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paideia

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Filosofia Antiga
PAIDEIA

Werner Jaeger  : PAIDEIA

Paideia, a palavra que serve de título a esta obra, não é apenas um nome simbólico; é a única designação exata do tema histórico nela estudado. Este tema é, de fato, difícil de definir: como outros conceitos de grande amplitude (por exemplo os de filosofia ou cultura), resiste a deixar-se encerrar numa fórmula abstrata. O seu conteúdo e significado só se revelam plenamente quando lemos a sua história e lhes seguimos o esforço para conseguirem plasmar-se na realidade.

Ao empregar um termo grego para exprimir uma coisa grega, quero dar a entender que essa coisa se contempla, não com os olhos do homem moderno, mas sim com os do homem grego.

Não se pode evitar o emprego de expressões modernas como civilização, cultura, tradição, literatura ou educação; nenhuma delas, porém, coincide realmente com o que os Gregos entendiam por paideia. Cada um daqueles termos se limita a exprimir um aspecto daquele conceito global, e, para abranger o campo total do conceito grego, teríamos de empregá-los todos de uma só vez.

E no entanto a verdadeira essência da aplicação ao estudo e das atividades do estudioso baseia-se na unidade originária de todos aqueles aspectos — unidade vincada na palavra grega — e não na diversidade sublinhada e consumada pelas locuções modernas.

Os antigos estavam convencidos de que a educação e a cultura não constituem uma arte formal ou uma teoria abstrata, distintas da estrutura histórica objetiva da vida espiritual de uma nação; para eles, tais valores concretizavam-se na literatura, que é a expressão real de toda cultura superior. E é deste modo que devemos interpretar a definição do homem culto apresentada por Frínico (Cf. philologos, p. 483 Rutherford):

Philologos ho philon   logous kai spoudaxon peri paideian.

Danielle Montet  : LES TRAITS DE L’ÊTRE

Educar, como governar, significa melhorar: o indivíduo pela paideia, a cidade pela techne politike. Muitas notas se impõem para situar o conceito de paideia: é um termo de dupla entrada, ativo e passivo, assim como khreia. «Paideia» significa tanto a educação que se dá quanto aquela que se recebe, assim como khreia enuncia ao mesmo tempo o uso que se faz de uma coisa e aquele ao qual ela se presta, e cada um dos dois termos se encontra dublada de sinônimos que permitem precisar a flexão considerada: khresis e khrema para khreia, paideusis e paideuma para paideia. Todavia, a preferência platônica vai para o conceito de paideia, como aquele de khreia, pois, em um e outro caso, dá a pensar a reversibilidade, a circularidade ativo/passivo. Sócrates em disso testemunha que, único considerando se formar junto a outro, buscar escola ao qual se pôr, acaba por dispôr, para o interlocutor ele mesmo, a questão de sua própria paideia.

A tradução por «educação» ou «formação» não oferece em absoluto o campo semântico de paideia, articulado ao redor pais, a criança. A paideia se relaciona à infância por conta de uma qualquer pedagogia. Embora o latino qualifique a criança como tal a partir de seu mutismo (infans), o grego salienta no pais um inacabamento que excede à falha da língua. Aparentado à uma família semântica que significa pequenez, escassez, carência, o termo pais marca a criança de uma incompletude original que supera seu mutismo. A criança é pensada a partir de um limite, de uma lacuna, que a paideia virá justamente redimir. Porque o homem nasce pais, ele sofre de uma incompletude original, patente na infância sem no entanto, talvez se limitar nisso, enquanto que os «Filhos da Terra», segundo o mito do Político, nasciam adultos.