Roger-Pol Droit: qual o ângulo da ética?

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Então, qual é o ângulo particular desde o qual a ética aborda nosso comportamento? Para encontrar respostas, devemos lembrar que continuamos nos perguntando “como agir”. Por não sermos máquinas, robôs programados para executar uma tarefa sem pensar. Pelo contrário, ao longo do dia e ao longo da vida, decidimos. Assumimos responsabilidade, mesmo nas coisas mais simples.

Quando criança, nos perguntamos se é melhor desobedecer ou obedecer às ordens que recebemos. Podemos descobrir se devemos ou não denunciar quem cometeu um erro e causou um desastre. Quando adolescente, examinaremos se os segredos dos melhores amigos são mantidos ou se é melhor, algumas vezes, revelá-los em circunstâncias especiais. Quando adulto, teremos milhares de oportunidades para deliberar sobre se é bom ou ruim dizer essa ou aquela verdade a nossos filhos, pais, parentes, amigos ou colegas. Velho, podemos nos perguntar se devemos esperar pela morte, independentemente das doenças e sofrimentos que nos aguardam, ou se é possível escolher o dia e a hora da nossa partida.

Estes são apenas alguns exemplos. De fato, nunca paramos de agir, sempre nos perguntando como agir “melhor”. Isso permite que você dê uma nova resposta, sempre muito simples, à sua pergunta: a ética é antes de tudo o conjunto de reflexões vinculadas a perguntas como: “O que devo fazer? Como devo agir?”

– Nós sempre queremos fazer o que há de melhor?

– Na verdade sim. Mas o que complica a situação é que esse “melhor” não é necessariamente o mesmo para todos. Isso nem sempre é considerado “bom” pela maioria das pessoas. Imagine alguém se perguntando: “O que eu poderia fazer para agir da pior maneira? Pode acontecer: quando queremos vingança, quando somos carregados pelo ódio, animados pela vontade de prejudicar. Você vê imediatamente que, ao fazer essa pergunta, você realmente pensa que esse “pior” será o que é … o melhor! O melhor será “o que é mais desagradável”. Portanto, mesmo nesses casos, no final do dia, você ainda deseja “fazer o que é certo”.

Sócrates, esse mestre filósofo que viveu em Atenas no século V aC, foi o primeiro a apontar esse paradoxo: até o ladrão, o criminoso, o ditador querem o bem. Simplesmente, eles se equivocam quanto ao bem. Aos olhos de Sócrates, portanto, não existe uma vontade totalmente negativa: não se pode querer o mal pelo mal. Parece que escolhemos o mal, mas na verdade queremos o bem. Nós apenas nos perdemos, em se equivocando quanto ao bem.

– Ainda parece curioso…

– À primeira vista, certamente. O que você precisa ter em mente, por enquanto, é que, por trás de nossas decisões cotidianas aparentemente mundanas, há muitas perguntas surgindo. Em segundo plano, há muitos pensamentos que rapidamente se tornam necessários para saber como devemos agir.

Seja uma questão de escolhas simples ou decisões fundamentais, de preferências sentimentais ou políticas, de posições individuais ou coletivas – em associações, empresas, instituições -, cada vez que essa questão ética é considerada. Além disso, seu domínio não para por aí. É ainda mais amplo, porque a ética também diz respeito a decisões na vida internacional, guerra e paz, a luta contra as desigualdades entre regiões do mundo.

Podemos até estender a lista, porque também há uma dimensão ética nas ações para manter o equilíbrio natural, preservar as condições de vida das gerações futuras, reparar a devastação do planeta etc. Como você pode ver, o campo das questões éticas não tem limites. Eles são encontrados em toda parte, em todos os setores da atividade humana, individual ou coletiva.

– Em todas essas áreas, a ética deve nos fornecer as respostas para agir? Ela deveria nos dizer o que devemos fazer?

– Não exatamente. É ao mesmo tempo mais simples e mais sutil. Porque não se trata somente de saber o que temos que decidir nos próximos quinze minutos, dependendo da situação particular em que estamos. É também uma questão de saber em nome de que tomaremos uma decisão em vez de outra, quais são os valores a que nos referiremos, quais são os critérios de nossa escolha. A questão mais importante não é necessariamente qual decisão tomaremos. O principal é entender de acordo com o que retemos ou rejeitamos uma solução entre as duas – ou as quatro, cinco ou dez – possibilidades que se apresentam.

Em outras palavras, a ética não é uma atividade prática em que se possa contentar-se em aplicar regras mecanicamente. Também devemos refletir sobre o que justifica essas regras, sobre o que baseia as escolhas de ações, sobre o ponto de partida que adotamos, os métodos que queremos implementar, os resultados que queremos alcançar … e as razões que legitimam tudo isto!

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