Teogonia

Assim Urano corresponde ao primeiro princípio, o Uno, e Cronos, o filho de uma beleza suprema «engendrado» por Urano, ao Intelecto, segunda hipóstase. O nome mesmo de Cronos, a princípio, significa que é «saciedade» (koros) e «intelecto» (noûs) (v. Eneada-V, 1, 4), como diz Platão no Cratilo 396b. Mutilando seu pai para fixar seu próprio limite superior, pois «engendrando» por sua vez filhos cada um mais belo que o outro, que correspondem às ideias, Cronos assomado desta progenitura a ponto de comê-la para guardá-la junto a ele, a fim de impedir de crescer junto de Rhea e de avançar para a matéria. Eis no entanto que Zeus, o «último nascido» dos filhos de Cronos, empreende de acorrentar seu pai, e isto de maneira a que o intelecto subsista sempre idêntico. Zeus ele mesmo, que corresponde à alma, escapa então para manifestar fora o esplendor de seu ancestral, de seu pai e de seus irmãos levando a eles o cortejo universal dos deuses, dos demônios e das almas em sua contemplação eterna destes últimos (v. Eneada-V, 8, 10; Eneada-V-17; Eneada-V, 5, 3). É claro que a sucessão destes eventos por vezes trágicos não corresponde, no espírito de Plotino, a uma verdadeira sucessão temporal. A série destas filiações divinas manifesta em um modo narrativo estruturas eternas, onde a «anterioridade» do Uno (Urano) sobre o Intelecto (Cronos) e deste sobre a alma (Zeus) não é de ordem cronológica mas taxinômica, visando a ordenar a processão eterna das hipóstases. A sequência destes engendramentos, do Uno ao Intelecto depois do Intelecto à Alma, não significa que o Uno ou outros destes seres tenha sido engendrado em tal e tal momento: é «sempre» que eles foram engendrados e que continuarão a ser engendrados (Eneada II, 9, 3). Como diz ainda Plotino, «o nascimento (genesis) no tempo, enquanto produzimos o discurso (ton legon) a respeito dos seres que são sempre (aei), não deve ser para nós um obstáculo: no discurso, nós lhes atribuímos um nascimento (genesis) a fim de lhes dar uma causa e um ranque» (Eneada-V, 1, 6).

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