferença entre ser algo dado à minha razão como objeto em absoluto ou apenas como objeto na ideia. No primeiro caso, meus conceitos passam a determinar o objeto; no segundo, o que existe de fato é só um esquema ao qual não se atribui diretamente nenhum objeto, nem por hipótese, mas que serve apenas para representar outros objeto, em sua unidade sistemática, por meio de sua relação com a ideia. Assim, digo: o conceito de uma inteligência suprema é uma simples ideia; vale dizer: sua realidade objetiva não deve consistir em que ele se refira diretamente a um objeto (pois seu valor objetivo não pode ser justificado desse modo), mas é apenas um esquema, organizado segundo as condições da máxima racionalidade do conceito de uma coisa em geral” (Crít. R. Pura, Dialética, Apêndice). Essas considerações de Kant são uma reiteração de que a ideia da razão pura não tem propriamente objeto porque objeto é somente o empírico (a coisa natural), e a ideia refere-se apenas indiretamente a um grupo de tais objetos. Todavia, esse significado específico do objeto não elimina, nem para Kant, o significado geral e fundamental. De fato, esse filósofo não só considera o conceito de objeto como o “mais elevado” em filosofia (v. o fim deste verbete), como também fala de uma “distinção de todos os objeto em geral em fenômenos e númenos”, considerando o númeno como “o objeto de uma intuição não sensível”, admitida em hipóteses, que poderia pertencer a um intelecto divino (Crít. R. Pura, Anal. dos Princ, cap. III). Por outro lado, para Kant, além do objeto de conhecimento, há “o objeto da razão prática”, que é “a representação de um objeto como de um efeito possível através da liberdade” (Crít. R. Prática, I, Livro I, cap. 2); isso significa que neste caso o objeto é o termo ou resultado de uma ação livre. O que em todo caso constitui o objeto é sua função de limite ou termo de uma atividade ou de uma operação qualquer. Essa noção não desaparece nem nas formas mais radicais de idealismo: para o próprio Fichte, o objeto é o limite da atividade do Eu: “O Eu põe-se como limitado pelo não-eu” ( Wissenschaftslehre, 1794, § 4. A), e o não-eu nada mais é que objeto (Ibid., § 4 E. III; trad. it., p. 143). Analogamente, qualquer outra determinação que os filósofos possam criar sobre a natureza do objeto tem como ponto de partida a sua definição geral. P. ex., o objeto pode ser considerado um dado (como costumam fazer os empiristas) ou como um problema (como fizeram os neocriticistas; p. ex. Natorp, Platos Ideenlehre, p. 367), mas só pode ser uma ou outra coisa se é considerado como o termo ou limite da atividade cognoscitiva.

