Filosofia – Pensadores e Obras

síntese

(gr. synthesis; lat. synthesis; in. Synthesis; fr. Synthèse; al. Synthese; it. Sintesi).

Este termo, além do significado comum de unificação, organização ou composição, tem os seguintes significados específicos: 1) método cognitivo oposto a análise; 2) atividade intelectual; 3) unidade dialética dos opostos; 4) unificação dos resultados das ciências na filosofia.

1) No primeiro significado, como um dos métodos fundamentais do conhecimento (em oposição a análise), a síntese pode ser considerada como o método que vai do simples ao composto, dos elementos às suas combinações, nos objetos cuja natureza se pretende explicar. A oposição dos dois métodos foi expressa pela primeira vez por Descartes (Rép. aux II objections; v. análise); Leibniz assim a expressava: “Chega-se muitas vezes a belas verdades por meio da síntese, indo do simples ao composto, mas quando é preciso encontrar o meio de fazer aquilo que se propõe, a síntese normalmente não basta (…) e cabe à análise dar-nos o fio condutor, quando isso é possível, porque há casos em que a natureza do problema exige que se proceda tateando, e nem sempre é possível cortar caminho” (Nouv. ess., IV. 2, 7). Segundo Kant, o método sintético é “progressivo”, ao passo que o analítico é “regressivo”, vai do objeto às condições que o possibilitam (Prol., § 5, nota). Segundo Kant, o procedimento da filosofia é analítico, enquanto o da matemática é sintético, mas neste caso os dois termos não têm nenhuma relação com a classificação dos juízos em analíticos e sintéticos. Em geral, assim como o procedimento analítico é caracterizado pela presença de dados (inerentes ao objeto ou à situação a ser resolvida) que o guiam e controlam, o procedimento sintético pode ser caracterizado pela ausência de tais dados e pela pretensão, inerente a ele, de produzir por sisi mesmo os elementos de suas construções (v. filosofia).

2) No segundo significado, o termo designa a união do sujeito e do predicado na proposição, portanto o ato ou a atividade intelectual que realiza tal união. Foi neste sentido que Aristóteles utilizou o termo, ao dizer que “onde está o verdadeiro e o falso está também certa síntese de pensamento semelhante à síntese que há nas coisas” (De an., III, 6, 430 a 27), e “o que cria essa unidade é o intelecto” (Ibid., 430b 5). Mas foi Kant quem mais utilizou o conceito de síntese, reduzindo a ela todas as espécies de atividade intelectual. Definiu a síntese em geral como “o ato de unir diferentes representações e de compreender essa unidade num único conhecimento” (Crítica da Razão Pura, § 10), e distinguiu numerosas espécies de síntese com base nos elementos que nela se encontram. Em primeiro lugar, fez a distinção entre síntesepura, na qual a multiplicidade não é dada empiricamente, mas a priori (como a do espaço e do tempo), e a síntese empírica, em que a multiplicidade é dada empiricamente. A síntese pura é “o ato originário do conhecimento, o primeiro fato ao qual devemos dar atenção se quisermos descobrir a origem primeira de nosso conhecimento” (Ibid). Portanto, a síntese pura precede qualquer análise, pois só se pode analisar o que já se deu unido num ato cognoscitivo. A síntese pura, que é possível a priori, pode ser distinguida da síntese figurada (Synthesis speciosa) e da síntese intelectual (Synthesis intellectualis): ambas sào transcendentais porque constituem a possibilidade de qualquer conhecimento, mas enquanto a segunda unifica uma multiplicidade puramente pensada, a figurada é uma síntese da multiplicidade da intuição sensível, ou melhor, é uma síntese da imaginação entendida como “faculdade de determinar a priori a sensibilidade” (Ibid., § 24). É nessa síntese transcendental da imaginação que se baseia o cogito, ou apercepção originária. Mas, como todo conhecimento é síntese e o conhecimento efetivo, segundo Kant, é a experiência, Kant chama a experiência de “síntese, segundo conceitos, do objeto dos fenômenos em geral” (Crítica da Razão Pura, Anal. dos princ, cap. 11, seç. II). Na primeira edição, Kant falara em três espécies de síntese: la síntese da apreensão na. intuição; 2a síntese da reprodução na imaginação; 3a síntese da recognição no conceito (Crítica da Razão Pura, la ed., An. transe, I Livro, cap. 2, seç. 2). Mas tanto na primeira quanto na segunda edição Kant reduziu qualquer espécie ou grau de atividade cognitiva a síntese Esse foi um dos aspectos mais evidenciados e discutidos de sua obra. Enquanto a noção de síntese mudava de natureza no idealismo (v. mais adiante), era retomada e adaptada por outros filósofos de maneiras diferentes. Galluppi inverteu o ponto de vista kantiano, pondo a análise antes da síntese. “A síntese é a faculdade de reunir as percepções separadas pela análise. A análise é, pois, uma condição essencial para a síntese” (Saggio fil. sulla critica della conoscenza, 1831, II, § 146). Além disso, fez a distinção entre a síntese ideal objetiva, que consiste em reconhecer as relações objetivas que existem entre as coisas, síntese imaginativa civil, que consiste em reunir numa representação complexa, que não corresponde a nenhum objeto, diferentes representações, cada uma das quais tem um objeto, e síntese imaginativa poética, que é uma espécie da precedente (Ibid., III, §§ 147-149). Por sua vez, Rosmini chamava síntese primitiva a sua “percepção intelectiva” (Nuovo saggio, § 46; § 528, etc). Em geral, o conceito de síntese continuou expressando em filosofia a atividade ordenadora, organizadora e sistematizadora do intelecto. Os neokantianos fizeram amplo uso dessa noção. Para A. Riehl, em especial, a atividade sintética é a função fundamental da consciência e o a priori de todo o conhecimento (Der philosophische Kriticismus, II, 2, 188 7, p. 68). Outros neokantianos, como Cohen, preferiram o conceito de origem, e não de síntese (Logik der reinem Erkenntnis, 1902, p. 36). Wundt introduziu esse conceito em psicologia e falou do “princípio da síntese criativa”, segundo o qual “não só as partes que compõem uma síntese aperceptiva adquirem, ao lado do significado que tinham isoladamente, um novo significado, devido à sua conexão na representação total, como também essa representação é um novo conteúdo psíquico, que é possibilitado pelas partes componentes, mas não consiste nelas” (Grundriss der Psychologie, 1896, p. 394). Por outro lado, a filosofia fenomenológica evidenciou a função da síntese na “constituição das objetividades de consciência”. Husserl acredita que todo objeto de conhecimento em geral é uma “unidade sintética”, uma síntese de consciência (Ideen, I, § 86). Faz a distinção entre síntese continuativas, do tipo, p. ex., que constitui a espacialidade, e as síntese articuladas, que são os modos particulares, em que atos separados uns dos outros se conectam num único ato sintético de grau superior. São síntese articuladas, p. ex., os atos de preferência ou as emoções simpáticas; além disso, há as síntese coligantes, disjungentes (que visam a isto ou àquilo) e explicitantes, que determinam as formas da lógica e da ontologia formal (Ideen, I, § 118).

