português
Trata-se, aqui, de uma questão importante: a física, nossa ciência exemplar, encontra-se a ponto de mudar subitamente de aspecto e de caráter. O leitor, por mais distanciado que esteja dos estudos científicos, tem obrigação de esforçar-se em conhecer pelo menos suas grandes vicissitudes. Está claro que o “leitor”, acostumado como está a que se dirijam a ele demagogos — boa porção dos que hoje escrevem o são numa ou noutra medida — acredita que somente têm direitos, que ele não está obrigado a nada. Mas, convém que vá mudando de opinião, e sobretudo de comportamento, sob pena de passar bem mal nos anos porvindouros sobre nossa espécie.
Milne é o físico contra o qual o Dr. Dingler dirigiu seu mais violento ataque. Havia aquele dito que “se o universo efetivo não segue os pormenores da construção matemática, a coisa não tem importância”. Isto sublevou o Dr. Dingler. De que falam então estes novos físicos — pergunta-se o Sr. Dingler —- se pouco se importam que as coisas coincidam ou não com suas elucubrações? A estas extravagâncias leva o “apriorismo”, o aristotelismo. Galilei representa diante de Aristóteles a não crença em que a razão da natureza seja a mesma do homem, e a forçosidade consequente em que este se acha de buscar nas “observações sensíveis” os princípios que aquela deixa entrever. “A história — prossegue Dingler com certa solenidade patética — mostra poucos exemplos de lealdade a um legado comparável com a das gerações de trabalhadores científicos que seguiram.” Por faltar a essa lealdade cai agora a física numa estranha “combinação de paralisia da razão com intoxicação da fantasia”.
Vejamos o que há de verdade em tudo isto. Milne, com uma admirável serenidade de jovem atleta matemático, responde num artigo escrito como somente sabem escrever os matemáticos. Os demais escritores podemos, com esforço, chegar a uma clareza plástica, quase tangível. Mas há outra clareza mais essencial e oposta a essa, uma clareza feita de diafanidade e transparência, como ultraterrena, em que as próprias coisas desaparecem e fica somente no ar limpo, alciônico, sua pura voz. Parece-nos, lendo a estes autores, que as coisas, sem intermediário, sem turgimão, se declaram por si mesmas, dizem-se-nos.
Milne se propõe orientar-nos sobre o uso intelectual, o procedimento que em suas investigações seguiu.
A física padece uma dualidade que é irracional . De um lado nos diz que é o que existe, constrói uma realidade pura — chame-se-a átomo ou como se queira. Depois, e à parte, investiga experimentalmente como se comporta essa realidade. É evidente que a física não será uma disciplina suficientemente racional enquanto estas duas partes dela não se unam; isto é, enquanto não se consegue derivar racionalmente o comportamento das coisas de sua realidade ou estrutura .
É isto o que procuraram, e em boa parte conseguiram, fazer Milne, e com ele Wittrow, Wheele, Robertson, etc.
Milne se propõe aplicar da maneira mais radical possível o princípio da economia do pensamento, que é um princípio filosófico, pelo menos epistemológico e não físico. A este fim tentará derivar todas as leis físicas de um minimum de admissões consistentes na descrição mínima do que existe. Estas admissões são duas: a homogeneidade do Universo — em distribuição e movimento — e a existência de alguém que perceba a relação de antes e depois; em suma, o movimento. Estas admissões ou supostos são constituídos em axiomas, no sentido rigoroso que este termo tem hoje na matemática pura. Desses axiomas Milne deriva teoremas sem empregar notícia alguma experimental, eliminando todas as leis quantitativas (obtidas por observação) da física. A teoria da relatividade lhe induziu a esta tentativa. Pois bem, diz Milne: “É uma coisa surpreendente que a eliminação de todo auxílio empírico, incluindo todo apoio em leis quantitativas da física, possa ser levada tão longe como, com efeito, acontece, não obstante a imperfeição do estado presente da teoria.” Ninguém pôde surpreender-se mais que o presente escritor. Não se trata, pois de uma fé a priori que convide à burla, mas que é preciso reconhecer como um fato de experiência que quando eliminamos todos esses apoios empíricos emergem diante de nós regularidades (como consequências lógicas das hipóteses), as quais têm o mesmo papel que as autênticas leis da natureza, cuja vigência está garantida pela observação. Ora, estas regularidades têm a dignidade de teoremas, e a estrutura ou corpo lógico resultante tem a dignidade (ou te-la-ia se tivesse chegado à perfeição) de uma abstrada geometria baseada em axiomas. Nela derivamos racionalmente do que existe as leis de seu comportamento. Graças a isso deixam estas de ser, como até aqui, costumes contingentes que observamos nas coisas e se convertem em consequências inexoráveis de sua própria constituição ou estrutura. Agora são de verdade leis da natureza e não caprichos dela.
