Pitágoras Tudo Número

Excertos de “Pitágoras. Amante da Sabedoria”.
“Todas as Coisas são Números”
O mais intrigante problema em qualquer discussão a respeito da personalidade de Pitágoras e sobre as influências que se exerceram sobre ele baseia-se nesta pergunta: qual a origem de sua verdadeira obsessão com os números e os inter-relacionamentos numéricos? Ele declarava que tudo tinha relação com os números. Este foi o ponto de partida para as suas teorias nos domínios da moralidade, assim como nos da astronomia e da música, já que os números eram “a causa dos deuses e dos demônios”.

Como os números que “causavam” os deuses e os demônios eram muito diferentes daqueles usados de maneira normal, nas práticas do dia-a-dia, qual seria o seu significado? Aristóteles nos oferece quatro interpretações experimentais: que todas as coisas deviam sua existência à imitação ou à representação dos números; que os elementos dos números e os elementos das coisas seriam iguais; que as coisas na verdade eram compostas de números. Eurytus, um dos discípulos originais, parece dar o seu apoio a essa última interpretação, quando fixa o número de cada entidade através da formação de seu perfil com pedregulhos. Desta forma, o total necessário para formar, digamos, a figura de um homem, seria o número da humanidade em geral.

Aristóteles derrama sua zombaria sobre isso. Conforme ele observa, se esse fosse o caso, muitas coisas acabariam sendo iguais, já que mais de uma imagem pode ser formada com o mesmo número de pedregulhos. Sua quarta sugestão é no sentido de que, talvez, os números representassem o que poderíamos chamar de “fórmulas”, como acontece, por exemplo, numa equação. Em seu tempo, era crença geral de que tudo que existe era composto dos quatro elementos básicos, isto é, a terra, o ar, o fogo e a água, misturados em determinadas proporções. Os ossos, por exemplo, seriam compostos de três partes de fogo com duas partes de terra. Portanto, os números poderiam representar as quantidades desses ingredientes em qualquer entidade em particular.

Mas, como ele próprio observa, isto também se presta a objeções. Apesar de ser possível descrever os objetos concretos desta maneira, o que dizer das qualidades como quente, frio, feio ou bonito? Mas, sem dúvida alguma, os pitagóricos foram mais além, atribuindo números também às coisas abstratas. A oportunidade era sete, que, conforme se afirmava, vinha do fato de que desempenhava um papel predominante na vida humana. Uma criança pode nascer depois de sete meses, começa a ter dentes depois de outros sete, alcança a puberdade por volta do segundo período de sete anos e terá barba em um terceiro período igual.

Na mesma escala, a justiça é quatro (2 x 2); a masculinidade um número ímpar e a feminilidade um número par, de modo que o casamento se torna cinco, representando a união do primeiro número par com o primeiro número ímpar.

Como foi que Pitágoras chegou a estas idéias? Conforme foi sugerido, ele talvez as tivesse assimilado a partir de seu envolvimento com o comércio e no interesse quantitativo de comerciante por suas mercadorias, ponto de vista apoiado por Aristoxenus, um musicólogo que era amigo pessoal de vários dos primeiros pitagóricos e autor de um tratado perdido sobre o movimento. Outros, como já vimos, acreditam que suas idéias a respeito teriam tido origem na contemplação da numismática como representação abstrata de valor. Mas inúmeras outras possibilidades já foram colocadas.

Os números e a matemática têm o caráter de verdades imutáveis. Dois multiplicado por dois sempre resulta em quatro. O número um, dividido ou multiplicado, mesmo quando se extrai sua raiz quadrada, permanece para sempre, e em alguns casos até por milagre, com o valor um. Assim, os números têm os atributos de absolutos e dos próprios deuses, o que talvez explique por que os números, um deles em particular, a Mónada Sagrada, desempenhavam papel tão importante no orfismo. Além disso, em suas viagens Pitágoras deve ter-se encontrado com os caldeus babilônios ou com os magos persas, que, além de matemáticos, também praticavam a numerologia.

Guthrie, por outro lado, acredita que ele teria sido profundamente afetado pela descoberta das relações matemáticas existentes na oitava musical. Pitágoras e seus seguidores colocavam a música em um lugar bastante alto de suas atividades. Ela falava à alma, levando até a mudanças de comportamento. Isto também seria consistente com o orfismo, fundado por um músico e cantor que, na opinião de Pausanias (cerca do século II a.D.), “ultrapassara todos os que o haviam precedido”. Numa lenda bastante conhecida, Orfeu teria sido capaz de encantar os pássaros e os animais com as suas melodias, e em outra teria usado a música para proteger os Argonautas do cântico fatal das sereias. Apolo, seu deus tutelar, também era um músico consagrado, tendo recebido de Hermes a primeira lira. Portanto, não é surpresa alguma vermos Pitágoras sendo descrito como uma pessoa dotada de um dom semelhante: ele teria chegado até mesmo a usar a música, da mesma forma que Orfeu e Apolo, para curar doenças do corpo e da mente.

Com o seu interesse pela música comparado apenas a seu fascínio pelos números, seria de esperar que os pitagóricos tentassem combinar os dois. E, de fato, Pitágoras foi aclamado descobridor do fato de que a corda lá, da lira de sete cordas, tinha de ter a metade do comprimento da corda sol, uma proporção de 2:1, para produzir uma oitava completa, enquanto as cordas intermediárias relacionavam-se umas com as outras nas proporções de 3:2, 4:3, e assim por diante. Isso significa que todas derivavam das séries numéricas 1,2,3,4 etc, chegando até dez, número que Pitágoras considerava dotado de atributos especiais.

Não vem ao caso se Pitágoras teria ou não sido o descobridor disso. Segundo uma lenda que surgiu logo depois de seu tempo, ele teria deparado com essa idéia ao ouvir as notas produzidas pelos martelos de diferentes pesos, usados pelos ferreiros, ao atingir a bigorna. Segundo outra lenda, ele teria feito experiências com a tensão de uma corda, aumentando o peso suspenso por ela. Na verdade, nem o peso de um martelo nem o aumento do peso na ponta de uma corda servem para alterar a tonalidade de um som. Nem se pensava isso, mesmo naquele tempo. A crença geral então era de que a tonalidade era uma função da velocidade do movimento: o tom seria alterado com o aumento da velocidade.

Guthrie observa que a lira e a cítara gregas tinham cordas de comprimentos iguais, e a modulação era alcançada pelo músico segurando as cordas em determinados pontos. Ele considera isto uma prova de que a matemática envolvida no projeto dos instrumentos era desconhecida antes de Pitágoras. No entanto, a figura de um músico entalhada em uma pedra encontrada em Keros e datada entre 2800-2200 a.C. mostra um instrumento de quadro triangular. Este é o formato que seria necessário no caso de se usarem cordas de comprimento graduado e esta é precisamente a forma que diferencia a harpa da lira. A harpa já era conhecida na Mesopotâmia por volta de 3000 a.C. e é provável que tenha sido usada no mundo céltico nos tempos de Pitágoras. Como ele próprio era um músico consagrado, é pouco provável que nada soubesse a respeito do instrumento ou de seu formato.

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