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sincretismo
terça-feira 30 de abril de 2024
O «sincretismo», entendido em seu verdadeiro sentido, não é nada mais que uma simples justaposição de elementos de proveniências diversas, juntados «desde fora», por assim dizer, sem que nenhum princípio de ordem mais profunda venha a lhes unificar. É evidente que tal «ensambladura» não pode constituir realmente uma doutrina, como tampouco um montão de pedras constitui um edifício; e, se der às vezes a ilusão disso a quem não considera mais que levianamente, esta ilusão não poderia resistir a um exame que fora um pouco sério. Não há necessidade de ir muito longe para encontrar autênticos exemplos deste sincretismo: as modernas contrafações da tradição, como o ocultismo e o teosofismo, não são outra coisa no fundo: noções fragmentárias tomadas a diferentes formas tradicionais, e geralmente mal compreendidas e mais ou menos deformadas, encontram-se mescladas aí a concepções pertencentes à filosofia e à ciência profana. Há também teorias filosóficas formadas quase inteiramente de fragmentos de outras teorias, e aqui o sincretismo toma habitualmente o nome de «ecletismo»; mas este caso é em suma menos grave que o precedente, porque não se trata mais que de filosofia, quer dizer, de um pensamento profano que, ao menos, não procura fazer-se passar por outra coisa que o que é.
O sincretismo, em todos os casos, é sempre um procedimento essencialmente profano, por sua própria «exterioridade»; e não só não é uma síntese, mas sim, num certo sentido, é justamente o contrário. Efetivamente, a síntese, por definição, parte dos princípios, quer dizer, pelo que há mais interior; poder-se-ia dizer que vai do centro à circunferência, enquanto que o sincretismo fica na própria circunferência, na pura multiplicidade, de certo modo «atômica», e de detalhe indefinido de elementos tomados um a um, considerados em si mesmos e por si mesmos, e separados de seu princípio, quer dizer, de sua verdadeira razão de ser. Assim, o sincretismo tem um caráter completamente analítico, queira-o ou não; é certo que ninguém fala tão frequentemente nem tão prazerosamente de síntese como alguns «sincretistas», mas isso não prova mais que uma coisa: que sentem que, se reconhecessem a natureza real de suas teorias compostas, confessariam por isso mesmo que não são os depositários de nenhuma tradição, e que o trabalho ao qual se livraram não difere em nada do que poderia fazer o primeiro «buscador» recém-chegado que juntasse, mal ou bem, as noções variadas que tivesse tirado dos livros. [René Guénon]
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