(in. Socialism; fr. Socialistne; al. Sozialismus; it. Socialismo).
Este termo, que se difundiu na Inglaterra (em oposição a individualismo) nas primeiras décadas do séc. XIX, tem duas significações principais:
1) Uma significação mais ampla, designando, em geral, qualquer doutrina que defenda ou preconize a reorganização da sociedade em bases coletivistas. Nesse sentido, são socialismo o de Platão e o de Marx, o de Owen e o de Proudhon, o de Lênin e o de Stálin. Refere-se a esse significado a distinção feita por Marx e Engels entre socialismo utópico, para o qual a sociedade socialista é um ideal que não leva em conta as vias ou os modos de realizá-la, e o socialismo científico, que, sem apresentar qualquer ideal, prevê o advento inevitável da sociedade socialista com base nas próprias leis que determinam o desenvolvimento da sociedade capitalista (cf. sobre esta distinção, especialmente: Engels, Antiduhring, 1878, introdução e cap. I da III parte).
Neste sentido, o termo é muito vago e indica qualquer aspiração, ideal, tendência ou doutrina que tenha em vista alguma transformação da sociedade atual em sentido coletivista.
2) Em sentido mais restrito, entendem-se por socialismo as correntes coletivistas que se distinguem do comunismo e se opõem a ele, enquanto: a) excluem a necessidade da ditadura do proletariado; b) excluem que tal ditadura possa ser exercida, em nome do proletariado, por qualquer partido político; c) excluem a diferença radical, que se observa nos países de regime comunista, entre a qualidade de vida da elite dirigente e a da maioria dos cidadãos; d) excluem a subordinação da vida cultural às exigências do partido, à vontade de seus dirigentes; e) exigem respeito às regras do método democrático.
A distinção das formas históricas que o socialismo assumiu diz respeito à política mais que à filosofia, não pertencendo, portanto, à sua alçada. [Abbagnano]
O socialismo apresenta-se como uma espécie de mundividência, como sistema de ordem social e, acima de tudo, como movimento de crítica e de reforma social no âmbito da política e da organização cooperativa e sindical. Resultante da confluência de fontes ideológicas as mais variadas e até contraditórias, o socialismo hoje mais do que nunca está longe de possuir unidade de pensamento. Entre meados do século XIX e a primeira guerra mundial prepondera o socialismo marxista até ao ponto de se ter formado uma visão unitária do mundo e de o socialismo se poder equiparar ao marxismo. Desde que se tornou definitiva a cisão do socialismo marxista em uma ala comunista e outra revisionista, partidária da democracia livre, desligando-se a segunda cada vez mais, não só do materialismo dialético e histórico, mas também das doutrinas econômicas de Marx, o socialismo não comunista deixou de ter uma base comum como laço de união resta unicamente uma declarada atitude de crítica social contra a economia do capitalismo e a sociedade capitalista (integrada por classes). Embora não generalizada, amplia-se mais e mais uma atuação prática (ética) que prescinde de toda e qualquer consideração relativa a uma ordem ultramundana.
O contraste entre o socialismo e a concepção cristã reside principalmente na explicação da sociedade humana e da condição social do homem: o socialismo, orientando-se unilateralmente para a necessidade de complementação que o homem sente e para as vantagens da divisão do trabalho e da associação dos trabalhadores, faz que a sociedade por ele preconizada se converta numa organização que tem em mira só o interesse e, enquanto tal, impotente para ligar o homem com vínculos morais. Um socialismo, que se libertasse desta concepção, não precisaria de opor-se necessariamente à concepção cristã.
Para o “homem da rua” o socialismo é ainda hoje sinônimo de socialização dos meios de produção; pelo contrário em muitos países o socialismo passou a insistir na planificação econômica (dirigismo); na Alemanha procura, antes de tudo, pôr sob controle do governo (democrático) os “livres” poderes sociais e econômicos. — Nell-Breuning. [Brugger]
Em face do liberalismo surge o socialismo como doutrina social, que nega os benefícios daquela para afirmar apenas seus defeitos, que são atualizados, e que afirma que, em substituição da iniciativa privada e do jogo livre dos interesses sociais e dos grupos, pode-se econômica e politicamente organizar a sociedade, de modo a oferecer melhor bem estar coletivo e individual a todos, através de certas práticas que são distintas segundo as diversas maneiras de conceber o fato social e econômico, consoante ao modo de ver das várias escolas socialistas e socializantes.
Distinguem-se os socialistas em autoritários e libertários. Os primeiros afirmam que a transformação da sociedade, de liberal para socialista, ou de qualquer outra forma para esta, deve-se dar por um ato de autoridade, que pode ser coletivo, como a revolução, que rompe a ordem existente, mas que passa a ser orientada por um partido ou facção, rigidamente organizado, que constitui a vanguarda e é o dirigente do movimento, capaz de marcar a direção para o socialismo, através de uma férrea disciplina e ordenação do processo pós-revolucionário, como entre os marxistas. Há, aqui, lugar para uma tendência moderada, que propugna a realização do socialismo pela ascensão ao poder de um partido, que dirigiria dentro dos quadros políticos liberais (democráticos), a marcha para a conquista constante das reivindicações socialistas, até alcançar pelo apoio da maioria a implantação do regime em substituição do liberal. Este é o pensamento do socialismo democrático.
Os socialistas libertários distinguem-se em dois grandes grupos. A dos que aceitam a forma revolucionária e o dos que aceitam a forma evolucionárias. Em linhas gerais, os socialistas libertários são contrários à admissão de uma direção por minorias, pois consideram que toda direção de grupos ou facções ou partidos tende ao abuso e ao excesso de poder. Consideram que a transformação da sociedade liberal para a socialista deve dar-se através da revolução permanente, realizada pelas associações livres, que deverão procurar experimentar as possíveis formas de vida. Ou seja, concede a iniciativa ao homem em geral, dentro dos seus grupos e afins.
Quanto à maneira de alcançar o socialismo, para uns o ponto de partida é o revolucionário ,para outros o evolucionário. Entre os primeiros temos os anarquistas (vide anarquismo), e entre os segundo, os mutualistas, os cooperativistas, os cooperacionistas e alguns anarquistas comunistas. Os socialistas autoritários tendem e permanecem no socialismo de Estado, e os libertários tendem para a diminuição do poder despótico do Estado. Entre os primeiros há os que afirmam que alcançarão o anarquismo, a abolição do Estado (o que os fatos desmentem), como na Rússia, apesar das críticas prévias que lhes dirigiram os libertários. Estes afirmam que a abolição do Estado não pode ser obtida através do seu fortalecimento, mas através de uma lenta ou imediata abolição do mesmo. É impossível compendiar todas as modalidades de socialismo, pois têm surgido, quase tantas, quantos socialistas de pensamento autônomo tem aparecido. Em suma, o socialismo é a doutrina social que pode ser compendiada por suas negações e por suas afirmações. Nega validez à liberal democracia e a tudo quanto é fundamental desta, para afirmar que o bem-estar do homem só pode ser obtido pelas formas coletivas de organização social, com maior ou menor restrição da liberdade.
O anarquismo surge como uma exceção, porque julga que a ausência de liberdade não concederá ao homem melhor situação nem aumentará a sua dignidade. Só pela livre experiência social poderá o homem encontrar uma solução para a sua vida. [Mário Ferreira dos Santos]