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Perenialistas Dualismo

sexta-feira 29 de dezembro de 2023, por Cardoso de Castro

  

PERENIALISTAS — DUALIDADE

René Guénon: Excertos da tradução em português de Daniel Camarinha de "A GRANDE TRÍADE"

Isto posto, o que é preciso compreender bem, antes de ir adiante, é que só poderia haver "dualismo", numa doutrina qualquer, se dois termos opostos ou complementares (e, nesse caso, eles seriam antes concebidos como opostos) nelas estivessem postos, antes de tudo, e considerados como últimos e irredutíveis, sem nenhuma derivação de um princípio comum, o que exclui evidentemente a consideração de qualquer ternário do primeiro gênero. Só se poderia, portanto, encontrar em tal doutrina ternários do segundo gênero e, como estes, conforme já indicamos, só se poderiam referir ao domínio da manifestação, vê-se imediatamente por aí que todo "dualismo" é necessariamente, ao mesmo tempo, um "naturalismo". Mas o fato de reconhecer a existência de uma dualidade e de situá-la no lugar que lhe convém realmente não constitui, de modo algum, um "dualismo", a partir do momento em que os dois termos dessa dualidade procedem de um princípio único, pertencente como tal a uma ordem superior de realidade; e é assim, antes de tudo, no que concerne à primeira de todas as dualidades, a da Essência e da Substância universal, oriundas de uma polarização do Ser ou da Unidade Principial, e entre as quais se produz toda manifestação. São os dois termos dessa primeira dualidade que, na tradição hindu, são designados como Purusha e Prakriti e como o Céu e a Terra na tradição extremo-oriental; mas nem uma nem outra, como, de resto, nenhuma tradição ortodoxa, perde de vista, ao considerá-los, o princípio superior de que derivam. Expusemos amplamente, noutras ocasiões, o que é isso em relação à tradição hindu; quanto à tradição extremo-oriental, ela considera não menos explicitamente, como princípio comum do Céu e da Terra [1], o que ela chama "Grande Extremo" (Tai-ki), no qual eles estão indissoluvelmente unidos, no estado "indiviso" e "indistinto" [2], anteriormente a toda diferenciação [3], e que é o Ser puro, identificado como tal à "Grande Unidade" (Tai-i) [4]. Além disso, Tai-ki, o Ser ou a Unidade transcendente pressupõe também outro princípio, Wouji, o Não-Ser ou o Zero metafísico [5]; mas este não pode entrar, com seja o que for, numa relação tal que ele seja o primeiro termo de um ternário qualquer, sendo toda relação dessa espécie possível apenas a partir da afirmação do Ser ou da Unidade [6]. Assim, em conclusão, tem-se primeiro um ternário da primeira ordem, formado de Tai-ki, Tien e Ti, e, em seguida, apenas um ternário do segundo gênero, formado de Tien, Ti e Jen, que é aquele que nos habituamos a designar como a "Grande Tríade"; nessas condições, é perfeitamente compreensível que alguns tenham podido pretender atribuir um caráter "dualista" à tradição extremo-oriental.


Pierre Gordon  : A REVELAÇÃO PRIMITIVA

Passa-se na evolução de toda sociedade humana como em cada um de nós, uma dualidade fundamental, que nos faz oscilar sem impedimento do plano inacessível da existência ao plano instável do nada. Impossível de alcançar um; impossível de nos manter no outro. Toda a história, como toda a filosofia, como toda a literatura, como toda a filosofia, como todas as artes, como toda existência humana, se enquadra e se desenvolve assim entre estas duas ideias, ou melhor entre estes dois eventos, que são os dois grandes marcos da filosofia primordial; o recuo mental do primeiro homem, que, em nos destrançando do ser, fez de nós monstros; o restabelecimento da visão de origem, que nos dará de novo nossa figura normal. Todo pensamento humano, sob uma forma ou sobe uma outra, é posto em face do problema: ou consentir no desnivelamento, ou querer a superação. E assim sempre foi, para cada um dos milhões de homens que respiraram sob o sol. Como o ensina, com efeito, nossa tradição céltica, existe atualmente para o homem três necessidades: sofrer, se renovar, escolher. E é o rigor desta lei que apesar de nosso presente estado teratológico, funda nossa incomparável dignidade.


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[1É também, é claro, termos de todas as outras dualidades mais particulares, que são, em suma, apenas especificações daquelas, de modo que, direta ou indiretamente são todas derivadas, em última análise, do mesmo princípio.

[2Essa indistinção principal não se deve confundir com a indistinção potencial, que é só a da substância ou materia prima.

[3É preciso entender bem que não se trata aqui, de nenhum modo, de uma anterioridade temporal, nem de uma sucessão num modo qualquer da duração.

[4O caráter ji é o que designa literalmente a "cumeeira" de um edifício; por isso, Tai-ki diz-se simbolicamente residir na Estrela Polar, que é efetivamente a "cumeeira" do Céu visível e, como tal, representa naturalmente a do Cosmo todo.

[5Wou-ki corresponde, na tradição hindu, ao Brahma neutro e supremo (Para-Brahma), e Tai-ki à Ishwara ou ao Brahma "não-supremo" (Apara-Brahma).

[6Acima de qualquer outro princípio, há ainda o Tao, que, em seu sentido mais universal, é a um só tempo Não-ser e Ser, mas que, por outro lado, não é realmente distinto do Não-Ser enquanto este contém o Ser, que é também o principio primeiro de toda manifestação e se polariza em Essência e Substância (ou Céu e Terra) para produzir efetivamente essa manifestação.