Jair Barboza
Após as considerações sobre a razão enquanto faculdade especial e exclusiva do homem, e sobre aqueles fenômenos e realizações próprios da natureza humana, falta ainda falar da razão na medida em que conduz a ação das pessoas, portanto, podendo nesse aspecto ser denominada PRÁTICA. Porém, o que aqui será mencionado encontra em grande parte o seu lugar em outro contexto, a saber, no apêndice deste livro, em que se contesta a existência da chamada razão prática de Kant, que ele (certamente por comodidade) expõe como fonte imediata de todas as virtudes e sede de um DEVE absoluto (ou seja, caído do céu). A refutação minuciosa, desde os fundamentos, desse princípio kantiano da moral foi por mim ulteriormente realizada nos Dois problemas fundamentais da ética. — Em função disso, tenho aqui muito pouco a falar sobre a real influência da razão, no sentido autêntico deste conceito, sobre o agir. Já no início de nossa consideração acerca dessa faculdade observamos, em termos gerais, como a ação e o comportamento do homem se diferenciam bastante da ação e do comportamento animal, e como semelhante diferença deve ser vista tão-somente como consequência da presença de conceitos abstratos na consciência. A influência destes sobre a nossa existência inteira é tão determinante e significativa que, em certo sentido, pode-se dizer que estamos para os animais, assim como os animais que veem estão para os destituídos de olhos (certas larvas, vermes, zoófitos). Estes, pelo tato, conhecem apenas o que lhes está imediatamente presente no espaço e lhes chega pelo contato; os animais que veem, ao contrário, conhecem um amplo círculo do que está próximo e distante. Da mesma forma, a ausência de razão limita os animais às representações intuitivas que lhes são imediatamente presentes no tempo, ou seja, objetos reais. O homem, ao contrário, em virtude do conhecimento in abstracto, abrange, ao lado do presente efetivo e próximo, ainda o passado inteiro e o futuro, junto com o vasto reino das possibilidades. Divisamos livremente a vida em todos os lados, a vida distante, além do presente e da realidade efetiva. Nesse sentido, portanto, o que no espaço é o olho para o conhecimento sensível, corresponde, em certa medida, ao que no tempo é a razão para o conhecimento interior. E assim como a visibilidade dos objetos só tem valor e significação desde que indique a sua palpabilidade, assim também todo o valor do conhecimento abstrato reside sempre na sua referência ao conhecimento intuitivo. Eis por que o homem natural sempre atribui mais valor àquilo que foi conhecido imediata e intuitivamente do que aos conceitos abstratos, meramente pensados. Ele prefere o conhecimento empírico ao lógico. O contrário pensam as pessoas que vivem mais nas palavras que nos atos, que enxergaram mais no papel e nos livros que no mundo efetivo, e que, ao degenerarem, tornam-se pedantes e apegados à letra. Daí se torna concebível como Leibniz e Wolf, junto aos seus seguidores, puderam errar tanto a ponto de afirmarem, em conexão com Duns Skotus, que o conhecimento intuitivo não passa de um conhecimento abstrato confuso! Em fionra de Espinosa seja dito que seu senso de correção, ao contrário, explicava todo conceito ordinário como tendo se originado da confusão do que foi conhecido intuitivamente (Eth. II, prop. 40, Schol. I). — Daquele pensamento invertido também resultou, na matemática, o desprezo por sua evidência propriamente dita, para fazer valer apenas a evidência lógica. Do mesmo pensamento invertido ainda resultou que, em geral, todo conhecimento não abstrato seja concebido sob o amplo conceito de sentimento, merecedor de pouca consideração, e que, por fim, a ética kantiana afirme que a pura e boa vontade despertada imediatamente pelo conhecimento das circunstâncias e que conduz à ação justa e benevolente, é mero sentimento, o que o faz tomá-la como destituída de valor e mérito: ao contrário, só as ações derivadas de máximas abstratas são por ele reconhecidas como dotadas de valor moral.
