Schopenhauer (MVR2:10-13) – vive-se na ordem subjetiva

O verdadeiro idealismo, ao contrário, não é propriamente o empírico, mas o transcendental. Este deixa intocada a realidade EMPÍRICA do mundo, todavia assegura que todo OBJETO, portanto o real empírico em geral, é duplamente condicionado pelo SUJEITO: primeiro MATERIALMENTE, ou como OBJETO em geral, visto que uma existência objetiva só é pensável em face de um sujeito e sua representação; segundo, FORMALMENTE, na medida em que o MODO de existência do objeto, isto é, de ser representado (espaço, tempo, causalidade), depende do sujeito, está predisposto nele. Ao idealismo simples ou de Berkeley, que diz respeito ao OBJETO EM GERAL, une-se imediatamente o KANTIANO, concernente ao MODO especificamente dado do ser-objeto. Isso demonstra que a totalidade do mundo material com seus corpos extensos no espaço e possuidores de uma relação causal entre si por conta do tempo, e tudo o mais que daí depende, não constitui uma existência INDEPENDENTE de nossa cabeça, mas tem seus pressupostos básicos em nossas funções cerebrais, apenas POR MEIO das quais e NAS quais uma TAL ordem objetiva das coisas é possível; porque tempo, espaço e causalidade, sobre os quais repousam todos aqueles processos reais e objetivos, também nada mais são eles mesmos que funções do cérebro; com o que aquela ORDEM inalterável das coisas, que confere o critério e o fio condutor de sua realidade empírica, depende do cérebro e exclusivamente por meio deste obtém a sua garantia: Kant expôs isso de modo pormenorizado e com profundidade; apenas não menciona o cérebro, mas diz: “a faculdade de conhecimento”. Ele até mesmo tentou demonstrar que aquela ordem objetiva no tempo, no espaço, na causalidade, na matéria etc. — sobre os quais baseiam-se em última instância todos os eventos do mundo real — considerada estritamente não se deixa uma vez sequer PENSAR como subsistindo por si, ou seja, como ordem das coisas em si mesmas, ou como algo absolutamente objetivo e incondicionalmente existente, na medida em que, caso se a tente pensar até o fim, cai-se em contradições. Expor isso foi a intenção das antinomias: todavia, no apêndice à minha obra, demonstrei o fracasso do intento. — Por outro lado, a doutrina kantiana, mesmo sem as antinomias, leva à intelecção de que as coisas e a maneira de sua existência estão vinculadas inseparavelmente com nossa consciência delas; em consequência, quem concebeu isto claramente logo atinge a convicção de que supor a existência das coisas enquanto tais também exteriormente à nossa consciência e independentes dela é realmente um absurdo. O fato de estarmos tão profundamente imersos no tempo, no espaço, na causalidade e em todo o processo legal da experiência que neles se baseia, e ainda que estejamos aqui (e até mesmo os animais) tão naturalmente em casa e saibamos desde o início aí nos orientarmos — não seria possível se o nosso intelecto e as coisas fossem completamente diferentes; antes, a única explanação de tudo isso é que ambos constituem um todo, o intelecto mesmo cria aquela ordem e existe somente para as coisas, e estas, por sua vez, existem apenas para ele.

Mesmo prescindindo das profundas intelecções que somente a filosofia kantiana proporciona, a inadmissibilidade da hipótese tenazmente admitida do REALISMO absoluto pode ser demonstrada imediatamente, ou ao menos fazer-se sensível, pelo simples esclarecimento de seu sentido mediante considerações como a que se segue. — Segundo o realismo, o mundo tal qual o conhecemos deve existir também independentemente desse conhecimento. Ora, façamos uma vez desaparecer do mundo todo ser cognoscente e deixemos apenas a natureza inorgânica e vegetal. Estão ali penhasco, árvore, riacho e céu azul: Sol, Lua e estrelas iluminam o mundo, como antes; porém, é óbvio que em vão, pois olho algum existe ali que os veja. Doravante façamos adicionalmente a inserção de um ser cognoscente. Então aquele mundo expõe-se em seu cérebro MAIS UMA VEZ e repete-se em seu interior exatamente como era antes fora dele. Assim, pois, ao PRIMEIRO mundo juntou-se agora um SEGUNDO, que, embora separado por completo do primeiro, assemelha-se a ele como um fio de cabelo a outro. Assim como está arranjado o mundo OBJETIVO no espaço OBJETIVO sem fim, exatamente assim está agora arranjado no espaço SUBJETIVO conhecido o mundo SUBJETIVO dessa intuição. O último, contudo, leva a vantagem em face do primeiro por ter o conhecimento de que aquele espaço ali fora é sem fim, até mesmo pode tornar preciso de antemão com minúcia a legalidade completa de todas as relações possíveis nele, embora ainda não efetivadas, sem precisar para isso de uma experiência prévia: ademais, também pode tornar preciso tanto o decorrer do tempo quanto a relação de causa e efeito que rege as mudanças exteriores. Penso que tudo isso, numa consideração mais apurada, revela o grande absurdo, e assim leva à convicção de que aquele mundo absolutamente OBJETIVO fora da cabeça, independente dela e ANTERIOR a todo conhecimento, que presumimos ter pensado no início, não era outro senão o segundo, conhecido SUBJETIVAMENTE, o mundo da representação, que é o único que realmente podemos pensar. Eis por que se impõe naturalmente a hipótese de que o mundo, tal como o conhecemos, existe apenas para o nosso conhecimento, portanto exclusivamente na REPRESENTAÇÃO, jamais exterior a ela. Em conformidade com isso, a coisa em si, isto é, aquilo que existe independentemente do nosso e de qualquer outro conhecimento, é algo completamente diferente da REPRESENTAÇÃO e de todos os seus atributos, ou seja, da objetividade em geral, O que seria a coisa em si constituirá, a seguir, o tema do nosso segundo livro. (p. 10-13)

Abellio, Raymond (29) Antiguidade (26) Aristotelismo (28) Barbuy, Heraldo (45) Berdyaev, N A (29) Bioética (65) Bréhier – Plotin (395) Coomaraswamy, Ananda (473) Enéada III, 2 (47) (22) Enéada IV, 3 (27) (33) Enéada IV, 4 (28) (47) Enéada VI, 1 (42) (32) Enéada VI, 2 (43) (24) Enéada VI, 3 (44) (29) Enéada VI, 7 (38) (43) Enéada VI, 8 (39) (25) Espinosa, Baruch (37) Evola, Julius (108) Faivre, Antoine (24) Fernandes, Sergio L de C (77) Ferreira da Silva, Vicente (21) Ferreira dos Santos, Mario (46) Festugière, André-Jean (41) Gordon, Pierre (23) Guthrie – Plotinus (349) Guénon, René (699) Jaspers, Karl (27) Jowett – Plato (501) Kierkegaard, Søren Aabye (29) Lavelle, Louis (24) MacKenna – Plotinus (423) Mito – Mistérios – Logos (137) Modernidade (140) Mundo como Vontade e como Representação I (49) Mundo como Vontade e como Representação II (21) Míguez – Plotino (63) Nietzsche, Friedrich (21) Noções Filosóficas (22) Ortega y Gasset, José (52) Plotino (séc. III) (22) Pré-socráticos (210) Saint-Martin, Louis-Claude de (27) Schuon, Frithjof (358) Schérer, René (23) Sophia Perennis (125)