Ou seja — e é isto a grandeza do fato — que a física está a ponto de converter-se numa geometria que entre seus vários axiomas inclui um onde se antecipa a noção de movimento. O qual — passando agora novamente de clareza matemática à clareza plástica — significa que um homem encerrado em sua casa, sem aparelhamento, sem matérias observáveis, por simples combinação de ideias, pode em poucas semanas redescobrir o que exigiu empregar trezentos anos e trinta mil laboratórios. Com este agravante: que não há razão para que esta nova física–geometria não prossiga suas deduções e verifique inumeráveis leis novas.
A dignidade ou caráter matemático desta investigação não permite, está claro, garantir que as coisas se comportam consoante esses teoremas. A observação será quem decida se, com efeito, é assim. Mas é evidente que o papel desta fica, em princípio, invertido. Consoante Dingler, somente a observação nos permite descobrir as leis da natureza. Consoante Milne, pode-se chegar a elas a priori e a observação reduz seu papel a confirmá-las.
Daí que, mesmo no caso de que os teoremas achados por esse método não encontrassem cumprimento dos fenômenos observáveis, o corpo de doutrina obtido prosseguirá tendo seu valor independente como o têm as geometrias de espaços inobserváveis. Houvera sido um crime de lesa-ciência esmagar as tentativas de criar geometrias não-euclideanas com o pretexto de que os meios experimentais de há setenta anos não permitiam decidir se eram aplicáveis ou não. A teoria da relatividade, auxiliada por meios de observação mais precisos, mostrou que o corpo de puros teoremas chamado geometria euclideana não se cumpre nos fenômenos da natureza e que, ao contrário, se cumprem os teoremas da geometria de Riemann. O mesmo acontecerá agora. É preciso criar uma série de puras físicas-geometrias partindo de axiomáticas diferentes.
Recorde-se que uma das coisas que contraíam o diafragma do Dr. Dingler era ouvir a estes novos físicos falar do “universo”. O físico não pode falar senão da porção de realidade que está ao alcance de sua observação. O termo “universo” implica que transcendemos os limites do observável e que nos permitimos supor dogmaticamente como é a porção de realidade inobservável . É isto o que faz Milne e com ele toda física–geometria ao antecipar, em forma axiomática, que o “universo” é homogêneo e isótropo.
Do ponto de vista da física tradicional tem razão o Dr. Dingler neste extremo. Mas Milne responderá a isto com insuperável clareza: em primeiro lugar, o Universo de que eu falo não é é o Universo real, mas o definido por mim no conjunto de meus axiomas. A ele me atenho e de suas características imaginárias deduzo meus teoremas. Depois comparo estes com as leis da física experimental, que ela, sim, fala do real, e vejo que coincidem. Somente então, e agora sim, adquire meu Universo o caráter de real, e não imaginário. Em segundo lugar, eu parto axiomaticamente da homogeneidade do Universo para construir um corpo de consequências lógicas, isto é, para ver a que resultados racionais, a que série de puros teoremas leva essa suposição. Em minha teoria, a homogeneidade do Universo representa exatamente o mesmo papel que o axioma do plano na geometria de Euclides. Mas nem que dizer tem que não somente podem, senão que devem construir-se outras físicas-geometrias partindo de outros supostos. Eu acreditei que devia começar peio caso mais simples: o de um Universo homogêneo. Mas depois conviria tentar, por exemplo, este outro: um Universo em que ao redor de um núcleo homogêneo existam aros de heterogeneidade crescente.
