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civilização moderna

terça-feira 30 de abril de 2024

  

A civilização moderna aparece na história como uma verdadeira anomalia: de todas que conhecemos, é a única que se desenvolveu num sentido puramente material, e também a única que não se apoia em qualquer princípio de ordem superior. Este desenvolvimento material, que vem já de vários séculos, e que se vai acelerando cada vez mais, tem sido acompanhado de uma regressão intelectual totalmente incapaz de ser compensada. Trata-se, aqui, bem entendido, da verdadeira e pura intelectualidade, que se poderia também denominar espiritualidade, qualificação esta que nos recusamos atribuir àquilo que os modernos têm-se aplicado de um modo particular: o cultivo das ciências experimentais, em vista das aplicações práticas que delas podem decorrer. Um único exemplo permitiria medir a extensão dessa regressão: a Suma Teológica de Santo Tomás de Aquino era, em seu tempo, um manual para uso dos estudantes; onde estão hoje os estudantes capazes de aprofundá-lo e assimilá-lo?

O declínio não ocorreu de modo súbito: poderíamos seguir suas etapas através da filosofia moderna. Foi a perda ou o esquecimento da verdadeira intelectualidade que tornou possível dois erros que se opõem apenas na aparência, mas que são, na realidade, correlativos e complementares: o racionalismo e o sentimentalismo. Desde que se passou a negar ou a ignorar todo conhecimento puramente intelectual, como se fez a partir de Descartes  , devia-se chegar, de um lado, ao positivismo  , ao agnosticismo e a todas as aberrações do "cientismo", e, de outro lado, a todas as teorias contemporâneas que, não se contentando com o que a razão pode dar, buscam outra coisa, mas pela veia do sentimento e do instinto, isto é, abaixo da razão e não acima, e chegam, como William James  , por exemplo, a ver na subconsciência o meio pelo qual o homem pode entrar em comunicação com o Divino. A noção da verdade, após ter sido rebaixada a nada mais que uma simples representação da realidade sensível, é por fim identificada, pelo pragmatismo, à utilidade, o que significa suprimi-la pura e simplesmente. Com efeito, que interesse poderia ter a verdade num mundo em que as aspirações são apenas materiais e sentimentais? [Guénon]


Ver online : René Guénon