Pedanterei
Ao disparate cômico pertence também o PEDANTISMO. Este se origina do fato de se possuir pouca confiança no próprio entendimento e, em virtude disso, não se permite ao entendimento reconhecer de imediato, num caso particular, o que é conveniente; consequentemente, o entendimento fica por inteiro sob a tutela da razão, recorrendo a esta em todas as oportunidades, ou seja, sempre parte de conceitos universais, regras, máximas e quer apegar-se a eles rigidamente na vida, na arte, sim, na conduta ética. A forma, a maneira de expressão e o modo de falar aderem ao pedantismo, substituindo por este o ser das coisas. De imediato se mostra aí a incongruência do conceito com a realidade, mostra-se como o primeiro nunca desce ao particular e como sua universalidade e rígida determinidade nunca podem combinar com as finas nuances e modificações variadas da efetividade. O pedante, por conseguinte, com suas máximas universais, quase sempre é apanhado de surpresa na vida, mostra-se imprudente, destituído de gosto, incompetente; na arte, para a qual o conceito é infrutífero, produz abortos maneiristas, rígidos e sem vida. Até mesmo em termos éticos o propósito de agir justa e nobremente não pode sempre ser conduzido por máximas abstratas, visto que em muitos casos a natureza infinitamente nuançada das circunstâncias torna necessária uma escolha do que é justo a proceder imediatamente do caráter, enquanto o emprego de máximas meramente abstratas produz em parte falsos resultados, porque as máximas se aplicam apenas parcialmente, em parte não podem ser levadas a bom termo, porque são alheias ao caráter individual de quem age, que não pode ser negado inteiramente – daí, portanto, resultando inconsequências. Não podemos eximir completamente Kant da censura de ter dado azo ao pedantismo moral, já que torna condição do valor moral de uma ação o fato de esta ocorrer a partir de puras máximas abstratas, racionais, sem nenhuma inclinação ou afeto momentâneo; censura que também é o sentido do epigrama de Schiller Gewissenskrupel [escrúpulo de consciência]. – Quando, especialmente em assuntos políticos, fala-se de doutrinários, teóricos, eruditos etc., com isso se pensa nos pedantes, quer dizer, naqueles que conhecem as coisas somente in abstracto, não in concreto. A abstração consiste em pensar ignorando-se os precisos detalhes: mas são justamente estes que mais importam na prática. [Schopenhauer, MVR1:110-111]