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Kingsley (DPW:87-92) – Apolo

quinta-feira 6 de outubro de 2022, por Cardoso de Castro

  

As tradições ligando Apolo com incubação e cavernas e lugares escuros, nada tem com o Apolo que costumamos conhecer.

Hoje em dia Apolo é considerado a encarnação da razão e da racionalidade — como se um deus pudesse jamais ser razoável no sentido que atribuímos a esta palavra. A história de como esta noção veio a ser substituída por uma percepção das coisas que ele costumava ser é absurda, da maneira que tais histórias usualmente são. Vai lá no fundo do passado histórico, e a estória ainda não terminou. Tentativas foram feitas de racionalizar Asclépio mas nunca duraram muito. A racionalização de Apolo ainda perdura.

Normalmente ele é descrito como o mais grego de todos os deuses: uma imagem perfeita do antigo espírito grego, todo resplendor e brilho.

Mas ele não é claro em absoluto. Acima de tudo era um deus de oráculos e profecias — e os oráculos que dava eram enigmas, cheios de ambiguidades e armadilhas. Era o povo que acreditava que tudo era brilhante e claro que acabou em apuros.

Frequentemente ele é associado com música e canções. E no entanto especialmente na Anatólia tinha um lado totalmente diferente. Lá as canções que eram cantadas em sua honra eram cheias de estranhas palavras, cantadas em uma linguagem encantatória que ninguém podia entender. E seus oráculos eram ditos por seu profeta em uma voz pesada em transe: oráculos cheios de repetições e enigmas, expressos em uma poesia que dificilmente parecia poesia. Pois Apolo era um deus que operava em outro nível de conscientidade com regras e uma lógica próprias.

Às vezes se diz que quando magos, séculos depois de Cristo, invocavam Apolo através de incubações no meio da noite, isto era uma prova de como seu brilho já tinha esmorecido — juntamente com o famoso brilho do mundo clássico.

Mas o fato é que ele era sempre associado com escuridão e noite. Em Roma, onde colonos gregos introduziram a adoração de Apolo o curandeiro, o melhor tempo para incubação em seu templo era no meio da noite. E de volta para Anatólia haviam antigas tradições em seu templo que implicavam em aprisionar a sacerdotisa de Apolo com seu deus à noite. Quando ela saía na manhã seguinte era capaz de profetizar por causa de sua união mística com Apolo durante a noite.

E desde o início, Apolo era conectado não somente com a noite mas com as cavernas e lugares escuros, com o submundo e a morte. Eis porque, a cidade de Hierapolis, na Anatólia, o templo de Apolo era sobre uma caverna que levava ao submundo. E eis porque em outros centros de oráculos na Anatólia seus templos eram construídos da mesma maneira — sobre cavernas dando acesso ao submundo que eram adentradas por sua sacerdotisa e pelos iniciados alta noite.

Quando começaram a fazer de Apolo razoável, filosoficamente aceitável, estavam simplesmente olhando a superfície e evitando o subjacente a este deus.


Foi também na Anatólia que Apolo veio a ser associado ao Sol.

Realmente sua ligação com o Sol vai longe no passado. Mas proposições formais dos gregos identificando o Sol com Apolo só começaram a aparecer no tempo que Parmênides estava vivo. E o que é importante sobre estas proposições é a maneira que indicam que a identificação era esotérica — questão para iniciados somente, para pessoas familiares com “os nomes silenciosos dos deuses”.

Agora é tão fácil assumir que Apolo e o Sol são ambos questão de resplendor e luz. Mas, isto é esquecer onde o Sol está mais em casa: na escuridão do submundo. E é também não alcançar o que estas proposições sobre o Sol e Apolo realmente afirmam.


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