Como se vê, a mudança é profunda. Agora se trata de chegar aos fatos, não por meio da observação, mas ao contrário, por meio de construções imaginárias. Dito em outros termos: a física consistiria na criação de um repertório de mundos ideais, puramente inventados. Cada um desses mundos, tomado em sua totalidade, é o que é preciso comparar com o conjunto dos fatos observados. Aquele mundo ideal deverá ser considerado como o real, em que estes fatos observados encontram melhor acomodação.
Que responderemos, pois, ao dilema em que o Sr. Dingler coloca a questão, ao dilema de se o fundamento da ciência deve ser a observação ou a invenção?
Responderemos, como já fizemos, que isso é o que se discute, não agora, mas desde há trezentos anos; que esse dilema não é, como pretende ser, uma formulação inequívoca do problema . A mera observação não funda a ciência. O Dr. Dingler tem uma ideia bastante ridícula da história do pensamento se acredita que os homens não observaram antes de Galilei e se acredita que a inovação genial deste foi observar. A observação, a de Galilei como a do homem paleolítico, é impossível sem invenção prévia. Os fatos não nos dizem nada espontaneamente. Esperam que nós lhes dirijamos perguntas deste tipo: Sois A ou sois B? Mas A e B são imaginações nossas, invenções.
Depois de tudo, ocorre à física o mesmo que já aconteceu à geometria. Os egípcios tinham uma geometria que era empírica. Os gregos fizeram dessa geometria empírica uma disciplina racional. Na física há também um aspecto grego e um aspecto egípcio. O Sr. Dingler fica com o aspecto egyptian, que em inglês soa a alguma coisa parecida com “cigano”.
La Nación, de Buenos Aires, 26 de outubro de 1937.
original
Se trata aquí de una cuestión importante: la física, nuestra ciencia ejemplar, se encuentra a punto de cambiar súbitamente de aspecto y de carácter. El lector, por muy alejado que esté de los estudios científicos, tiene obligación de esforzarse en conocer por lo menos sus grandes vicisitudes. Claro es que el «lector», acostumbrado como está a que se dirijan a él demagogos —buena porción de los que hoy escriben lo son en una u otra dosis—, cree que sólo tiene derechos, que él no está obligado a nada. Pero conviene que vaya cambiando de opinión, y sobre todo de conducta, so pena de pasarlo muy mal en los años que vienen sobre nuestra especie.
Milne es el físico contra el cual el doctor Dingler dirigió su más violento ataque. Había aquél dicho que «si el universo efectivo no sigue los detalles de la construcción matemática, la cosa no tiene Importancia». Esto ha sublevado al doctor Dingler. ¿De qué hablan entonces estos nuevos físicos —se pregunta el señor Dingler— si les trae sin cuidado que las cosas coincidan o no con sus lucubraciones? A estas extravagancias lleva el «apriorismo», el aristotelismo. Galileo representa frente a Aristóteles la no creencia en que la razón de la naturaleza sea la misma del hombre, y la forzosidad consecuente en que éste se halla de buscar en las «observaciones sensibles» los principios que aquélla deja entrever. «La historia —prosigue Dingler con cierta solemnidad patética— muestra pocos ejemplos de lealtad a un legado comparable con la de las generaciones de trabajadores científicos que siguieron». Por faltar a esa lealtad cae ahora la física en una extraña «combinación de parálisis de la razón con intoxicación de la fantasía».
Veamos qué hay de verdad en todo esto. Milne, con una admirable serenidad de joven atleta matemático, contesta en un artículo escrito como sólo saben escribir los matemáticos. Los demás escritores podemos, con esfuerzo, llegar a una claridad plástica, casi tangible. Pero hay otra claridad más esencial y opuesta a ésa, una claridad hecha de diafanidad y transparencia, como ultraterrena, en que las cosas mismas desaparecen y queda sólo en el aire limpio, alciónico, su pura voz. Nos parece, leyendo a estos autores, que las cosas, sin intermediario, sin truchimán, se declaran por sí mismas, se nos dicen.
