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Kingsley (Reality:27-28) – thymos (ardor)

quarta-feira 5 de outubro de 2022, por Cardoso de Castro

  

E a pista de todo o poema [de Parmênides] já está no primeiro verso (As éguas que me levam até onde o ardor pode chegar cavalgaram...).

O único fator crucial nesse estranho caso que para Parmênides influencia tudo – que determina até onde ele pode ir nessa jornada – é o ardor.

A palavra grega que ele usa é thymos, e thymos significa a energia da própria vida. É a presença crua em nós que tem sensação e tem sentimento; o poder maciço de nosso ser emocional. Acima de tudo, é a energia da paixão, do apetite, do anseio, do ardor.

Desde o tempo de Parmênides aprendemos muito bem a cercá-lo, dominá-lo, puni-lo e controlá-lo. Mas com ele é o que vem primeiro, logo no começo. E há um sentido profundo nisso, porque o que ele está dizendo é que — deixado a si mesmo — o ardor nos torna possível ir até onde realmente precisamos ir.

Não há raciocínio com paixão e ardor, embora gostemos de nos enganar acreditando que há. Tudo o que fazemos é raciocinar conosco mesmos sobre a forma que nosso ardor tomará. Raciocinamos que, se encontrarmos um emprego melhor, ficaremos contentes, mas nunca estamos. Raciocinamos que se formos a algum lugar especial seremos felizes; mas quando chegamos lá começamos a querer ir para outro lugar. Raciocinamos que, se dormirmos com o amante dos nossos sonhos, estaríamos realizados. E, no entanto, mesmo que conseguíssemos isso, ainda não seria suficiente.

O que chamamos de natureza humana significa ser puxado pelo nariz em uma centena de direções diferentes e acabar indo a lugar nenhum muito rápido.

Mas, embora não haja raciocínio com nossa paixão, ela tem uma tremenda inteligência própria. O único problema é que continuamos interferindo; continuamos quebrando-a em pedaços minúsculos, espalhando-a por toda parte. Nossas mentes sempre nos enganam para que nos concentremos nas pequenas coisas que achamos que queremos – em vez de na energia de querer em si.

Se conseguirmos enfrentar nosso ardor em vez de encontrar infinitas maneiras de satisfazê-lo e tentar escapar dele, ele começa a nos mostrar um vislumbre do que está por trás dos bastidores. Abre uma perspectiva devastadora onde tudo se inverte: onde a realização se torna uma limitação, a realização se transforma em uma armadilha. E faz isso com uma intensidade que embaralha nossos pensamentos e nos força direto para o presente.


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