A visão panorâmica e multifacetada da vida em seu todo, que o homem tem pela razão e constitui vantagem em face dos animais, é também comparável a um diminuto, descolorido e abstrato esquema geométrico que indica seu caminho de vida; com isso, ele está para os animais como o navegante, que, com suas cartas marítimas, compasso e quadrante, conhece com precisão a sua rota a cada posição no mar, está para a tripulação leiga que vê somente ondas e céu. Por isso é digno de consideração, sim, espantoso como o homem, ao lado de sua vida in concreto, sempre leva uma segunda in abstracto. Na primeira está sujeito a todas as tempestades da realidade efetiva e à influência do presente, tendo de se esforçar, sofrer, morrer como o animal. Sua vida in abstracto, entretanto, como se dá à sua percepção racional, é o calmo reflexo da vida in concreto do mundo em que vive, sendo justamente o seu mencionado diminuto esquema. Aqui, no domínio da calma ponderação, aquilo que antes o assaltava por inteiro, movimentando-o vigorosamente, aparece-lhe como algo frio, descolorido e alheio ao momento: ele se torna um mero observador e espectador. Esse recolher-se na reflexão faz o homem parecer um ator que, depois de seu desempenho e até que entre novamente em cena, ocupa um lugar na plateia entre os espectadores, de onde, sereno, assiste à sucessão dos acontecimentos, mesmo que seja a preparação de sua morte (na peça); depois, porém, volta ao palco e age e sofre como estava escrito. A partir dessa dupla vida provém aquela serenidade do homem, tão diferente da ausência de pensamento do animal e com a qual alguém, depois de ponderação prévia, decisão calculada ou conhecida necessidade, suporta ou pratica com sangue frio aquilo que para si é da maior, amiúde da mais terrível, significação:· o suicídio, a execução, o duelo, os empreendimentos arriscados de todo tipo e em geral as coisas contra as quais se insurge toda a sua natureza animal. Por aí se vê em que medida a razão domina a natureza animal e exclama ao forte: σιδηρειον νυ τοί ητορ! (ferreum certe tibi cor!) (II. 24, 521).[[“Decerto tens um coração de ferro!” (N. T.)]] Aqui de fato é possível dizer que a razão se exterioriza de maneira PRÁTICA. Portanto, em qualquer lugar onde a conduta é conduzida pela faculdade racional, os motivos são conceitos abstratos, e o determinante não são representações intuitivas, particulares, nem a impressão do momento que conduz o animal: aí se mostra a RAZÃO PRÁTICA. Que, todavia, tudo isso seja por inteiro diferente e independente do valor moral da ação, que a ação racional e a virtuosa são duas coisas Completamente distintas, que a razão se encontra unida tanto à grande maldade quanto à grande bondade, que o seu auxílio confere grande eficácia seja a esta primeira ou à segunda, que ela está igualmente preparada e disponível para executar metodicamente e de maneira consequente tanto os propósitos nobres quanto os vis, tanto a máxima inteligente quanto a imprudente, em consequência de sua natureza feminina, receptiva, retentiva, que não produz por si mesma — tudo isso foi tratado de maneira pormenorizada e ilustrado por exemplos no apêndice desta obra. O dito nele encontraria aqui o seu lugar apropriado, porém, em virtude da polêmica contra a pretensa razão prática de Kant, teve de lá ser abordado, pelo que remeto o leitor a esse apêndice.