Milne se propone orientamos sobre el uso intelectual, el procedimiento que en sus investigaciones ha seguido.
La física padece una dualidad que es irracional. De un lado nos dice qué es lo que hay, construye una realidad pura —llámesela átomos o como se quiera. Luego, y aparte, investiga experimentalmente cómo se comporta esa realidad. Es evidente que la física no será una disciplina suficientemente racional mientras estas dos partes de ella no vengan a unidad; es decir, mientras no se logre derivar racionalmente el comportamiento de las cosas de su realidad o estructura.
Esto es lo que ha intentado, y en buena parte logrado, hacer Milne, y con él Wittrow, Wheele, Robertson, etc.
Milne se propone aplicar de la manera más radical posible el principio de la economía de pensamiento, que es un principio filosófico, por lo menos, epistemológico y no físico. A este fin ensayará derivar todas las leyes físicas de un mínimum de admisiones consistentes en la descripción mínima de lo que hay. Estas admisiones son dos: la homogeneidad del Universo —en distribución y movimiento— y la existencia de alguien que perciba la relación de antes y después; en suma, el movimiento. Estas admisiones o supuestos son constituidos en axiomas, en el sentido rigoroso que este término tiene hoy en la puta matemática. De esos axiomas Milne deriva teoremas sin emplear noticia alguna experimental, eliminando todas las leyes cuantitativas (obtenidas por observación) de la física. La teoría de la relatividad le indujo a este ensayo. Pues bien, dice Milne: «es una cosa sorprendente que la eliminación de todo auxilio empírico, incluyendo todo apoyo en leyes cuantitativas de la física, pueda ser llevada tan lejos como, en efecto, acontece, no obstante la imperfección del estado presente de la teoría». Nadie ha podido sorprenderse más que el presente escritor. No se trata, pues, de una fe a priori que invite a la burla, sino que es preciso reconocer como un hecho de experiencia que cuando eliminamos todos esos apoyos empíricos emergen ante nosotros regularidades (como consecuencias lógicas de las hipótesis), las cuales tienen el mismo papel que las auténticas leyes de la naturaleza, cuya vigencia está garantizada por la observación. Ahora bien, estas regularidades tienen la dignidad de teoremas, y la estructura o cuerpo lógico resultante tiene la dignidad (o la tendría si hubiese llegado a perfección) de una abstracta geometría basada en axiomas. En ella derivamos racionalmente de lo que hoy las leyes de su comportamiento. Merced a ello dejan éstas de ser, como hasta aquí, costumbres contingentes que observamos en las cosas y se convierten en consecuencias inexorables de su propia constitución o estructura. Ahora son de verdad leyes de la Naturaleza y no caprichos de ella.
Es decir —y esto es lo enorme del hecho— que la física está a punto de convertirse en una geometría que entre sus varios axiomas incluye uno donde se anticipa la noción de movimiento. Lo cual —pasando ahora nuevamente de la claridad matemática a la claridad plástica —significa que un hombre encerrado en su habitación, sin aparatos, sin materias observables, por simple combinación de ideas, puede en pocas semanas redescubrir lo que ha requerido emplear trescientos años y treinta mil laboratorios. Con esta agravante: que no hay razón para que esta nueva física-geometría no prosiga sus deducciones y averigüe innumerables leyes nuevas.
La dignidad o carácter matemático de esta investigación no permite, claro está, garantizar que las cosas se comportan según esos teoremas. La observación será quien decida si, en efecto, es así. Pero es evidente que el papel de ésta queda, en principio, invertido. Según Dingler, sólo la observación nos permite descubrir las leyes de la naturaleza. Según Milne, se puede llegar a ellas a priori y la observación reduce su papel a confirmarlas.
