ónoma: nome
1. Os problemas filosóficos respeitantes à linguagem são introduzidos pela insistência de Heráclito na realidade da mudança e da ambiguidade tanto dos fenômenos como das nossas maneiras de os nomearmos (ver frgs. 67, 32). Mas eles aparecem numa fórmula conceptualizada mais rigidamente com a distinção dos sofistas entre natureza (physis) e convenção (nomos). Górgias, por exemplo, nega toda a ligação entre a palavra e o objeto descrito (Sexto Empírico, Adv. Math. VII, 84), levantando com isso a questão da «correção» dos nomes. Pródico deu largas lições sobre o assunto (Platão, Crát. 384b), e sabemos por Xenofonte, Mem. III, 14, 2 que era um tópico frequentemente discutido em Atenas.
2. Platão trata pormenorizadamente o problema no seu Crátilo onde a posição de que os nomes têm uma ligação natural com as coisas nomeadas é sustentada pelo heraclítico Crátilo (383a; ver rhoe), e a teoria da origem convencional da linguagem por Hermógenes (384d). A posição de Sócrates é que as coisas têm uma finalidade permanente que lhes é própria (a teoria do eidos está implícita do princípio ao fim; para a investigação médica ao longo destas linhas, ver eidos), e que a função da linguagem é social: o nome é um instrumento para nos ensinar acerca da ousia de uma coisa e para nos permitir distingui-la das outras coisas (388b-c). Segue-se então que deve ter havido um sábio legislador (nomothetes) que impôs nomes às coisas usando uma espécie de nome ideal como seu modelo (389a-390e).
3. Segue-se (423a-b) uma teoria quanto à origem mimética da linguagem: o nome é uma mimesis (q. v.) fonética do objeto, um gesto em som. Mas frente a toda a troça etimológica no Crátilo é evidente uma série de passos em que Platão toma a sério o conteúdo filosófico dos nomes: eles são um constituinte de cada afirmação (logos; Soph. 261c-262e) e parte do processo que conduz à episteme (Ep. VII, 342a ss.).
4. Aristóteles concorda com Platão sobre o caráter mimético da linguagem (Reth. 1404a20), mas os sons só se tornam nomes quando tomam um significado estabelecido por convenção (De interp. 16a), i. e., quando se tornam simbólicos. Assim, tal como Platão, Aristóteles deve muito à análise linguística como instrumento filosófico: as kategoriai (v. kategoria) são, em primeira instância, modos de predicação.
5. Epicuro estava interessado numa sólida base epistemológica para o discurso filosófico e teve dificuldades em insistir numa ligação íntima entre o conceito (ennoia e ver prolepsis) e o seu nome, i. e., o mundo do pensamento (já ligado ao mundo dos objetos pela sua teoria sensualista da aisthesis; ver aistheton e eidolon) e o da linguagem (D. L. X, 37-38). O nome, portanto, deve ser evidência clara e imediata do conceito (ibid. X, 33; confrontar enargeia). Passa depois (ibid. X, 75-76) a apresentar a sua teoria das origens da linguagem.
6. A fala decorre do desejo natural do homem de exprimir os seus próprios sentimentos (pathe). Lucrécio alarga consideravelmente este estádio de desenvolvimento (De rerum nat. V. 1028-1090), traçando a evolução da linguagem desde o gesto (segundo Platão, mas rejeitando, no mesmo passo, tanto o nomothetes platônico como o estoico), através dos sons animais, até ao balbuciar das crianças. Sobre este ponto os epicuristas e os estoicos separaram-se de maneira radical: para estes, o discurso é uma função do logos e daí que só os homens tenham verdadeira fala; os animais e as crianças emitem meros sons que são «como fala» (Varrão, De ling. lat. VI, 56; Sêneca, De ira I, 3). Depois deste estádio natural-mimético original Epicuro aceita o uso de uma estandardização convencionalizada (loc. cit.).
7. Entre Aristóteles e os estoicos deram-se grandes avanços na investigação linguística relacionada com a elucidação alexandrina do texto de Homero. Os resultados podem ser testemunhados na etimologização nem sempre feliz (etymos, adjectivo que significava «verdadeiro» em Homero, é substantivado para etymon, o verdadeiro sentido de uma palavra) na filosofia pós-aristotélica e particularmente nas teorias sofisticadas e desenvolvidas da linguística filosófica estoica. O fulcro da teoria estoica é a íntima relação entre o logos interior (pensamento) e o logos exterior (discurso; ver logos). Assim, onorna significa a coisa porque a ligação é por natureza (physis) e não, como disse Aristóteles, por convenção (SVF II, 146). Mas a explicação estoica da «natureza» está muito mais próxima da exposição socrática já citada do Crátilo. Os estoicos acreditavam também que a ligação entre os nomes e a verdadeira natureza das coisas brota da sabedoria de um primitivo legislador que «impunha» nomes às coisas (ver Amônio, In de interp. 35, 16; 36, 23; confrontar SVF II, 1066, 1070), tal como Adão é descrito fazendo-o por Fílon em Leg. ali. II, 14-15. Deste modo o logos exterior revela a essência íntima das coisas, e os estoicos prestaram consequentemente grande atenção às etimologias, que por sua vez os levaram a discussões complexas quanto a saber se os nomes estavam relacionados com as coisas através do princípio etimológico da analogia (analogia) ou com o seu inverso, a anomalia (Varrão, De ling. lat. IX, 1, citando Crisipo; ver a derivação notória de lucus do non lucendo em Quintiliano I, 6, 23). A etimologização estoica torna-se universal em toda a literatura filosófica subsequente. [FEPeters]