Na filosofia contemporânea, o recurso à noção de intencionalidade permitiu reconhecer claramente o caráter geral da noção de objeto Brentano, que foi o primeiro a reintroduzir essa noção, diz que “todo fenômeno psíquico inclui em si alguma coisa como objeto, embora nem sempre da mesma forma. Na representação, há algo representado; no juízo, algo reconhecido ou negado; no amor, algo amado; no ódio, algo odiado, etc.” (Psychologie vom empirischen Standpunkt, 1874, I, p. 115). E Husserl ainda generalizou o conceito, distinguindo objeto e “objeto percebido”: “Deve-se notar que o objeto intencional de uma consciência (tomado como pleno correlato dela) não é absolutamente igual ao objeto apreendido (erfasstes). Costumamos pressupor o ser apreendido no conceito de objeto (objeto intencional), porquanto, ao pensarmos nele ou falarmos sobre ele, temo-lo como objeto no sentido de apreendido. (…) Com certeza só podemos lidar com uma coisa física apreendendo-a, e o mesmo se diga de todas as objetividades francamente representáveis… Ao contrário, no ato de avaliar, de alegrar-se, de amar, de agir, lidamos com valor, com o objeto da felicidade, com o objeto amado, com a ação, respectivamente, sem apreender nada de tudo isto” (Ideen, I, § 37). Paralela e analogamente, Meinong defendia o significado generalíssimo da noção de objeto (Gegenstand), dividindo-a nas classes de objeto da representação (Objekte) e de objeto do juízo (Objektive) (Über Annahmen, 1902, pp. 142 ss.). Quase ao mesmo tempo, no domínio da lógica matemática, Frege defendia uma noção substancialmente idêntica do objeto, identificando-o com o significado: “O significado de uma palavra é o objeto que indicamos com ela” (Über Sinn und Bedeutung, 1892, § 3; trad. it., p. 222), pretendendo dizer que o objeto é o termo ou limite da operação linguística, do uso do signo. Wittgenstein, por sua vez, dizia: “O nome variável ‘x’ é o signo do pseudoconceito objeto. Sempre que o termo objeto (’coisa’, ‘entidade’, etc.) é usado corretamente, é expresso no simbolismo lógico pelo nome variável” (Tractatus, 4.1272). Não muito distante disso está a noção de objeto exposta por Dewey, para quem objeto é o resultado de uma operação de investigação: “O nome objeto será reservado à matéria tratada, na medida em que foi produzida e organizada de modo sistemático por meio da investigação; prolepticamente, objetos são os objetivos da investigação. A ambiguidade que se poderia encontrar no uso do termo, neste sentido (pois de regra a palavra se aplica às coisas observadas e pensadas), é apenas aparente, visto que as coisas existem como objeto para nós só se tiverem sido preliminarmente determinadas como resultados de investigação” (Logic, cap. 6; trad. it., p. 175). É fácil ver que a diferença entre essas definições de objeto é apenas a diferença entre as atividades ou as operações consideradas: objeto é o termo do significado, se considerarmos a linguagem e,-em geral, o uso dos signos; é o termo de uma operação de investigação se considerarmos a pesquisa científica; e assim por diante; mas em todo caso é (como já julgavam os escolásticos) o termo ou o limite de determinada operação.

Assim, a palavra objeto é o termo mais geral de que dispõe a linguagem filosófica. Kant tinha razão ao afirmar que, se “o conceito mais elevado de que se costuma partir na filosofia transcendental é a divisão entre possível e impossível”, visto que toda divisão pressupõe um conceito a ser dividido, “deve-se aduzir um conceito ainda mais elevado, que é o conceito de objeto em geral, assumido de modo problemático, sem decidir se ele é algo ou nada” (Crít. R. Pura, Anal. dos Princ, Nota às anfibolias dos conceitos da reflexão). É óbvio que o conceito de objeto não coincide inteiramente com nenhuma de suas especificações possíveis. As coisas, os corpos físicos, as entidades lógicas e matemáticas, os valores, os estados psíquicos, etc, são todos objeto, especificados ou especificáveis por meio de modos de ser particulares ou procedimentos de verificação particulares; mas nenhuma dessas classes de objeto possui uma objetividade privilegiada e nenhuma se presta a exprimir, em seu âmbito, a característica do objeto em geral. [Abbagnano]


