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religião

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Religião

I. Os fundamentos em Platão: embora não haja qualquer correspondente grego para o termo “religião”, que etimologica-mente remete ao latino religare (cf. Feil 1986, p. 32-49), a religião e seu efeito desempenham um papel importante nos diálogos de Platão. A antiga POLIS, como Platão a conheceu, não era de modo algum uma grandeza exclusivamente política, mas também uma comunidade religiosa, como mostram especialmente as principais obras de filosofía política de Platão, a República   (377c-380c) e as Leis (884a-886a e 909d-910d) (cf. Voegelin 1957/2000, p. 271 [“... a theocratie State”], p. 277-282; também Guthrie   1978, V, p. 357 s.). Isso é claramente evidenciado pelo encontro do Sócrates platônico com o jovem sacerdote ateniense (propriamente um vidente) Eutífron  : a piedade conduz à justiça (Eutíf. 12d- 13a). A justiça repousa na religião como uma força fundamental e criativa da comunidade política e social e de seu destino (cf. Ono 1934, p. 257-281; GUTHRIE   1975, IV, p. 109-111). Um homem ateu ou sem religião — se é que pode haver alguém assim — deveria ser expulso da polis. Ele não está apto para a comunidade de lá. A religião que apoia a polis, ou seja, a religião política da Antiguidade, ensina um céu de deuses politeísta (cf. Goldschmidt 1949, p. 120-138; ver DEUS). A atuação do onipresentemente divino (to theion) é mediada de múltiplas maneiras; conforme a divindade, há diferentes tarefas e competências, começando pelo deus criador (Tim. 27d-29e; cf. Goldschmidt 1949, p. 49-54). Esse complicado entrelaçamento da atuação fatídica não pode ser simplificado nem suprimido. Tal procedimento, do qual justamente os filósofos se tornam suspeitos, é proibido com ameaça de punição, como mostram paradigmaticamente o desterro de Anaxágoras   (Apol. 26d) e o processo contra Sócrates (Apol. 19c e 23d-e). Ambos, Anaxágoras e Sócrates, foram fundamentalmente acusados de “falta de religião” (asebia) (oude theous nomizein, “... que nem sequer acreditam em deuses”, Apol. 18c). Com isso eles, segundo o julgamento da maioria dos atenienses, se puseram contra a tradição da polis. A mitologia politeísta representa o fundamento filosófico-teológico da religião política (ver MITO, POESIA): Homero   e mais ainda Hesíodo   mostram em suas obras épicas (Ilíada e Odisseia, também Teogonia) que a reflexão mítica sobre os deuses se encontra no início do ser e do pensamento. Contudo, de modo habilidoso, Platão — sem negar expressamente o politeísmo — não orienta sua filosofia pela arbitrariedade e pela multiplicidade, mas pela unidade do bom, verdadeiro e belo na ideia do bem (ver BEM), que, com suas propriedades de eterno, imutável e incriado, não só lembra o conceito do ser parmenidiano, mas também prepara o caminho para posições clássicas da teologia cristã. Portanto, com sua ideia do bem Platão também aponta para uma fonte do ser (Rep. 517b-c). A ideia do bem tem, com isso, uma qualidade inconfundivelmente divina. Sem dúvida, Platão, que aparece no pensamento de Agostinho como um guia para Cristo, não se volta diretamente contra a religião política politeísta de sua épo ca, mas ele adverte intensamente contra perder-se na pluralidade do ser, que, como Aristóteles o expressa mais tarde, pode ser dito de múltiplas maneiras (to de on legetai men pollachôs, “O ser se exprime de muitos modos”, Aristóteles, Metafísica 1003 passim). A quase divindade da alma, que se deve especialmente à sua IMORTALIDADE, também aponta para a tônica monoteísta no pensamento de Platão. Assim, a teologia platônica (Rep. 379a-b) não tem a ver apenas com o discurso sobre Deus, o divino e os deuses, mas também com a busca pela verdade, que deve ser encontrada no fundamento do ser, o bem supremo. [SHÄFER]