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Lettres philosophiques de Voltaire IV. “Sigamos nossos impulsos, observemo-nos a nós mesmos, e vejamos se não encontraremos os caracteres vivos dessas duas naturezas. Tantas contradições se encontrariam num sujeito simples? Essa duplicidade do homem é tão visível que alguns pensaram que tínhamos duas almas, pois um sujeito simples lhes parecia incapaz de tamanhas e tão…
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Universalis2015 Roland Barthes definia Voltaire como “o último dos escritores felizes”. Essa felicidade se expressa primeiro numa certa relação com a literatura, característica do Classicismo e que o Rousseau das Confissões e depois o Romantismo logo viriam a destruir: uma mistura de seriedade e ironia, de envolvimento pessoal e distância divertida. O conto oriental e…
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Universalis2015 Em sua versão integral, composta por vinte e um capítulos (os dois últimos, póstumos, geralmente aparecendo em Apêndice), Zadig nos apresenta as desventuras de um jovem babilônico, dotado de todas as graças, possuidor de todas as virtudes e aparentemente destinado à maior felicidade: “Zadig, com grandes riquezas e consequentemente com amigos, tendo saúde, um…
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Universalis2015 Em julho de 1747, Voltaire (1694-1778) publicou anonimamente Memnon, história oriental, impresso em Amsterdã. Revisado e lido várias vezes em particular, o conto foi finalmente publicado no ano seguinte em Paris, ainda sem nome de autor, com o título Zadig, ou o Destino. Em 1756, para a edição de suas obras completas, Voltaire acrescentou…
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Chaui1981 Candide é um libelo contra a intolerância em sua forma mais grotesca e cruel: o otimismo leibniziano. Desprovido de proporção e de medida, o mundo percorrido por Cândido e seus amigos é irracional, mas não é desprovido de sentido. Porém, o que Voltaire jamais poderá admitir é que esse sentido seja oferecido por uma…
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Cassin2018a O discurso sofístico é o paradigma de um discurso que faz coisas com palavras. Não é certamente um “performativo” no sentido austiniano do termo, embora, como veremos, o sentido austiniano varie consideravelmente em extensão e intenção. Mas é sem dúvida um discurso que opera, que transforma ou cria o mundo, ou um mundo, que…
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Cassin2018a De fato, a filosofia clássica tematizou essencialmente duas dimensões: o falar de e o falar para. Falar de, por um lado, como quando digo “a folha é branca”, “dois e dois são quatro” ou “os homens nascem livres e iguais em direitos”: trata-se do verdadeiro ou falso, é o constativo do discurso ordinário, seja…
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Cassin2018 Diante dos deuses reunidos, Atena se queixa de que Odisseu, a quem ela protege, seja o único que ainda não retornou para casa. Ele, que deseja ver as fumaças de sua terra, chora à distância e chama pela morte. Já faz sete anos que Calipso, “a que esconde”, “a que encobre”, o mantém longe…
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Cassin2018 Algumas palavras para fazer sentir o mundo pagão no qual Homero nos faz adentrar. “Na verdade – diz Nietzsche – faz diferença se é a Bíblia, Homero ou a ciência que tiraniza os homens.” Para definir o mundo pagão, eis o critério que proponho: é um mundo onde aquele que chega diante de você…
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Cassin2020 Na antiguidade, o pharmakon da cura pela fala é precisamente a articulação entre retórica e magia. Freud sabe disso e desde o início coloca a interação médico-paciente sob o signo da influência: “Nada acontece num tratamento psicanalítico senão uma troca de palavras entre o paciente e o analista. O paciente fala, conta suas experiências…
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Cassin2020 “Eu fundo aqui”, declarou Lacan em 21 de junho de 1964, “a Escola Francesa de Psicanálise”. “Constituímos três seções”, prosseguiu ele, intitulando-as respectivamente: 1. “Seção de Psicanálise Pura”, nada mais que a formação em psicanálise, 2. “Seção de Psicanálise Aplicada, o que significa terapêutica e clínica médica”, e 3. “Seção para Inventário do Campo…
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Cassin2020 Então a primeira casinha [consultório?] terá sido aberta na ágora por Antífon, o sofista, a quem Jean-Paul Dumont, em sua primeira tradução para o francês dos sofistas, já se referia como “o inventor da psicanálise”: Antífon compôs, além de poesia, uma arte de aliviar os sofredores (déchagrin) [tekhnê alupias], como as várias terapias usadas…
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Cassin2020 A semelhança externa entre sofística e psicanálise é impressionante. O que é mais escandaloso, tanto da perspectiva da filosofia quanto da opinião pública, é que sofistas ou psicanalistas vendem seu know-how discursivo, e sempre por um preço muito alto. Eles vendem o que não deveria ser vendido, como as “prostitutas” a quem o Sócrates…
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Kolakowski2001 Os resultados dessa crítica — em particular a renúncia à “verdade” e à “certeza” no sentido tradicional — equivaleram, aos olhos de Husserl, à ruína da cultura europeia. A interpretação da lógica em categorias empíricas, ou o “psicologismo” na lógica, parecia-lhe especialmente perigosa e destrutiva. Para Husserl, era natural começar por essa questão, já…
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Kolakowski2001 O pensamento transcendental, em suas diversas formas, se rebelou contra essas conclusões irritantes. Descartes fez duas distinções cuja validade é decisiva para o destino da questão da certeza: A distinção entre o sentimento subjetivo de evidência (“obviedade”) e a evidência objetiva da verdade. A distinção entre certeza “moral” e certeza metafísica. Ambas se mostraram…
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Kolakowski2001 O conceito de certeza pode ser considerado a chave para o pensamento de Husserl. Ele percebeu que o projeto de filosofia científica, no sentido popularizado pelos pensadores alemães na segunda metade do século XIX, era enganoso e perigoso. O slogan de “cientificidade” introduzia uma renúncia ao que era considerado ciência no sentido genuíno —…
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Kolakowski1976 Entre as ideias principais da filosofia positivista, enumeraremos, em quarto lugar, a crença na unidade fundamental do método científico. Mais do que nos casos anteriores, o significado deste princípio permite diversas interpretações; no entanto, a ideia em si está sempre presente nas doutrinas positivistas. De forma mais geral, trata-se da certeza de que os…
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Kolakowski1976 A concepção fenomenalista e nominalista do saber leva a outra consequência importante, que formularemos em terceiro lugar. Trata-se da regra que nega qualquer valor cognitivo aos juízos de valor e aos enunciados normativos. De fato, os atributos que qualificam eventos, coisas ou comportamentos humanos, como: nobre, ignóbil, bom, mau, belo, feio, etc., não nos…
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Kolakowski1976 Em segundo lugar: a regra do nominalismo. Essa regra poderia, no fundo, ser considerada consequência da anterior, mas é melhor formulá-la separadamente, uma vez que é raro, em controvérsias filosóficas, que um julgamento importante sob o ponto de vista filosófico resulte de maneira absolutamente inevitável de outro julgamento igualmente importante sob a mesma perspectiva.…