Etimologicamente, “objeto” (do latim: obiectum = atirado diante) significa o que é atirado diante, ou posto diante. O vocábulo alemão correspondente “Gegenstand” tem significação idêntica: “o que está (em pé) diante, em frente”. Assim sendo, “objeto” evoca essencialmente uma relação a alguém, em face de quem o objeto se encontra. A terminologia filosófica rigorosa atém-se a este sentido relativo da palavra, e, por conseguinte, emprega o termo “objeto”, não como muitas vezes acontece na vida corrente, como simples sinônimo de “coisa”. Objeto, em sentido lato (1) é tudo aquilo a que se dirige o ato consciente de um sujeito, ou tudo aquilo a que uma faculdade ou atitude psíquica duradoura ou hábito (habitus), ou também uma ciência, pode dirigir-se, ou seja, o fim do ato (da faculdade, etc.) enquanto tal; por conseguinte, o puro ente em si não é objeto, a não ser enquanto cognoscível, apetecível, etc., tornando se objeto, de um modo novo, ao ser conhecido, apetecido de fato. A filosofia escolástica distingue o objeto material, ou seja, o ente concreto total a que se dirige o sujeito, e o objeto formal, ou seja, a característica peculiar, o aspecto especial (“forma”) que neste todo se considera, ou sob a qual este todo é considerado. Objeto formal de uma faculdade, de uma ciência, de uma virtude, é aquele aspecto comum a todos os seus objetos e apreendido, ao menos implicitamente, em cada uma das participações individuais de dito aspecto. — Em sentido restrito, objeto (2) significa, não toda e qualquer coisa conhecida ou querida, mas unicamente aquilo que “está diante” do sujeito com independência deste e ao qual este se deve amoldar. Neste sentido, por exemplo, o conhecimento e a vontade criadora de Deus não têm objeto; seu saber pode, antes, qualificar-se de saber no esboço ou na origem. — Sob outro aspecto, o conceito de “objeto” (3) restringe-se ao ente material diretamente visado na percepção, ao passo que se denomina não objetivo tudo o que possui condição de sujeito e de pessoa, ou seja, o próprio eu, experimentado unicamente na realização de seus atos, e a pessoa do próximo compreendida numa espécie de co-realização de seus atos intencionais. Com esta acepção poderia também relacionar-se a restrição do conceito de objeto (4), reduzindo-o a significar o objeto de um puro e desinteressado afã de conhecer.

Quando o conhecimento se perfaz por intermédio de uma imagem cognoscitiva inconsciente, importa distinguir entre objeto e “conteúdo” do conhecimento. Assim, p. ex., o conteúdo mental é a representação incluída no conceito ou no juízo; o objeto é o ente independente do pensamento (e que o transcende), ente significado (“intendido”) pelo pensamento. Considerando o conteúdo como sendo o próprio objeto, desembocamos no idealismo epistemológico, para o qual o objeto é um produto do pensamento. Este sentido idealístico de objeto (5) por vezes está subjacente, quando se insiste em afirmar que Deus nunca pode tornar-se objeto de nossa atividade pensante. — Com a distinção entre conteúdo de conhecimento e objeto está conexo o fato de que o dado nem sempre coincide com o objeto. Denomina-se (imediatamente) “dado” tudo o que se mostra imediatamente sem cooperação consciente do sujeito. Assim é “dado” aquilo que vem imediatamente à consciência na percepção dos sentidos externos; isto porém — segundo a concepção do realismo mediatonão é o objeto exterior em seu próprio ser real, mas o ser interno, a modo de imagem, (intencional), no qual o objeto é contemplado. — Num sentido lato, denomina-se, às vezes, “dado” todo objeto (2) que se contrapõe independentemente ao sujeito cognoscente; assim acontece, quando dizemos que o nosso conhecimento consiste numa assimilação a um objeto pré-dado.

