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Satz Pecado

segunda-feira 1º de janeiro de 2024, por Cardoso de Castro

  

Mario Satz   — PECADO
Cabala  

Não é outro o objeto da sabedoria: prevenir o erro, ou, vendo pelo lado negativo, mitigar as consequências do erro. Ajustar constantemente a lente da vida. "Os cristãos ortodoxos seguiam o tradicional ensinamento judeu — escreve Elaine Pagels   em seu livro "Evangelhos   Gnósticos  " — de que o que separa a humanidade de Deus, além da dessemelhança essencial, é o pecado humano. A palavra que no Novo Testamento significa "pecado", hamartia, tem sua origem no esporte do arco e flexa e significa literalmente "errar o alvo". As fontes do Novo Testamento nos ensinam que se padecemos aflições, mentais e físicas, é porque não alcançamos o objetivo moral que temos em mira". Por outro lado, a palavra hebraica que corresponde a "pecado" é jetta, que possui uma misteriosa semelhança fonética com jitá, "trigo". Ambas compartilham duas letras — o jet e o tet — oitava e nona respectivamente na sequência alfabética. Nos mistérios de Elêusis, a espiga de trigo era o símbolo trágico da morte e ressurreição, e portanto de toda renovação espiritual. No âmbito hebreu, essa raiz semântica do trigo faz referência a palavras como "pureza", "separação", "eleição", "aliança", "bênção". Pecar, poderíamos então dizer, é em sua origem atentar contra a semente, desperdiçar o grão, tanto como desconhecer seu ciclo.

Se lembrarmos agora que, segundo o Gênesis, viemos ao mundo pela transgressão de Adão e Eva — que depois de ingerir o pomo de sua fatalidade fica grávida e gera o terceiro em discórdia —, compreenderemos melhor que reproduzir-nos, viver e pecar são inexoravelmente uma e a mesma coisa. Pelo simples fato de viver, morreremos. Mais ainda, atendo-nos ao puro significado emblemático de jet, a "vida", e tet, todo processo "germinal", "embrionário" — já vimos que essas são as letras compartilhadas pelos vocábulos "pecado" e "trigo" —, descobrimos que viver implica erro e causa de desconsolo na medida em que reproduz nossos equívocos, nos replica continuamente afastando-nos da origem.