3) A noção de síntese como unidade dos contrários nasceu com o conceito correlato de dialética e foi exposta pela primeira vez por Fichte, que diz: “O ato pelo qual se busca, nas comparações, a característica graças à qual as coisas comparadas são opostas entre si chama-se procedimento antitético (chamado ordinariamente analítico). (…) O procedimento sintético, ao contrário, consiste em buscar nos opostos a característica graças à qual eles são idênticos” (Wissenschaftslehre, 1794, § 3-D, 3). A lei dessa identidade é que “nenhuma antítese é possível sem uma síntese porque a antítese consiste precisamente em buscar nos iguais a característica oposta, mas os iguais não seriam iguais se antes não tivessem sido postos como iguais por um ato sintético” (Ibid., § 3, D, 3). Schelling falava de um “processo que vai da tese à antítese e depois à síntese”, em virtude do qual o eu afirma o objeto, opõe-se a ele e finalmente volta a compreendê-lo em sisi mesmo (System des transzendentalen Idealismus, 1800, III, cap. I; trad. it., pp. 58 ss.). Hegel, no entanto, preferiu os termos “identidade” ou “unidade”, mesmo lamentando que a palavra unidade indicasse, bem mais que “identidade” uma “reflexão subjetiva”. A unidade ou a identidade que fecha uma tríade dialética é uma conexão objetiva; segundo Hegel, seria melhor chamá-la de “inseparabilidade” se, desse nome, não fosse excluída a natureza positiva da síntese (Wissenschaft der Logik, I, livro I, seç. I, cap. I, e, nota 2; trad. it., p. 85). Na linguagem filosófica francesa e italiana, a palavra síntese foi preferida a “identidade” ou “unidade” para indicar o momento resolutivo do procedimento dialético, que é realmente o momento produtivo e criativo. O. Hamelin falou em método sintético, que consistiria em “mostrar a conexão necessária entre noções opostas”; sua mola seria a correlação, graças à qual os opostos remetem um ao outro e colaboram entre si (Essai sur les éléments principaux de la représentation, 1907, p. 20). Os idealistas italianos (Croce e Gentile) empregaram a expressão síntese a priori no sentido de atividade produtiva ou criadora. Com ela Gentile entendeu auto-síntese, que seria “posicionar-se na sua própria identidade e diferença”, que é a autocriação (Sistema di lógica, II, 3a ed., 1942, p. 83, cf. I, 2a ed., 1922, p. 27). Croce falou da síntese a priori como atividade criadora do espírito: “A síntese a priori pertence a todas as formas do Espírito porque o Espírito, considerado genericamente, nada mais é que síntese a priori; e esta se explicita na atividade estética e na prática, bem como na atividade lógica” (Lógica, 4a ed., 1920, p. 141). Para ele, a síntese a priori era a identidade entre filosofia e história, pois ela “contém em si a historidade que seu descobridor [Kant] omitia ou desconhecia” (Ibid., p. 369).

