(in. Given; fr. Donné, al. Gegeben; it. Dato).
Em geral, o ponto de partida ou a base de uma indagação qualquer, o elemento, o antecedente, a situação da qual se parte ou que serve de respaldo para formular um problema, fazer uma inferência, aventar uma hipótese. O dado tem, portanto, caráter funcional: o que se assume como dado para certo tipo ou ordem de indagação pode ser, por sua vez, tomado como problema para outro tipo ou ordem de pesquisa.
A palavra moderna tem provavelmente origem matemática (“um segmento dado”, “um número dado”, etc). Na filosofia moderna, a existência de dado últimos, irredutíveis, foi utilizada como a existência de um limite ao conhecimento, ou seja, de uma condição que ao mesmo tempo restringe e garante a validade do próprio conhecimento. Foi desse modo que Locke utilizou as ideias: sem ideias não é possível o conhecimento, que é percepção de uma relação entre as próprias ideias (Ensaio, IV, 3, 1). Para ele, além das ideias, também são dadas (embora ele não lhes dê esse nome) as condições da percepção, do conhecimento racional e do conhecimento sensorial; estas limitam a extensão do conhecimento, que acaba sendo menor do que o das ideias (Ibid., IV, III, 6). Para Kant, o dado é a presença do objeto na intuição sensível (Crít. R. Pura, § 1): presença que torna a intuição uma faculdade passiva, não criadora, como poderia ser a intuição intelectual de Deus (Ibid., IV, § 8). Como é óbvio, nesse sentido o dado é eliminado das filosofias que negam o caráter condicionado e limitado do conhecimento humano e o transformam em atividade criadora. Assim, Fichte de certo modo contrapõe o conceito de posição ao conceito de dado: “Fonte da realidade é o Eu. Só através do Eu e com ele é dado o conceito da realidade. Mas o Eu é porque se põe e põe-se porque é. Portanto, pôr-se e ser são uma e a mesma coisa” (Wissenschaftslehre, 1794, § 4, C). Por outro lado, não é só o idealismo romântico que elimina a noção e a função do dado. O próprio neo-criticismo, que interpreta a doutrina de Kant como idealismo gnosiológico, nega a função do dado. Diz Cohen: “O pensamento não é síntese, mas produção, e o princípio do pensamento não é um dado, de algum modo independente dele, mas é a origem (Ursprung). A lógica do conhecimento puro é uma lógica da origem” (Logik der reinen Erkenntnis, 1902, p. 36). E, para Natorp, o dado não está no início do processo do conhecimento, como a sua matéria bruta, mas no fim do processo como determinação final. Considera-se como dado o objeto que se conseguiu determinar completamente (Philosophie, 1911, p. 60).
Na filosofia contemporânea, interessada em estabelecer as condições limitativas do conhecimento, a noção de dado volta a ter seus direitos. O espiritualismo francês, de Maine de Biran a Bergson, considerou o dado como um privilégio da experiência interior, isto é, da consciência. O Ensaio sobre os dados imediatos da consciência, de Bergson (1889), apresenta-se como a tentativa de rastrear o dado originário da consciência em sua pureza, libertando-o das superestruturas intelectuais. Tal dado originário é, para Bergson, a duração da consciência, ou seja, a vida da consciência como autocriação e liberdade. Para grande parte da filosofia contemporânea, o dado é, como para Bergson, um dado da consciência, que só pode ser descoberto e reconhecido na busca da própria interioridade. Para Husserl, porém, o dado assume significado mais geral. Segundo ele, qualquer procedimento rigoroso, seja ele científico ou filosófico, tem o dever de voltar-se para o “dar-se originário” das coisas e fazer as coisas falar. “Julgar as coisas racional ou cientificamente”, diz ele, “significa voltar-se para elas, remontar dos discursos e das opiniões às próprias coisas, interrogá-las em seu dar-se (Selbstgegebenheit) e eliminar todos os preconceitos alheios a elas” (Ideen, I, § 19). A pesquisa fenomenológica, da forma como é concebida por Husserl, consiste em pôr-se na condição em que as coisas se dão, em que se revelam na sua essência. Dewey entende o dado como situação total de onde são extraídos os elementos para as soluções de um problema. “O que é dado, no sentido estrito da palavra, é o campo ou “a situação total. O dado, no sentido de singular, seja objeto ou qualidade, é o aspecto, o momento ou o elemento especial da presente situação real, e é abstraído desta a fim de localizar e identificar seus traços problemáticos, com referência à indagação que se deve efetuar naquele momento e naquele lugar. Para ser mais exato, o dado singular é mais uma assunção do que um dado” (Logic, cap. VII; trad. it., p. 181). O uso filosófico estabelece, portanto, dois conceitos diferentes da noção de dado: 1) o dado é o ponto de partida da análise, isto é, a situação de que se parte para resolver um problema ou as assunções ou os antecedentes de uma inferência ou de um discurso qualquer; 2) o dado é o ponto de chegada da busca porque é o que se obtém quando se retiram do campo de indagação preconceitos, opiniões ou superestruturas falsificadoras, permitindo que se mostre e manifeste a realidade enquanto tal. O primeiro sentido foi assumido por Locke, Kant e Dewey; o segundo sentido, por Natorp, Bergson e Husserl. [Abbagnano]