Se a criação da primeira mulher foi obra do divino ferreiro, foi também a um Gênio do fogo, Prometeu, que coube a tarefa de criar o primeiro homem. Como Hefestos, Prometeu serviu-se do limo e da terra para modelar o corpo do primeiro ser humano; mas, em lugar de molhar a argila com água, dizem que foi com lágrimas que a destemperou. O homem saiu de suas mãos nu, indefeso e sem armas. Condenados, desde seu nascimento, aos tormentos e aos cuidados, os primeiros homens não tinham, para nutrir-se, senão frutas cruas e carnes sangrentas. Para vestir-se, cobriam-se de folhagens. Ignorando o bem-estar que proporciona o fogo que arde no fundo dos átrios, tinham como abrigo apenas buracos sem sol, grutas profundas para as quais, semelhantes a formigas, de corpo comprido e franzino, eles se arrastavam para passar a noite. Tomado de piedade por sua miséria, Prometeu, para colocar os homens em situação de viver melhor, de defender-se com armas eficazes contra as feras, de cultivar com instrumentos adequados a nutriente Terra, resolveu dar-lhes o fogo e ensinar-lhes, com a arte de trabalhar os metais, os meios de escapar à sua deplorável e lamentável sorte.
Carregando o nártex, caule oco enchido com a medula de uma alta planta, chamada férula, Prometeu dirigiu-se a Lemnos. Aproximando-se das forjas abrasadoras de Hefestos, roubou uma centelha do fogo que fundia os metais, colocou-a no oco da férula e levou-a, como oferenda, aos homens. A humanidade desde então conheceu, com o fogo, a felicidade de viver melhor, de comer um alimento menos selvagem, de aquecer-se, de receber a luz. Mas, em sua alegria imoderada, ela julgou-se igual aos poderes divinos, esquecendo seus deveres para com os mesmos. Zeus, então, que não quer que os homens saiam dos justos limites, colocando seus desejos mais altos que seus destinos, resolveu castigar aquele cujo roubo havia ocasionado esta presunção sacrílega. Transportou Prometeu para o mais alto cume do Cáucaso e mandou Hefestos pregar o Titã a um rochedo escarpado. Contra a vontade, o divino ferreiro obedeceu.
— Vê, ó Prometeu, — disse-lhe ele — estes martelos, estes anéis de ferro, estas correntes! Para a tua infelicidade e para a minha, vou pregar-te neste cume selvagem. Não ouvirás mais nenhuma voz humana e aqui jamais verás passar o rosto da piedade e da consolação. Ressequido pelos raios abrasadores do Sol, verás murchar a flor do teu corpo. Muito tarde para ti, a Noite virá esconder o dia sob seu manto de estreias, e muito tarde também o Sol virá derreter o orvalho da manhã. Sentinela inquieta e dolorosa, ficarás neste medonho rochedo, sem repouso, sem sono, sem dobrar os joelhos o sem cessar de soltar mil gemidos inaudíveis e vãos.
Hefestos, então, passou os anéis de uma inquebrável corrente aos pés e aos braços do infeliz Prometeu e fixou-os solidamente ao rochedo. Para cúmulo do infortúnio, todas as manhãs, uma águia de asas abertas ia pastar em seu fígado imortal, e esse monstro de garras recurvas devorava, durante o dia, tudo quanto, à noite, aí podia renascer. Esse suplício deveria durar mil anos, mas ao fim de trinta anos, Zeus, apaziguado, perdoou o culpado, consentindo então em introduzi-lo entre os Bem-aventurados. Quanto aos homens, para castigar seu enorme descomedimento no uso do fogo, Zeus os engoliu sob as vagas do dilúvio. Não se distinguia mais a Terra do Oceano e um mar sem praia espalhou-se por todas as partes.