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Deck (Plotinus:C6) – Natureza

domingo 10 de setembro de 2023, por Cardoso de Castro

  

tradução

Segundo John N. Deck, Plotino   usa a palavra physis («natureza») em vários sentidos, que são necessariamente, mas facilmente, distinguidos. Em um sentido geral, a natureza pode significar a «constituição» de uma coisa ou um princípio. Este é o sentido do termo no qual Plotino pode se referir à natureza do corpo (Enéada III.6.6), a natureza da forma (Enéada III, 6, 4), ou até a natureza do Bem (Enéada IV, 8, 13). Ainda, a natureza pode significar hipóstase, como quando Plotino chama o Uno a primeira natureza e o Noûs a segunda natureza.

Mas em Enéada III, 8 e em muitos outros lugares, a natureza significa a parte inferior da Alma-do-Mundo. Esta parte, funcionando em plantas e na terra (para Plotino a terra é viva — Enéada IV, 4, 27), é proximamente correlativa à alma generativa-vegetativa no homem e no animal.

A Natureza parece preencher o intervalo entre os mundos inteligível e visível, e na natureza a distinção entre estes dois mundos pode parecer enevoada. Por outro lado, a natureza é uma alma (Enéada III, 8, 4), um logos, um eidos, (forma como inteligível) (Enéada III, 8, 2). É imóvel (ibid.), distinta da matéria e do corpo (Enéada V, 8, 3). As plantas e os animais têm a natureza em si, «como tal, disposta próxima ou ao lado» (Enéada IV, 4, 14). A matéria não entra em sua constituição (Enéada V, 9, 6; Enéada III, 8, 2). Por outro lado há a afirmação: «O que vem da alma e está refletida na matéria é natureza, na qual, ou melhor, diante da qual, seres reais cessam. E estes são o os últimos dos inteligíveis: pois destes em diante só há imitações» (Enéada IV, 4, 13).

A não ser que este «diante da qual» seja tomado em um sentido forte, que não parece o caso na citação acima, Plotino está localizando a natureza na fronteira entre seres reais e imitações (Enéada V, 1, 7). Como alma, pode se ter a expectativa de ser um ser real, mas é a última irradiação da alma para em direção ao corpo (Enéada IV, 4, 13). A mais enfraquecida das coisas reais, não é exatamente um ser real. A contemplação que tem e é, contemplação com a de um homem dormindo ou sonhando, é inferior à contemplação apropriada para um ser real. No entanto é um forma inteligível distinta da forma visível, que é um logos procedendo dela [1].

A natureza não é exatamente ser real, nem é, sem qualificação, alma. É verdade que Plotino descreve ela como uma alma inferior, como o rebento da alma (Enéada III, 8, 4) — mas mesmo o corpo, na medida que é ser, é alma. A natureza é «o último da alma» (Enéada IV, 4, 13). A alma, descendo nas plantas, faz outra hipóstase. Assim ela «parece» descer; ela desce «de certo modo»; há «algo de» alma, um traço de alma (Enéada V, 2, 1), nas plantas. A natureza é uma imagem especular da alma, a qual a alma dá ao corpo (Enéada I, 1, 8). A natureza é uma imagem da sabedoria da Alma-do-Mundo, «possuindo a última intelectualidade irradiada (logos)» (Enéada IV, 4, 13). A continuidade da natureza com a alma é assim o que Plotino considera como a continuidade linear de um inferior com um superior.

Original

PLOTINUS uses the word physis ("nature") in several senses, which are necessarily, but easily, distinguished. In a general sense, nature can mean the "constitution" of a thing or a principle. This is the sense of the term in which Plotinus can refer to the nature of the body (III, 6,6,33-34), the nature of form (III, 6, 4,41-43), or even the nature of the Good (VI, 8,13, 38-40). Again, nature can mean hypostasis, as when Plotinus calls the One the first nature and the Nous the second nature.

But in Ennead III, 8, and in many other places, nature means the lower part of the Soul of the All. This part, functioning in plants and in the earth (for Plotinus the earth is alive) (IV, 4,27,11-17), is closely correlative to the generative-vegetative soul in man and animal.

Nature seems to bridge the gap between the intelligible and the visible worlds, and in nature the distinction between these two worlds might appear to be blurred. On the one hand nature is a soul (III, 8,4,15-16), a logos, an eidos (form as intelligible) (III, 8,2, 20-23). It is immobile (ibid., lines 19-22), distinct from matter and from body (cf. V, 8, 3,1-2). Plants and animals have nature "in" them, "as it were, lying near or beside" (IV, 4,14,2-3). Matter does not enter into its constitution (cf. V, 9, 6,15-20; III, 8,2, 22-34). On the other hand there is the statement: "What comes from soul and is reflected on to matter is nature, in which, rather before which, real beings cease. And these are the last of the intelligible: for from these onward there are only imitations."1

Unless the "rather before" is taken in a strong sense, which does not seem warranted here, Plotinus is locating nature on the borderline between real beings and imitations (V, 1, 7, 46-48). As soul, it might be expected to be real being, but it is the last irradiation of soul towards body (IV, 4, 13, 3-5). The most enfeebled of real things, it is not exactly a real being. The contemplation which it has and is, contemplation like that of a sleeping or dreaming man, is inferior to the contemplation appropriate to a real being. Yet it is an intelligible form distinct from the visible form, which is a logos proceeding from it.2

Nature is not exactly real being, nor is it, without qualification, soul. It is true that Plotinus describes it as lower soul, as the offspring of soul (III, 8, 4, 15-16)—but even body, insofar as it is being, is soul. Nature is "the last of soul" (IV, 4,13, 3-5). Soul, by descending into plants, makes another hypostasis. Thus it "seems to" descend; it descends "in a way"; there is "something of" soul, a trace of soul (V, 2,1,17-28), in plants. Nature is a mirror image of soul, which the soul gives to the body, (I, 1, 8, 15-23). Nature, again, is an image of the World Soul’s wisdom, "possessing the last irradiated intellectuality (logos)" (IV, 4, 13, 3-5). The continuity of nature with soul is thus Plotinus’ linear continuity of an inferior with a superior.


Ver online : John Deck


[1Inge afirma bastante categoricamente: «A Natureza é a mais baixa das existências espirituais... Plotino concede realidade ou existência espiritual à natureza».