De aquí que aun en el caso de que los teoremas hallados por ese método no encontrasen cumplimiento de los fenómenos observables, el cuerpo de doctrina obtenido seguirá teniendo su valor independiente como lo tienen las geometrías de espacios inobservables. Hubiera sido un crimen de lesa ciencia aplastar los ensayos de crear geometrías no-euclidianas con el pretexto de que los medios experimentales de hace setenta años no permitían decidir si eran aplicables o no. La teoría de la relatividad, auxiliada por medios de observación más precisos, ha mostrado que el cuerpo de puros teoremas llamado geometría euclidiana no se cumple en los fenómenos de la naturaleza y que, en cambio, se cumplen los teoremas de la geometría de Riemann. Lo mismo pasará ahora. Es preciso crear una serie de puras físicas-geometrías partiendo de axiomáticas diferentes.
Recuérdese que una de las cosas que contraían el diafragma del doctor Dingler era oír a estos nuevos físicos hablar del «universo». El físico no puede hablar sino de la porción de realidad que está al alcance de su observación. El término «universo» implica que hemos trascendido los límites de lo observable y que nos hemos permitido suponer dogmáticamente cómo es la porción de realidad inobservable. Esto es lo que hace Milne y con él toda física-geometría al anticipar, en forma axiomática, que el «universo» es homogéneo e isótropo.
Desde el punto de vista de la física tradicional, tiene razón el doctor Dingler en este extremo. Pero Milne responderá a esto con insuperable claridad: en primer lugar, el Universo de que yo hablo no es el Universo real, sino el definido por mí en el conjunto de mis axiomas. A él me atengo, y de sus caracteres imaginarios deduzco mis teoremas. Luego comparo éstos con las leyes de la física experimental, que ella, sí, habla de lo real y veo que coinciden. Sólo entonces, pero sí entonces, adquiere mi Universo el carácter de real y no imaginario. En segundo lugar, yo parto axiomáticamente de la homogeneidad del Universo para construir un cuerpo de consecuencias lógicas, es decir, para ver a qué resultados racionales, a qué serie de puros teoremas lleva esa suposición. En mi teoría, la homogeneidad del Universo representa exactamente el mismo papel que el axioma del plano en la geometría de Euclides. Mas ni que decir tiene que no sólo pueden, sino que deben construirse otras físicas-geometrías partiendo de otros supuestos. Yo he creído que debía comenzar por el caso más sencillo: el de un Universo homogéneo. Pero luego convendría ensayar, por ejemplo, este otro: un Universo en que alrededor de un núcleo homogéneo existan aros de heterogeneidad creciente.
Como se advierte, el cambio es radical. Ahora se trata de llegar a los hechos, no por medio de la observación, sino al revés, por medio de construcciones imaginarias. Dicho de otro modo: la física consistiría en la creación de un repertorio de mundos ideales, puramente inventados. Cada uno de esos mundos, tomado en su totalidad, es lo que hay que comparar con el conjunto de los hechos observados. Aquel mundo ideal deberá ser considerado como el real, en que estos hechos observados encuentran mejor acomodo.
¿Qué contestaremos, pues, al dilema en que el señor Dingler aprieta la cuestión, al dilema de si el fundamento de la ciencia debe ser la observación o la invención?
Contestaremos, como ya hemos hecho, que eso es lo que se discute, no ahora, sino desde hace trescientos años, que ese dilema no es, como pretende ser, un planteamiento inequívoco del problema. La mera observación no funda la ciencia. El doctor Dingler tiene una idea bastante ridícula de la historia del pensamiento si cree que los hombres no observaron antes de Galileo y si cree que la innovación genial de éste fue observar. La observación, la de Galileo como la del hombre paleolítico, es imposible sin invención, previa. Los hechos no nos dicen nada espontáneamente. Esperan a qué nosotros les dirijamos preguntas de este tipo: ¿Sois A o sois B? Pero A y B son imaginaciones nuestras, invenciones.
Después de todo, no le pasa ahora a la física sino lo mismo que aconteció ya a la geometría. Los egipcios tenían una geometría que era empírica. Los griegos hicieron de esa geometría empírica una disciplina racional. En la física hay también un aspecto griego y un aspecto egipcio. El señor Dingler se queda con el aspecto egyptian, que en inglés suena a algo así como «gitano».
La Nación, de Buenos Aires, 26 de octubre de 1937.