Cf. Aristóteles, De Anima, III, c. 9-11 e o Comentário de Tomás de Aquino.
A questão da existência de uma faculdade especial, relativa ao movimento local dos viventes, parece ter preocupado seriamente a Aristóteles. Os animais, ao menos alguns entre eles, deslocam-se de modo espontâneo. Isto é um fato. Mas não bastaria para explicá-lo recorrer às potências que já conhecemos?
A faculdade nutritiva, a mais elementar de todas, é evidentemente incapaz de explicar tais fenômenos. O movimento é dirigido por um fim e isto supõe a intervenção de atos psíquicos, como representações e desejos, que não são encontrados na planta que, efetivamente, permanece imóvel. A simples sensação é aqui igualmente ineficaz, pois não há animais que sentem e não se movem? Não se poderia dizer então, que é o intelecto, auxiliado pela imaginação e o desejo ou inclinação sensível, que está na origem dos processos de deslocação? De maneira incontestável, atingimos a que os verdadeiros antecedentes deste modo de atividade: tenho o pensamento de ir para tal lugar e o desejo de chegar até lá e, sob este dúplice impulso, ponho-me a caminho. Mas que se observe bem que por si sós, a representação e o desejo não podem bastar. Sem dúvida é exigido o concurso destes dois elementos, mas, além disso, é necessário, para que eu me coloque em marcha, a intervenção de uma potência encarnada nos órgãos motores do corpo. O paralítico, no qual estas potências encontram-se como que presas, não se pode mover, seja qual for seu desejo de o fazer e sejam quais forem as imagens motores que possa evocar. Para se deslocar, pois, o animal deverá, sempre dirigido pelas potências superiores de conhecimento e apetência, pôr em funcionamento uma potência orgânica especial que, de modo imediato, provocará o movimento dos membros donde resultará a mudança de lugar.
Nesta análise, cujo interesse não passará despercebido a ninguém, Aristóteles parece ter tido diretamente em vista os movimentos de deslocamento conscientes e diretamente imperados, seja pela vontade deliberada (somente no caso do homem), seja pelo psiquismo sensitivo (para todo animal). De modo corrente admitem os psicólogos a existência paralela de reflexos automáticos que acionam a potência motora sem a intervenção das faculdades psíquicas superiores. Aqui seria o caso de se abrir todo um capítulo da psicologia do subconsciente que Tomás de Aquino não escreveu e do qual consequentemente não temos nada a dizer. [Gardeil]