Original
Nach dieser ganzen Betrachtung der Vernunft, als einer dem Menschen allein eigenen, besonderen Erkenntnißkraft, und der durch sie herbeigeführten, der menschlichen Natur eigenthümlichen Leistungen und Phänomene, bliebe mir jetzt noch übrig von der Vernunft zu reden, sofern sie die Handlungen der Menschen leitet, also in dieser Rücksicht praktisch genannt werden kann. Allein das hier zu Erwähnende hat größtentheils seine Stelle an einem andern Orte gefunden, nämlich im Anhang zu dieser Schrift, wo das Daseyn der von Kant so genannten praktischen Vernunft zu bestreiten war, welche er (freilich sehr bequem) als unmittelbare Quelle aller Tugend und als den Sitz eines absoluten (d.h. vom Himmel gefallenen) Soll darstellt. Die ausführliche und gründliche Widerlegung dieses Kantischen Princips der Moral habe ich später geliefert, in den »Grundproblemen der Ethik«. – Ich habe deshalb hier nur noch Weniges über den wirklichen Einfluß der Vernunft, im wahren Sinne dieses Worts, auf das Handeln zu sagen. Schon am Eingang unserer Betrachtung der Vernunft haben wir im Allgemeinen bemerkt, wie sehr das Thun und der Wandel des Menschen von dem des Thieres sich unterscheidet, und daß dieser Unterschied doch allein als Folge der Anwesenheit abstrakter Begriffe im Bewußtseyn anzusehn ist. Der Einfluß dieser auf unser ganzes Daseyn ist so durchgreifend und bedeutend, daß er uns zu den Thieren gewissermaaßen in das Verhältniß setzt, welches die sehenden Thiere zu den augenlosen (gewisse Larven, Würmer und Zoophyten) haben: letztere erkennen durch das Getast allein das ihnen im Raum unmittelbar Gegenwärtige, sie Berührende; die Sehenden dagegen einen weiten Kreis von Nahem und Fernem. Eben so nun beschränkt die Abwesenheit der Vernunft die Thiere auf die ihnen in der Zeit unmittelbar gegenwärtigen anschaulichen Vorstellungen, d.i. realen Objekte: wir hingegen, vermöge der Erkenntniß in abstracto, umfassen, neben der engen wirklichen Gegenwart, noch die ganze Vergangenheit und Zukunft, nebst dem weiten Reiche der Möglichkeit: wir übersehn das Leben frei nach allen Seiten, weit hinaus über die Gegenwart und Wirklichkeit. Was also im Raum und für die sinnliche Erkenntniß das Auge ist, das ist gewissermaaßen in der Zeit und für die innere Erkenntniß die Vernunft. Wie aber die Sichtbarkeit der Gegenstände ihren Werth und Bedeutung doch nur dadurch hat, daß sie die Fühlbarkeit derselben verkündigt, so liegt der ganze Werth der abstrakten Erkenntniß immer in ihrer Beziehung auf die anschauliche. Daher auch legt der natürliche Mensch immer viel mehr Werth auf das unmittelbar und anschaulich Erkannte, als auf die abstrakten Begriffe, das bloß Gedachte: er zieht die empirische Erkenntniß der logischen vor. Umgekehrt aber sind diejenigen gesinnt, welche mehr in Worten, als Thaten leben, mehr in Papier und Bücher, als in die wirkliche Welt gesehn haben, und die in ihrer größten Ausartung zu Pedanten und Buchstabenmenschen werden. Daraus allein ist es begreiflich, wie Leibnitz nebst Wolf und allen ihren Nachfolgern, so weit sich verirren konnten, nach dem Vorgange des Duns Skotus, die anschauliche Erkenntniß für eine nur verworrene abstrakte zu erklären! Zur Ehre Spinoza’s muß ich erwähnen, daß sein richtigerer Sinn umgekehrt alle Gemeinbegriffe für entstanden aus der Verwirrung des anschaulich Erkannten erklärt hat. (Eth. II, prop. 40, Schol. 1.) – Aus jener verkehrten Gesinnung ist es auch entsprungen, daß man in der Mathematik die ihr eigenthümliche Evidenz verwarf, um allein die logische gelten zu lassen; daß man überhaupt jede nicht abstrakte Erkenntniß unter dem weiten Namen Gefühl begriff und gering schätzte; daß endlich die Kantische Ethik den reinen, unmittelbar bei Erkenntniß der Umstände ansprechenden und zum Rechtthun und Wohlthun leitenden guten Willen als bloßes Gefühl und Aufwallung für werth- und verdienstlos erklärte, und nur dem aus abstrakten Maximen hervorgegangenen Handeln moralischen Werth zuerkennen wollte.
