Filosofia – Pensadores e Obras

Cohen

O fundador reconhecido da escola de Marburgo foi Hermann Cohen (1842-1918), professor em Marburgo e autor, entre outros, dos seguintes trabalhos: A teoria de Kant da experiencia pura (1871), O fundamento da ética kantiana (1871), A influência de Kant sobre a cultura alemã (1883) e O fundamento da estética kantiana (1889). Defensor de um socialismo não-materialista, Cohen estudou profundamente Platão e escreveu uma historia do cálculo infinitesimal (O principio do método infinitesimal e sua historia, 1882). (Comentando este último escrito, Gottlob Frege escreveu que Cohen “não brilha pela clareza e, por vezes, é até ilógico”).

A ciência, mais precisamente a física matemática, assume papel de máxima importância na concepção de Cohen. Aceita ele a ciência como válida e concebe a filosofia exatamente como o estudo das condições de validade da ciência. Ora, o positivismo vira o valor da ciência no fato sagrado, absoluto e intocável: para o positivista, em suma, objetivo é o fato, objetiva é a sensação, isto é, o a posteriori. Cohen retorna a Kant, subvertendo a concepção positivista. Como escreve ele em A teoria de Kant da experiência pura, o fundamento da objetividade da ciência está no a priori.

Para ele, com efeito, a ciência não é e não se desenvolveu como caos de percepções, nem é acumulo de sensações ou de fatos observados. A realidade é que a ciência não se constituiu tanto pela acumulação de fatos, e sim muito mais pela unificação dos fatos por meio de e sob hipóteses, leis e teorias. Mas as leis e teorias não extraímos nós dos fatos, e sim os impomos aos fatos: a teoria é o a priori. E a filosofia indaga exatamente os elementos “puros”, ou seja, os elementos a priori, do conhecimento científico. A filosofia, portanto, deve ser metodologia da ciência. Assim como o foi para Kant.

Com efeito, Cohen identifica a crítica kantiana com “a crítica do sistema, dos métodos e dos princípios de Newton”. Em outros termos, por exemplo, Kant não extraiu as suas doze categorias estudando as faculdades cognoscitivas em geral, mas elas são o fruto maduro de sua reflexão filosófica sobre os princípios de Newton. Assim, nem a interpretação idealista de Kant, nem a interpretação psicologista (como a sustenta Fríes), mas a interpretação “lógica” de Kant: a crítica é metodologia da ciência. E essa a condição para que a filosofia conserve o seu caráter rigoroso sem ceder às tentações da metafísica idealista (que, segundo Cohen, reconduziu a filosofia à Idade Média), das reduções psicologistas ou dos erros positivistas.

É preciso, portanto, voltar a Kant. Mas Kant também não é infalível. E Cohen contesta dois pontos de Kant. Antes de mais nada, ele rejeita a referência à coisa em si, reinterpretando-a como princípio de autolimitação da experiência: nós procuramos o todo, com teorias sempre mais gerais, mas sempre encontramos partes. Ademais, Cohen também refuta a distinção kantiana entre sensibilidade e intelecto: ele identifica espaço e tempo, isto é, as formas da sensibilidade, com as categorias — o tempo é a condição da pluralidade dos fenômenos, enquanto o espaço o é da sua exterioridade. [Reale]