Consideração especial merece o objeto correspondente a um juízo, ou seja o objeto-expresso neste juízo, não enquanto pensado nele, senão enquanto existe independentemente do pensamento de dito juízo. O objeto, no caso do juízo, consiste, portanto, em que a um ente (que é expresso pelo sujeito do juízo) convém uma determinação qualquer (uma nota, uma qualidade, uma atividade, uma relação — justamente o que é expresso pelo predicado). Mas a estrutura lógica do juízo não corresponde uma estrutura especificamente igual do conteúdo objetivo real; a relação lógica de sujeito e predicado existe só em nosso pensamento, não “em si”, como pretende o transcendentalismo lógico. Certamente à relação lógica corresponde amiúde no objeto real (ou no conteúdo objetivo real) alguma relação análoga, p. ex., de substância e acidente; todavia o objeto de um juízo não possui necessariamente a estrutura de uma relação real. (Quando, p. ex., dizemos: “Deus é espírito”, a esta proposição não corresponde uma relação real entre Deus e seu ser espiritual). A forma lógica do juízo é precisamente nosso modo único de pensar e a verdade do juízo não exige que nosso “modo” de pensar se encontre na coisa, mas somente que o conteúdo ontológico corresponda ao “conteúdo” de pensamento. — Os objetos do juízo podem ser necessários e contingentes. Os objetos incondicionadamente necessários são (prescindindo da existência real de Deus) meros conteúdos essenciais, que em si não denotam ainda existência real; assim, p. ex., o objeto de juízo 2 X 2 = 4 não diz que 2 X 2 exista realmente nalgum sítio, mas diz tão-somente que a essência 2 X 2 traz consigo necessariamente a relação = 4, de sorte que, sempre que se realizem 2 X 2, necessariamente são = 4. Os objetos contingentes existem só na medida em que em certo momento lhes sobrevêm a existência real; frequentemente se lhes dá também o nome de fatos. — O modo de falar, segundo o qual ao juízo negativo verdadeiro corresponde “um objeto negativo existente em si” é equívoco; o juízo negativo é verdadeiro, precisamente quando o objeto nele negado “não” existe na ordem do ser; é contraditório atribuir ao negativo um “ser-em-si”; o negativo “existe” só em nosso pensamento. — De Vries. [Brugger]


Pode dizer-se que objeto significa, em geral, “o contraposto”.

Na história da filosofia ocidental, os significados do vocábulo podem dividir-se em dois grupos: aquele a que pode chamar-se tradicional, especial mente entre os escolásticos, e aquele a que pode chamar-se moderno, particularmente desde Kant.

Os escolásticos entenderam por objeto várias coisas; não se dá exatamente o mesmo sentido a objeto quando se trata do objeto em metafísica, em teoria do conhecimento e em ética. Contudo, há um sentido comum de objeto em qualquer caso, que é o de termo. Assim, em metafísica, o objeto é um termo, um fim, ou causa final; em teoria do conhecimento o objeto é o termo do ato do conhecimento especialmente a forma, quer como espécie sensível, quer como espécie inteligível; em ética, o objeto é a finalidade, o propósito, o justo. S. Tomás dizia que “objeto é aquilo sobre o qual cai algum poder ou condição. A referência intencional que isso põe não precisa de ser unicamente cognoscitiva>; pode ser também volitiva e emotiva. Ocupar-nos-emos primeiramente, do aspecto cognoscitivo. O objeto no sentido atrás definido chama-se, por vezes, “objeto conatural”. Mas o termo objeto qualifica-se de diversas maneiras. Por exemplo, fala-se de objeto direto ou imediato (quando o poder a que S. Tomás se referia alcança o objeto diretamente”; de objeto direto ou mediato (quando o poder em questão alcança o objeto por meio de outro objeto); de objeto formal e de objeto material. Estes dois últimos tipos de objeto interessam-nos aqui especialmente pelo uso frequente que se fez dos conceitos correspondentes. O objeto formal e o objeto material são habitualmente considerados “objetos do conhecimento”. O objeto formal é o alcançado direta e essencialmente (ou naturalmente) pelo poder ou ato. por meio do objeto formal, alcança-se o objeto material, que é simplesmente o termo para o qual aponta o poder ou ato de conhecimento através do objeto formal. O objeto material é como um objeto indeterminado; a sua determinação opera-se por meio do objeto formal. A diferença entre objeto material e objeto funda-se na diferença entre o conhecimento e o objeto do conhecimento. Note- se que, por vezes, o objeto formal se chama também sujeito, enquanto se expressa logicamente num termo no qual se predica algo.

O fato de algo ser objeto material não significa necessariamente que seja “fisicamente real”. Pode ser qualquer objeto de conhecimento. Aquilo que corresponde ao objeto chama- se, amiúde, objetivo.

