Apenas consideraremos a causalidade na linha da eficiência, a qual é, aliás, aquela onde esta noção se encontra mais normalmente posta em questão pela crítica. Nessa linha, duas provas principais, uma mais particular, outra mais profunda, do principio de causalidade podem ser dadas.
– Tudo o que é movido é movido por um outro.
É a formulação aristotélica comum do princípio de causalidade. Numerosas justificações podem ser dadas no plano físico. Aqui nos situaremos por completo no ponto de vista da análise metafísica do movimento em potência e ato, onde se atingem imediatamente as razões metafísicas mais profundas. (Cf. Tomás de Aquino, Prima via, Ia Pa, q. 2, a. 3).
Partamos do movimento no sentido global, onde este termo designa toda passagem da potência ao ato, isto é, praticamente todo o devir. Por outro lado, consideremos a existência do movimento como um fato evidente. E eis como raciocinamos.
Todo movimento é uma passagem da potência ao ato.
Ora, um ser em potência não pode ser atuado senão por um ser em ato: de potentia autem non potest aliquid reduci in actu nisi per aliquid ens in actu.
Por outro lado, nenhum ser podendo estar em ato e em potência soba mesma relação, resulta finalmente que a passagem da potência ao ato não pode se efetuar senão sob a ação de um outro que esteja em ato: omne ergo quod movetur opportet ab alio moveri.
– O ser que não é por si é necessariamente por um outro.
Aqui tomamos nosso ponto de partida não mais na mudança, mas no ser que não é por si, isto é, cuja existência não decorre necessariamente de sua natureza ou de sua essência: é o contingente, o qual pode ser ou não ser; todos os seres que nos são experimentalmente dados são seres contingentes.
Consideremos um ser contingente: por si, pode tanto existir como não existir; isto é, sua existência vem de algum modo se acrescentar à sua essência; devido a isto, tal ser é uma união, uma composição de elementos diversos. Ora, o que é diverso não pode por si constituir uma unidade, a menos que uma causa exterior intervenha para dar a explicação da unidade: “quae enim secundum se diversa sunt, non conveniunt in aliquid unum, nisi per aliquam causam adunantem ipsa” (Ia Pa, q. 3, a. 7). O ser contingente onde se encontra realizada uma tal unificação de elementos diversos requer, portanto, necessariamente uma causa.
– Justificação pelo princípio de razão de ser.
Reencontramos a mesma conclusão considerando o princípio de causalidade como uma aplicação do princípio de razão de ser.
Todo ser que não tem sua razão de ser por si, tem-na por um outro. Ora, o ser contingente é um ser nestas condições: sua existência não tem sua razão de ser na sua essência; portanto, o ser contingente tem sua razão de ser em um outro, isto é, ele é causado.
– Valor do princípio de causalidade.
Observou-se justamente que o princípio de causalidade não é um princípio estritamente analítico, isto é, que o predicado “ser por um outro” não está contido no seu sujeito “o ser que não é por si”. Em outras palavras, posso muito bem conceber o ser contingente, este objeto que percebo atualmente, sem remontar à sua causa. Entretanto, é preciso estabelecer que, de modo derivado, o princípio de causalidade é uma verdade evidente, pois a causa se segue, como uma propriedade necessária, à natureza do contingente. Desde que compreendi o que é “o ser que não é por si” e “o ser que é por um outro”, vejo que há implicação destes dois termos, “o ser que não é por si é por um outro”
“licet habitudo ad causam non intret definitionem entis quod est causatum, tamen sequitur ad ea quae sunt de ejus ratione, quia ex hoc quod aliquid per participationem est ens, sequitur quod sit causatum ab alio. Unde hujusmodi ens non potest esse quin sit causatum, sicut nec homo quin sit risibilis”.
Ia Pa, q. 44, a. 1, ad 1
No fundo, esta constatação repousa sobre a impossibilidade em que se encontra “o ser que não é por um outro” em se ver multiplicado. ” O ser que não é por um outro”, com efeito, não pode ser senão “por si”. E portanto o contingente, se não fosse causado seria um “ser por si”; haveria, por conseguinte, vários “ser por si”. Mas, por outro lado, “o ser por si”, aquele cuja natureza é ser, deve ser único, pois o ser infinito não pode ter semelhante: não há vários Deuses. Há, pois, contradição. [Gardeil]