O estudo aprofundado das Meditationes de prima philosophia de Descartes e a reflexão sobre a crítica kantiana da razão pura levaram-no à concepção de uma fenomenologia transcendental e «ao conceito e uso concreto da redução fenomenológica» alcançando uma primeira elaboração sistemática nas lições do ano de 1907, em Göttingen, editadas as cinco primeiras em 1950 com o título A ideia de fenomenologia. É nas duas primeiras lições que Husserl trata «da dedução completa e suficiente do principio gnoseológico: em toda a investigação gnoseológica de qualquer tipo de conhecimento é preciso executar a redução gnoseológica, isto é, marcar toda a transcendência que aí entra em jogo com o índice de posição fora de circuito ou do índice de indiferença, de nulidade gnoseológica, de um índice que diz isto: a existência de todas estas transcendências, creia eu nelas ou não, em nada me diz aqui respeito; aqui não há lugar para formular um juízo sobre ela, fica inteiramente fora de jogo». É por esta redução gnoseológica, ou como Husserl logo adiante prefere, redução fenomenológica, que obtenho um dado absoluto, sem transcendência alguma, conquistando aquela ausência de pressupostos que o segundo volume das Investigações Lógicas exigia. Não vamos examinar em pormenor as ideias sobre a redução fenomenológica expendidas nesta obra; só adquirem pleno sentido em função do que será dito em obras posteriores, em que os problemas da redução fenomenológica aparecem postos em todo o seu alcance. Basta-nos sublinhar que A Ideia da Fenomenologia, integralmente orientada para o problema do conhecimento, considera necessário o retorno a doações absolutas (absoluten Gegebenheiten). Este regresso à esfera da doação absoluta é o que caracteriza o método da redução fenomenológica.
Estas considerações sobre a redução fenomenológica apresentadas em A Ideia da Fenomenologia foram ampliadas, sistematizadas e corrigidas no primeiro volume das Ideias para uma fenomenologia pura e uma filosofia fenomenológica e em Meditações Cartesianas, constituindo uma via de redução, a que se chamou cartesiana, elaborada com base em determinada interpretação das duas primeiras meditações metafísicas de Descartes. O estudo e a publicação dos inéditos husserlianos revelaram, paralelamente a esta, outras vias, que o filósofo foi construindo mas o certo é que a via cartesiana foi a primeira no tempo a ser desenvolvida e aquela em que mais trabalhou; nas obras editadas em vida, salvo num passo ou noutro, tal como acontece em Lógica formal e lógica transcendental, é sempre a ela que recorre. De sorte que podemos, de certo modo, designá-la pelo caminho puro e simples da redução. Esta via tem ainda a vantagem de integrar o pensamento de Husserl numa vasta perspectiva histórica, tornando a sua compreensão mais acessível. Por isso será a adoptada neste breve estudo. [Morujão]