Antoine Faivre — Oetinger
Segundo Antoine Faivre, Oetinger seria o maior teósofo alemão do século XVIII. Para Oetingenr a essência da religião pessoal é a cognitio centralis quue ajuda o cristão a ver além das inevitáveis polaridades da existência, a encontrar assim a paz e a alegria no reconhecimento da intenção divina de uma harmonia última. Em seu “Dicionário etimológico e emblemático”, Oetinger reservou uma entrada para a palavra Wissen (muito utilizada por Heidegger), e outra entrada para a palavra Glaube. “Saber”, diz ele, é “ver (compreender, penetrar) uma coisa segundo todas as suas partes”. Assim dirá Novalis, a superstição consiste em tomar uma parte pelo Todo. Na entrada de Glaube, Oetinger explica que a Fé consiste notadamente, “não em suprimir a ordem silogística dos pensamentos mas em vivificá-la”. Novalis chega a usar a palavra chave: Illudieren. A Fé é Illudieren, o que significa que se pões hipoteticamente e imaginariamente uma ideia esperando assim uma verificação eventual. Todo saber verdadeiro supõe esta antecipação (a priori) do saber verdadeiro: a Fé (a crença) é o saber à distância, mas o saber é o saber (o conhecimento) do presente. O sucesso do saber repousa sobre o poder da Fé que arme e que reforça nossa energia. Novalis vai aqui além do ensinamento da Epístola dos Hebreus, pois para ele não se trata mais tanto de esperança quanto de certeza. Ele escreve: “A Fé é a ação da vontade sobre a inteligência”; e esta frase surpreendente para quem faz uma ideia superficial do Romantismo alemão: “Estou persuadido que pela fria inteligência técnica e por um tranquilo sentido moral alcança-se melhor às verdadeiras revelações, do que pela imaginação (= a fantasia) que parece nos conduzir somente ao reino dos fantasmas, estes antípodas do verdadeiro céu.” Com efeito, todo resta simples crença e ilusão, erro e falsidade, enquanto se é incapaz de religar à totalidade última — ao absoluto — o que se dispõe. Eis porque todo conhecimento (Erkennen) aparece como uma ampliação (Erweiterung), uma Hinausschiebung, do domínio da Fé e volta a dizer que se dispõe de novos intermediários (Setzen neuer Vermittelung); estes resultados intermediários (Mittelresultate des Prozesses) constituem o essencial do processo cognitivo, que é portanto uma Fé continuada (fortgesetzter Glaube). Se este processo infinito e sempre aproximativo vem a cessar, o conhecimento ele mesmo cessaria de existir. (excertos de Accès de l’ésotérisme occidental I)
Antoine Faivre defende que entre Jacob Boehme e Franz von Baader, o teósofo Oetinger foi sem dúvida o maior na Alemanha de sua época, garantindo a transmissão do ensinamento de Boehme. Em uma entrada de seu dicionário, para o termo “Bildniss”, Oetinger nos ensina como a alma, intermediária entre a carne e o espírito, é ela mesma então sem imagem embora “porte” esta imagem. O espírito, que tem a imagem nele, forma na alma aquela imagem da verdade por intermédio do Verbo. Este Naturphilosoph acha importante que a seiva, ou o “óleo de crescimento” de uma planta, guarde a imagem da flor antes de sua eclosão. Ele aproxima esta propriedade dos seres vivos das experiências palingênicas às quais não é o primeiro a se interessar: a imagem visível de uma flor calcinada existe ainda em alguma parte, pronta a se atualizar em uma figura. Da mesma maneira, o sopro humano, “luminária de Jeová”, contém uma imagem (“Bild”), aí incluso a dos ímpios. Como Oetinger adiciona que o diabo e seus coortes disto são privados, veremos ainda neste Bild um sinônimo de “corpo” no sentido onde Boehme o entendia. Certos homens conseguem tornar mais ou menos manifesto entre eles esta imagem graças a um vivo desejo (“durch heftige Begierde”).