Bochenski1962
Uma teoria verdadeira da natureza deve admitir os seguintes fatos da experiência: a mudança, a persistência (endurance), a interpenetração (interfusion), o valor, o organismo e os objetos eternos (eternal objects). Algo se modifica e algo persiste, como numa montanha. As coisas não são isoladas na natureza, mas interpenetram-se; e no mundo há também valores e organismos. Finalmente, existem objetos que não persistem, mas são eternos, por exemplo, uma cor determinada. Por exemplo, se uma montanha desaparece, ela não voltará a aparecer, e se reaparecesse, já não seria a mesma montanha. Ao invés, a cor verde é sempre a mesma cor. Acima destas categorias e abarcando-as a todas situa-se o conceito fundamental de Whitehead: o acontecimento (event). O mundo não se compõe de coisas, mas de acontecimentos, ou seja, daquilo que ocorre (happens). Um corte temporal do acontecimento, “uma gota da experiência”, um ato individual da vivência imediata (self-enjoyment), é uma ocasião (occasion). Todo acontecimento é uma captação (prehension) e um organismo. É uma captação, porque apreende em si o universo inteiro, como se o conhecesse às cegas. Seu próprio passado está contido nele, o porvir anuncia-se e o mundo presente dos outros acontecimentos está representado pela ação daqueles sobre ele. O acontecimento é pois a unidade sintética do universo captado ou apreendido como uno. Por outro lado, o acontecimento é um organismo, cujas partes não estão simplesmente justapostas, mas formam um todo, no qual cada parte integrante atua sobre o todo e o todo determina as partes. Assim, por exemplo, um eléctron, se penetra num átomo, e um átomo, se entra a fazer parte de um tecido vivo, sofrem profundas transformações. Todo acontecimento é – como a mônada de Leibniz – um espelho do universo.
Este ponto de vista permite ordenar, o melhor possível, os resultados da física moderna, da biologia e das ciências do espírito, e mostrar da maneira mais clara o erro do materialismo e seu caráter extremamente abstrato. Assim, por exemplo, no materialismo o espaço é uma abstração de certas relações de interpenetração recíproca dos acontecimentos, e o tempo uma abstração de cada duração dos acontecimentos sucessivos. Neste particular, Whitehead compartilha as ideias de Bergson, mas rejeita expressamente sua atitude anti-intelectualista.
Do ponto de vista do mecanismo orgânico, o mundo aparece como agigantada comunidade, em que tudo é influenciado por tudo e na qual não existe uma só relação puramente externa.