Deste vocabulário – que persiste em muitos autores modernos, especialmente em autores do século dezassete, que se valem muitas vezes da ideia do ter objetivo como “ser representado” – deriva uma noção principal: a de que objeto e objetivo não se determinam como o real (cognoscível ou não) perante o sujeito e o subjectivo.

Desde Kant e já um pouco antes deles, usou-se frequentemente objetivo para designar aquilo que não reside meramente no sujeito, em contraposição a subjectivo, entendido como aquilo que está no sujeito. O objeto é então equiparado à realidade – a realidade objetiva que pode ser declarada cognoscível -, em contraposição com o sujeito, o qual visto, por assim dizer, de fora para um objeto, mas, visto de dentro, é o que conhece quer ou sente o objeto.

Em algumas das objetos atuais, entende-se objeto no sentido que, embora não coincida estritamente com o tradicional, tem em conta algumas das suas caraterísticas. Isto acontece em todas as filosofias onde a noção de intencionalidade desempenha um papel fundamental. Assim, para Husserl, objeto é tudo o que pode ser sujeito de um juízo; o objeto fica assim transformado desde logo, no suporte lógico expresso gramaticalmente no vocábulo sujeito, em tudo o que é susceptível de receber uma determinação e, em última análise, em tudo o que é ou vale de alguma forma. objeto equivale, por conseguinte, a conteúdo intencional; o objetivo não é, pois, algo que tenha forçosamente uma existência real, mas o objeto pode ser real ou ideal, pode ser ou valer. Todo o conteúdo intencional ‘ é, neste caso, um objeto. Assente a definição de objeto como sujeito de um juízo, a teoria do objeto investiga formalmente as diferentes classes de objetos existentes e adscreve-lhes as correspondentes determinações gerais. A teoria do objeto converte-se assim numa parte da ontologia, à qual corresponde a investigação do ser enquanto tal. A ontologia está, por conseguinte, situada num plano superior à teoria dos objetos; na qualidade de ontologia geral, trata das determinações do ser e faz parte, portanto, da metafísica como investigação do em si. como ontologia regional, averigua as determinações gerais que correspondem a cada um dos tipos do ser. Assim se liga à ontologia regional à teoria dos objetos.

Segundo as investigações realizadas até este momento na teoria do objeto, os objetos são ilimitados. contudo, essa infinitude não impede o seu agrupamento de acordo com as suas notas mais gerais. A totalidade dos objetos, que corresponde à totalidade da realidade, pode cindir-se nos seguintes grupos:

1) os objetos reais, que possuem realidade em sentido estrito. Neles estão incluídos os objetos físicos e os objetos psíquicos. As notas dos primeiros são a espacialidade e a temporalidade. as dos segundos, a temporalidade e a inespacialidade…

2) objetos ideais. as suas são a inespacialidade e a intemporalidade.. A este grupo pertencem os objetos matemáticos e as relações ideais.

3) objetos cujo ser consiste no valer. A este grupo pertencem os valores que também podem ser considerados como objetos. 4) objetos metafísicos, cuja função consiste provavelmente numa unificação dos demais grupos, pois o objeto metafísico enquanto ser em si e por si ou absoluto contem necessariamente como elementos imanentes todos os objetos tratados pelas ontologias regionais.

As classificações de objetos propostas pelas “teorias dos objetos” são, certamente, muitas. De alguma maneira, quase todos os filósofos tiveram uma teoria do objeto. Assim, por exemplo, a divisão do mundo em mundo sensível e em mundo inteligível equivale, em grande parte, a uma classificação de objetos. O mesmo acontece com a distinção entre substância pensante e substância extensa, etc. Podem formular-se as teorias do objeto atendendo primariamente às realidades do objeto que se trata ou então à linguagem por meio da qual se fala de quaisquer objetos possíveis, ou então combinando aquilo a que pode chamar-se o ponto de vista ontológico ou o ponto de vista “lógico-gramatical”.

