(gr. hypsos; lat. Sublime; in. Sublime; al. Erhaben; it. Sublime).
1. Forma linguística, literária ou artística que expresse sentimentos ou atitudes elevadas ou nobres. Essa palavra começou a ser usada com tal sentido no séc. I a.C., tendo sido analisada no pequeno tratado Sobre o sublime do Pseudo Logino: “O sublime é a ressonância da nobreza da alma, tanto que admiramos às vezes um pensamento singelo, sem voz, por si, pela superioridade do sentimento. O silêncio de Ajax em Nekyia é maior e mais nobre que qualquer discurso” (Desubi, IX). No mesmo significado, essa palavra foi usada pelos autores latinos, principalmente por Quintiliano (Inst. or, VIII, 3, 18; VIII, 3, 74; XI, I, 3; XI, 3, 153, etc). Este é também o significado com que essa palavra costuma ser usada; refere-se não só a expressões linguísticas ou literárias, mas também a ações ou atitudes consideradas nobres ou elevadas. Foi nesse mesmo sentido que Croce entendeu o sublime, definindo-o como “afirmação subitânea de uma força moral poderosíssima”, para expungi-lo da arte (Estética, 4a ed., 1912, p. 107).
2. Em sentido próprio e estrito, o sublime é o prazer que provém da imitação (ou da contemplação) de uma situação dolorosa. Com esse sentido, essa noção vem diretamente do conceito aristotélico de tragédia.- que deve provocar “piedade e terror”; por isso, como diz Aristóteles, o poeta trágico “deve propiciar o prazer que nasce da piedade e do terror por meio da imitação” (Poet. 14,1453 b 10). No século XVIII, essa noção de tragédia deu origem a um problema que foi examinado por Hume num dos seus Ensaios morais e políticos (1741): “Parece inexplicável o prazer que os espectador de uma tragédia bem escrita aufere da dor, do terror, da angústia e de outras paixões que, em si mesmas, são desagradáveis e penosas” (é assim que Hume inicia o ensaio intitulado Of Tragedy); sua análise serviu de fundamento para a obra de Burke, que em Inquiry on the Origin of our Ideas of Sublime and Beautiful (1756) distinguiu claramente o sublime do Belo: “O Belo e o sublime são ideias de natureza diferente: um tem fundamento na dor e o outro no prazer; embora possam depois afastar-se da verdadeira natureza de suas causas, estas continuarão sendo diferentes uma da outra, e essa diferença nunca deverá ser esquecida por quem se propuser suscitar paixões” (Inquiry on the Origin of our Ideas of Sublime and Beautiful, 1756, III, 27). O terror, a dor em geral, as situações de perigo são causas do sublime (Ibid., IV, 5). O modo como essa causa pode produzir prazer (porque o sublime é um prazer) é um problema que Burke resolve da mesma maneira que Hume; este, por sua vez, inspirara-se em Fontenelle (Réflexions sur la poétique, 36): o prazer provém do exercício, ou seja, do movimento que a dor e o terror provocam no espírito quando isentos do real perigo de destruição. Nesse caso — como diz Burke — o que nasce não é exatamente o prazer, mas “uma espécie de horror deleitável, de tranquilidade matizada de terror; este, porém, quando provém do instinto de conservação, é uma das paixões mais fortes. Isso é o sublime” (Ibid., IV, 7). Nas Observações sobre o sentimento do belo e do sublime (1764), Kant repetiu substancialmente os mesmos conceitos, robustecendo-os com vasta exemplificação, de valor bastante duvidoso, pois continha entre outras coisas a caracterização dos diferentes povos, com base em suas atitudes em relação ao sublime e ao belo (Beobachtungen über das Gefuhl des Schönen und Erhabenen, IV). Mas em Crítica do juízo, as ideias de Hume e Burke foram expressas com maior rigor conceitual, ganhando forma clássica. Segundo Kant, o sentimento do sublime tem dois componentes: 1) apreensão de uma dimensão desproporcional às faculdades sensíveis do homem (sublime matemático), ou de um poder terrificante para essas mesmas faculdades (sublime dinâmico); 2° o sentimento de conseguir reconhecer essa desproporção ou ameaça, e, por isso, de ser superior a ambas. Kant diz: “A qualidade do sentimento do sublime é ser ele, em relação a algum objeto, um sentimento de padecimento, representado ao mesmo tempo como final; isso é possível porque nossa impotência revela a consciência de um poder ilimitado do mesmo sujeito, e o sentimento só pode julgar esteticamente este último através da primeira” (Crít. do juízo, § 27). Por isso, Kant define o sublime como “o que agrada imediatamente pela sua oposição ao interesse dos sentidos” (Ibid., § 29, Obs. geral); com isso entende que, ao advertir a desproporção ou o perigo que o sublime representa para a sua natureza sensível, o homem se dá conta de que, justamente por adverti-la, não é escravo dessa natureza, mas livre perante ela. Friedrich Schiller só fez expor e esclarecer as ideias de Kant ao afirmar que “se chama de sublime o objeto para cuja representação nossa natureza física sente seus próprios limites, ao mesmo tempo em que nossa natureza racional percebe sua própria superioridade, seu caráter ilimitado: um objeto diante do qual somos fisicamente fracos mas moralmente superiores, graças às ideias” (Vom Erhabenen, 1793). Schiller distinguiu o sublime teórico, que está em conflito com as condições do conhecimento sensível, do 5. prático, que está em conflito com o instinto de conservação; no sublime prático distinguiu o sublime prático contemplativo e o sublime prático patético (cf. Pareyson, A estética do idealismo alemão, I, pp. 175 ss.). Hegel, por sua vez, expressou na oposição infinito-finito o conflito típico do Sublime: O sublime é a tentativa de exprimir o Infinito, sem encontrar, no reino das aparências, um objeto que se preste a essa representação” (Vorlesungen uber die Ästhetik, ed. Glockner, I, p. 483). Por isso, “as formas por meio das quais aquilo que se manifesta é também abolido, de tal sorte que a manifestação dos conteúdos é também a superação das expressões, é a sublimidade: portanto, esta não consiste” — como diz Kant — “na subjetividade pura do sentimento e em seu poder de estar acima das ideias da razão, mas, ao contrário, baseia-se no significado representativo, em virtude do qual se refere a uma Substância Absoluta” (Ibid., p. 484). Portanto, Hegel viu no sublime uma forma especial de arte, mais precisamente a arte simbólica. Nele, a dor e a situação de perigo que, para a estética do séc. XVIII, representam a causa do sublime, foram substituídas pela inefabilidade e pela majestade da Substância Infinita. Schopenhauer, contudo, limitou-se a reafirmar a teoria tradicional e considerou que o sublime existe quando “os objetos, cujas formas significativas nos convidam à contemplação pura, têm uma atitude hostil para com a vontade humana em geral (cuja objetividade se evidencia no corpo humano) e se opõem a ela ou a ameaçam com sua força superior” (Die Welt, § 39). O último pensador a expor o conceito de sublime nesses termos foi Santayana: “A sugestão do terror faz que nos refugiemos em nós mesmos; aí, como numa ação de ricochete, intervém a consciência da segurança ou da indiferença, e nós sentimos a emoção de distanciamento e libertação, em que consiste, realmente, o sublime” (The Sense of Beauty, 1896, p. 60). [Abbagnano]