Die allseitige Uebersicht des Lebens im Ganzen, welche der Mensch durch die Vernunft vor dem Thiere voraus hat, ist auch zu vergleichen mit einem geometrischen, farblosen, abstrakten, verkleinerten Grundriß seines Lebensweges. Er verhält sich damit zum Thiere, wie der Schiffer, welcher mittelst Seekarte, Kompaß und Quadrant seine Fahrt und jedesmalige Stelle auf dem Meer genau weiß, zum unkundigen Schiffsvolk, das nur die Wellen und den Himmel sieht. Daher ist es betrachtungswerth, ja wunderbar, wie der Mensch, neben seinem Leben in concreto, immer noch ein zweites in abstracto führt. Im ersten ist er allen Stürmen der Wirklichkeit und dem Einfluß der Gegenwart Preis gegeben, muß streben, leiden, sterben, wie das Thier. Sein Leben in abstracto aber, wie es vor seinem vernünftigen Besinnen steht, ist die stille Abspiegelung des ersten und der Welt worin er lebt, ist jener eben erwähnte verkleinerte Grundriß. Hier im Gebiet der ruhigen Ueberlegung erscheint ihm kalt, farblos und für den Augenblick fremd, was ihn dort ganz besitzt und heftig bewegt: hier ist er bloßer Zuschauer und Beobachter. In diesem Zurückziehn in die Reflexion gleicht er einem Schauspieler, der seine Scene gespielt hat und bis er wieder auftreten muß, unter den Zuschauern seinen Platz nimmt, von wo aus er was immer auch vorgehn möge, und wäre es die Vorbereitung zu seinem Tode (im Stück), gelassen ansieht, darauf aber wieder hingeht und thut und leidet wie er muß. Aus diesem doppelten Leben geht jene von der thierischen Gedankenlosigkeit sich so sehr unterscheidende menschliche Gelassenheit hervor, mit welcher Einer, nach vorhergegangener Ueberlegung, gefaßtem Entschluß oder erkannter Nothwendigkeit, das für ihn Wichtigste, oft Schrecklichste kaltblütig über sich ergehn läßt, oder vollzieht: Selbstmord, Hinrichtung, Zweikampf, lebensgefährliche Wagstücke jeder Art und überhaupt Dinge, gegen welche seine ganze thierische Natur sich empört. Da sieht man dann, in welchem Maaße die Vernunft der thierischen Natur Herr wird, und ruft dem Starken zu: sidêreion ny toi êtor! (ferreum certe tibi cor!) Il. 24, 521. Hier, kann man wirklich sagen, äußert sich die Vernunft praktisch: also überall, wo das Thun von der Vernunft geleitet wird, wo die Motive abstrakte Begriffe sind, wo nicht anschauliche, einzelne Vorstellungen, noch der Eindruck des Augenblicks, welcher das Thier leitet, das Bestimmende ist, da zeigt sich praktische Vernunft. Daß aber dieses gänzlich verschieden und unabhängig ist vom ethischen Werthe des Handelns, daß vernünftig Handeln und tugendhaft Handeln zwei ganz verschiedene Dinge sind, daß Vernunft sich eben so wohl mit großer Bosheit, als mit großer Güte im Verein findet und der einen wie der andern durch ihren Beitritt erst große Wirksamkeit verleiht, daß sie zur methodischen, konsequenten Ausführung des edeln, wie des schlechten Vorsatzes, der klugen, wie der unverständigen Maxime, gleich bereit und dienstbar ist, welches eben ihre weibliche, empfangende und aufbewahrende, nicht selbst erzeugende Natur so mit sich bringt, – dieses Alles habe ich im Anhange ausführlich auseinandergesetzt, und durch Beispiele erläutert. Das dort Gesagte stände hier an seinem eigentlichen Platz, hat indessen, wegen der Polemik gegen Kants vorgebliche praktische Vernunft, dorthin verlegt werden müssen; wohin ich deshalb von hier wieder verweise.