Entre as várias concepções apresentadas acerca da natureza do objeto como tal, destacamos as seguintes: A concepção existencial do objeto, segundo a qual tudo o que existe é um objeto e, ao invés, tudo o que é objeto existe; a concepção fenomenalista, segundo a qual o objeto é só aquilo que de algum modo é representado; a concepção reísta, segundo a qual o objeto é só aquilo que designa a coisa ou res, isto é, uma massa que implica uma espacialidade; e a concepção do objeto como classe, segundo a qual o objeto é, em última análise, uma classe ou conjunto de caraterísticas, ou elementos. [Ferrater]


(do lat. ob-jectum, que está colocado diante), qualquer coisa que se ofereça à vista. — De maneira mais precisa, o objeto é o conteúdo de nosso pensamento e contrapõe-se ao sujeito pensante. Nesse sentido, o objeto pode designar (como em Descartes) uma sensação ou um sentimento no qual eu penso, ou uma imagem no meu espírito, e não necessariamente um objeto real existente no mundo. É nesse sentido que a fenomenologia moderna (Husserl) fala de objeto intencional: põe “entre parênteses” todo problema de existência real; quando reflete, por exemplo, no sentido das religiões, seu objeto é ao mesmo tempo um sentimento específico e um conjunto de símbolos, de dogmas, de ritos através dos quais se exprime. A reflexão fenomenológica não coloca o problema de saber se essas religiões ainda existem realmente no mundo, ou se elas são a “verdadeira” religião ou não: seu objetivo é simplesmente desenvolver o sentido de seu objeto, as religiões. O termo objeto diferencia-se então do termo real. — Na ordem de nosso conhecimento, temos inicialmente consciência dos objetos do mundo antes de termos consciência de nós mesmos. Entretanto, do ponto de vista psicológico, toda percepção ou toda ação implica, como um fato indiscutível, na solidariedade entre o sujeito e o objeto: não há objeto sem sujeito que o veja e o pense. Do ponto de vista metafísico! o problema da causa ou fundamento do objeto inscreve-se no problema teológico da origem do mundo. Contrapõe-se ao problema crítico (Kant) do fundamento de “nosso conhecimento” dos objetos. [Larousse]


Aliás, também o termo “objeto” é muito significativo. Para apreendermos seu alcance, precisamos aproximá-lo de seu correspondente em língua alemã, do termo “Gegenstand”. O objeto ob-jectum é aquilo que, de certa forma, é lançado diante de nós, que se encontra exposto ao nosso olhar. O termo alemão é mais forte, pois, em “Gegenstand”, há o “Gegen “, prefixo significando, ao mesmo tempo, o que está “diante” e o que é “contra”. Este termo, “Gegenstand”, sugere que existe uma espécie de insurreição do objeto diante do sujeito. O termo “Stand” se relaciona com o verbo “stehen”; estar de pé, encontrar-se ereto. O “Gegenstand” se encontra de pé diante do sujeito e, de certa maneira, se ergue contra ele. O objeto é aquilo que se levanta por conta própria, lá longe, distante do sujeito, mas necessariamente relacionado com ele. Evidentemente, há uma relação entre o sujeito e o objeto: se o objeto se dá ao sujeito, erguendo-se diante dele próprio por conta própria, por sua vez o sujeito deve se assegurar do objeto.

A grande preocupação de Descartes, por exemplo, é a do critério de certeza. Como se assegurar do valor do conhecimento? Como se assegurar do objeto? Toda a concepção cartesiana do conhecimento gira em torno do papel da “ideia”, considerada como o “médium” pelo qual nos asseguramos do objeto. Nesta perspectiva, o problema filosófico fundamental é o de saber como podemos adquirir uma posse sólida do objeto ou, em outros termos, como podemos adquirir o “domínio” do objeto. O termo “domínio” é tomado de empréstimo a Descartes: num célebre texto do Discurso sobre o método, entrevendo aquilo em que se tornaria a ciência moderna, ele nos diz que, pelo caminho da ciência, os homens se tornarão “mestres e possuidores da natureza”. [Ladrière]