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Fernandes (FC:24-25) – Teoria do Conhecimento

quarta-feira 24 de abril de 2024, por Cardoso de Castro

  

[...] A Epistemologia — teoria do conhecimento, não apenas do conhecimento "científico" —, não pode ser a investigação daquilo que não temos, e que precisamos adquirir. Jamais se poderá, assim, compreender o que interessa, ou seja, nossa ignorância. Não filosofamos para aprender, no sentido positivo de aprender, mas, ao contrário, para desaprender o que nos sujeita. Entenda-me bem o leitor: não para aprender a respeito do que nos sujeita, como nas ciências humanas e sociais, mas para desaprender o que nos escraviza. Seria ingênuo, aqui, estar apenas trazendo à baila o batido slogan de que "não importa o que nos determina, mas sim o que fazemos disto que o que nos determina faz de nós". Isto ainda seria apenas aumentar, mais uma vez, nosso "espaço de manobra", e não uma "conversão ao Ser" Diria Platão que conhecer é lembrar-se?

A Epistemologia é, então, antes de tudo, a investigação daquilo de que precisamos nos livrar, pois compreender a ignorância é coisa distinta de investigar positivamente o conhecimento. É a verdade que liberta, não o conhecimento. Este só nos aumenta — quando não diminui — nossa ilusão de poder. Ora, à verdade não temos acesso. Para ela não há caminhos. Só podemos conhecer o falso e, assim mesmo, se formos suficientemente atentos para vê-lo pelo que ele é. É preciso ter isto sempre presente, ao investigarmos os temas clássicos da Epistemologia: a noção mesma de verdade; a relação do conhecimento com a verdade; as fontes do conhecimento (razão, experiência etc.); seu objeto (realidade, aparência); seus métodos (análise, síntese; indução, dedução); e os critérios de avaliação de seus produtos (naturalismo, sociologismo, racionalismo). Tratar-se-á, em todos os casos, segundo este nosso programa ao ar livre, de investigar aquilo de que precisamos nos livrar, jamais daquilo que precisamos adquirir. Mas o reconhecimento do falso, como falso, exige uma qualidade muito especial da atenção. Atenção ao que "é". E isto é impossível se, ao invés de olharmos para o que é, julgarmos o que ele deveria ser.


Ver online : Sergio L. C. Fernandes


FERNANDES, Sérgio L. de C.. Filosofia e Consciência. uma investigação ontológica da Consciência. Rio de Janeiro: Areté Editora, 1995