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Rosset (2012) – idiotice

sexta-feira 15 de março de 2024, por Cardoso de Castro

  

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Não é apenas da Virgem que o poeta fala, é de tudo o que é virgem na medida em que é singular, escapando aos olhos do corpo e à interpretação da mente, na medida em que se resume a ser isso e nada mais do que isso. Uma única palavra exprime este duplo caráter, solitário e incognoscível, de tudo o que existe no mundo: a palavra idiotice. Idiôtès, idiota, significa simples, particular, único; por uma extensão semântica cujo significado filosófico é abrangente, pessoa desprovida de inteligência, ser desprovido de razão. Todas as coisas, todas as pessoas, são assim idiotas quando existem apenas em si mesmas, isto é, quando são incapazes de aparecer para além de onde estão e como são: incapazes, antes de mais, de se refletirem, de aparecerem no duplo do espelho. No entanto, o destino de toda a realidade é, em última análise, o fato de não se poder duplicar sem se tornar imediatamente outra coisa: a imagem oferecida pelo espelho não pode ser sobreposta à realidade que sugere. É o caso, em particular, do universo, que Ernst Mach descreveu, numa fórmula muito estranha e muito profunda, como "um ser unilateral cujo complemento em espelho não existe ou, pelo menos, não nos é conhecido". Nenhum espelho pode captar o reflexo do universo, nenhum olho pode captar o corpo da Virgem: o universo não tem outro lugar, o corpo da Virgem grega é tudo em si, aos olhos de quem vê. O mundo, todos os corpos que ele contém, carecem para sempre do seu complemento em espelho. São eternamente idiotas.

original

Un poète grec a écrit

Ομμασι σωμα τεόν λήψεσθαι, παρθένε, φάσχου
υήπιος όυ τι γὰρ έστ´όμματα, σώμα δέ πάυ
 
(Insensé quand j’ai cru de mes yeux saisir ton corps, ô Vierge,
Puisque mon œil n’est rien et que ton corps est tout.)

Ce n’est pas seulement la Vierge dont parle le poète, c’est toute chose qui est vierge en tant qu’elle est singulière, échappant, dès lors qu’elle se résume à être cela et rien que cela, aux yeux du corps comme à l’interprétation de l’esprit. Un mot exprime à lui seul ce double caractère, solitaire et inconnaissable, de toute chose au monde : le mot idiotie. Idiôtès, idiot, signifie simple, particulier, unique ; pub, par une extension sémantique dont la signification philosophique est de grande portée, personne dénuée d’intelligence, être dépourvu de raison. Toute chose, toute personne sont ainsi idiotes dès lors qu’elles n’existent qu’en elles-mêmes, c’est-à-dire sont incapables d’apparaître autrement que là où elles sont et telles qu’elles sont : incapables donc, et en premier lieu, de se refléter, d’apparaître dans le double du miroir. Or, c’est le sort finalement de toute réalité que de ne pouvoir se dupliquer sans devenir aussitôt autre : l’image offerte par le miroir n’est pas superposable à la réalité qu’elle suggère. C’est le cas, notamment, de l’univers, qu’Ernst Mach a décrit, dans une formule très étrange et très profonde, comme « un être unilatéral dont le complément en miroir n’existe pas ou, du moins, ne nous est pas connu 16 ». Aucun miroir ne peut saisir le reflet de l’univers, aucun œil ne peut saisir le corps de la Vierge : l’univers est sans ailleurs, le corps de la Vierge grecque est tout, à lui seul, aux yeux de celui qui le contemple. Le monde, tous les corps qu’il contient, manquent à jamais de leur complément en miroir. Ils sont à jamais idiots.


Ver online : Clément Rosset


ROSSET, Clément. Le Réel. Traité de l’idiotie. Paris: Minuit, 2012