4) Finalmente, entendeu-se por síntese a unificação dos resultados finais das ciências específicas no seio da filosofia primeira, segundo o conceito positivista de filosofia. Tal síntese foi chamada de subjetiva por Comte, que a considerava imprescindível em vista das necessidades naturais do homem (síntese subjetiva ou sistema universal das concepções próprias do estado normal da humanidade, 1856, I). Pelo mesmo motivo, Spencer chamou o conjunto de sua obra de “Sistema de filosofia sintética”; o primeiro volume é constituído pelos Primeiros princípios (1862). [Abbagnano]


Significa, literalmente, composição, quer dizer, posição de uma coisa com outra, um conceito com outro, etc. Portanto, síntese equivale primariamente a união ou unificação, integração, etc. Como o resultado de uma união, integração, etc, é mais complexo que qualquer dos elementos unidos, integrados, pode dizer-se que a síntese é a ação ou efeito de passar do mais simples ao mais complexo. Isto pode ser compreendido fundamentalmente de duas maneiras, a cada uma das quais corresponde um conceito básico de síntese:

1. A síntese como método.
2. A síntese como o que chamaremos, para já, operação. 1. A síntese como método é o chamado método sintético, que se distingue do chamadométodo analítico”. Em muitos entendeu-se a síntese como a passagem do simples ao complexo, como a passagem do universal ao particular. Por esta razão se considerou o silogismo como uma síntese, aparentemente da indução, que foi admitida como uma análise. Depois, especialmente a partir dos princípios da época moderna, considera-se o método sintético ou método compositivo como um em que se procede a partir de umas quantas premissas a uma série de conclusões, ou de uns quantos pensamentos ou objetos simples a uma série de pensamentos ou objetos compostos. A síntese é composição, porque compõe um complexo a partir do simples.

2. A síntese como operação consiste primariamente em unir dois ou mais elementos num composto. Há aqui também, como no caso anterior, uma composição, mas esta oferece um aspecto diferente e por vezes contrário ao atrás descrito. O termo síntese tem sido empregado para se referir à composição ou integração de elementos (como sucede na síntese química), mas na literatura filosófica fala-se sobretudo de síntese como união ou integração de sujeito e predicado. O resultado desta síntese é uma proposição que, como tal, é mais complexa que os seus elementos componentes, mas, por outro lado, pode dizer-se que ao sintetizar-se o sujeito e o predicado se obtém algo mais simples. Este último modo de ver a síntese é o que prevalece em Kant, em quem a noção de síntese desempenha um papel fundamental. De imediato, Kant compreende a síntese como unificação: “por síntese, no seu sentido mais geral, entendo o ato de reunir as diferentes representações umas com as outras, e de apreender o diverso delas num só ato de conhecimento”. A síntese é chamada pura, quando d a diversidade em questão não é empírica, mas a prior. Sem a síntese não haveria possibilidade de conhecimento, tanto no plano da sensibilidade como no do entendimento, e ainda no da razão. No primeiro produz-se a síntese de representações mediante as formas puras da instituição do espaço e do tempo; no segundo, a síntese é a unificação dos elementos da representação por meio das formas puras do entendimento ou categoriais; no último, pode praticar-se a síntese (pelo menos regulativamente) por unificação à base das ideias da razão. Especialmente importante é a noção kantiana de síntese no plano do entendimento; toda a dedução transcendental das categorias está fundada na síntese. Pode inclusivamente dizer-se que, para Kant, conhecer é fundamentalmente sintetizar, especialmente sintetizar representações. O papel do a priori é, portanto, um papel sintético. Em suma, como síntese e conhecimento são em Kant praticamente a mesma coisa, pode conceber-se o progresso do conhecimento como um progresso nas diversas sínteses possíveis. Só uma condição se impõe: que a síntese efetivamente sintetize, quer dizer, que haja elementos sobre os quais atue realmente a síntese. A noção de síntese foi desenvolvida também pelos idealistas alemães, os quais, além disso, destacaram até ao extremo o caráter criador e produtor da síntese. Tal sucede, por exemplo, em Fichte……. Os elementos contraditórios que a análise descobre em cada proposição são unidos, segundo Fichte, por uma síntese. Tanto a análise – que é, em rigor, uma antítese – como a síntese propõem uma tese. A síntese une e, ao unir, produz o unido. Mas o caráter produtor e criador da síntese depende da tese. No aspecto criador da síntese foi depois mantido na maior parte das correntes filosóficas que, de um ou outro modo, quer do ponto de vista do idealismo, quer sob o ângulo do positivismo espiritualista, procuraram ver o que havia de transcendente nos fatos. Esta realidade transcendente pode residir nos próprios fatos ou no espírito que os concebe. Em todos os casos poderá falar-se de um traço criador na síntese.

As vezes considera-se a noção de síntese em Hegel como diferente das anteriores. Sob um aspecto, é verdade, em virtude do qual a síntese desempenha no método dialéctico hegeliana…….. Mas em certa medida a noção hegeliana de síntese é parecida com a que encontramos em Fichte… [Ferrater]