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Encontro com Sócrates
domingo 1º de setembro de 2024
Excertos do livro de Gaston Maire, "Platon ", trad. para português de Rui Pacheco.
Seja o que for esta primeira formação filosófica (v. Biografia), está fora de dúvida que o momento capital da vida do jovem Platão foi a descoberta de Sócrates , a quem ficaria ligado de 408 a 399, quer dizer, a partir dos seus vinte anos. Este primeiro encontro do Mestre e do maior dos seus discípulos revestiu-se de tal importância que foi prontamente cercado de mistério pela lenda platônica: Diógenes Laércio relata-nos que Sócrates viu em sonhos, na noite que precedeu a chegada de Platão ao seu círculo habitual, um cisne que se sentou sobre os seus joelhos e se cobriu de penas, antes de voar, e que, no dia seguinte, reconheceu no recém-chegado, o pássaro que vira em sonhos... Sem entrar, pelo menos de momento, no pormenor do que Platão pôde reter do método e das ideias de Sócrates, assim como da transposição que fez deles, é permitido adiantar que, nas lições do Mestre, ele reparou sobretudo, devido às suas próprias preocupações e problemas de momento, na ideia de uma política fundamentada na verdade e na justiça, apresentando-se-lhe Sócrates como a própria encarnação desta adesão à verdade e à justiça. Não haveria aí uma resposta aos problemas que Platão tinha inevitavelmente de levantar, como os jovens do seu meio social, posição e época? O mundo grego encontrava-se em vias de uma profunda transformação; cada um vivia os seus sobressaltos sem que entendesse sempre o sentido e o alcance dela: assistia-se à dissolução da ordem secular representada pelo equilíbrio da vida das cidades; o espírito cívico tinha sido atingido. Em 413, a expedição da Sicília — empreendida a instâncias de Alcibíades (que deveria, pouco depois, refugiar-se em Esparta e trair a sua pátria para não ter de responder a duas acusações de impiedade), com o fim de auxiliar os vizinhos de Siracusa ameaçados na sua autonomia — termina num desastre, em que Atenas perde a sua melhor esquadra e cerca de 40 000 homens. Em 404, Atenas capitula frente a Esparta, entrega a frota, renuncia ao seu império e arrasa os muros. O regime democrático, tido por responsável das infelicidades da cidade, é derrubado; uma minoria, apoiada por Esparta, que então ocupa Atenas, impõe o governo oligárquico dos Trinta, constituído por um Conselho de trinta magistrados, entre os quais figurava o tio de Platão, Crítias, enquanto outro parente próximo, Cármides , era enviado como comissário ao Pireu; não é inútil acrescentar que Crítias é conhecido como o mais cruel dos que foram considerados como tiranos. Platão tem então 22 anos. Tal como os jovens aristocratas que o rodeiam, tal como o próprio Sócrates, ele é, em princípio, favorável ao regime lacedemônio, devido à ordem e ao civismo que o caraterizam, e está inicialmente a favor do governo dos Trinta, que pensa, tal como os outros, poder restabelecer a justiça; mas em breve tem de se render à evidência: Sócrates tem de se levantar contra um poder que pretende apoderar-se de um inocente que se lhe opõe; Platão vive a sua primeira decepção política (Carta VII, 324 d-e). O regime instaurado pelos Trinta duraria apenas alguns meses: nos finais de 404 ou princípios de 403, tendo Trasibulo restabelecido a antiga Constituição, Atenas conheceu uma viva reação democrática: por motivos e sobretudo mobiles impossíveis de analisar aqui, Sócrates foi uma das primeiras vítimas; inculpado de impiedade e de «corrupção» da juventude, foi condenado a beber a cicuta (399).