Novalis (P:115-116) – diálogo entre eu e não-eu

Torres Filho

21 Há certas ficções em nós, que parecem ter um caráter totalmente outro, que as demais [[Em lugar de “as demais”, Hardenberg havia escrito “as costumeiras”.]], pois são acompanhadas do sentimento de necessidade [[Fórmula transcrita literalmente da Primeira introdução à doutrina-da-ciência de Fichte: “Algumas de nossas representações são acompanhadas do sentimento de liberdade, outras do sentimento de necessidade(…). Mas é certamente uma pergunta digna de reflexão: qual é o fundamento do sistema das representações acompanhadas do sentimento de necessidade, e desse próprio sentimento de necessidade?” Segundo Fichte, a resposta a essa questão define “a tarefa da filosofia”.]], e no entanto não se apresenta nenhum fundamento externo para elas. Parece ao ser humano, como se ele estivesse envolvido em um diálogo, e algum ser desconhecido, espiritual, o ocasionasse de um modo prodigioso ao desenvolvimento dos pensamentos mais evidentes. Esse ser tem de ser um ser superior, porque se põe em relação com ele de uma maneira, que não é possível a nenhum ser ligado a fenômenos — Tem de ser um ser homogêneo, porque o trata como um ser espiritual e o solicita apenas à mais rara auto-atividade. Esse eu de espécie superior relaciona-se ao homem, como o homem à natureza, ou como o sábio à criança. O homem anseia igualar-se a ele, assim como procura tornar o n[ão-]e[u] igual a si.

Demonstrar esse fato não é possível. Cada qual tem de experienciá-lo ele mesmo.[[O texto usa a palavra Factum, remetendo diretamente à Doutrina-da-ciência de 1794, onde o primeiro Faktum aparece à consciência através da síntese da imaginação (I, 219-221). Também o uso do verbo darthun, significando “demonstrar”, e a própria construção da frase remetem a fórmulas frequentes em Fichte.]] É um fato de espécie superior, que somente o homem superior atingirá. Os homens devem porém empe-nhar-se em ocasioná-lo em si.

A ciência, que nasce através disto, é a d[outrina-da-]c[iência] superior [[A primeira versão, em lugar de “superior”, dizia “a doutrina-da-ciência invertida” (die verkehrte WL). De fato a frase seguinte, posteriormente riscada, inverte a relação entre a “parte teórica” e a “parte prática” da doutrina-da-ciência fichtiana.]]. < Aqui a proposição: eu determina n[ão-]e[u] é o princípio da parte teórica, e a proposição: eu é determinado — princípio da parte prática. > A parte prática contém a auto-educação do eu para tornar-se apto àquela comunicação — a parte teórica — os caracteres da genuína comunicação.[[Esta frase resulta de uma correção, pela qual os adjetivos “prática” e “teórica” foram trocados de posição.]] Os ritos fazem parte da educação.

Em Fichte a parte teórica contém os caracteres de uma genuína representação — a prática a educação e formação do n[ão-]e[u] para se tornar apto a uma verdadeira influência, a uma verdadeira comunidade com o eu — consequentemente, também a paralela autoformação do eu.

Moralidade é portanto pertinente em ambos os mundos; aqui, como fim — ali como meio — e é o elo que vincula ambos.

22 Filosofar é uma auto-interpelação da espécie acima — uma autêntica auto-revelação — suscitamento do eu efetivo pelo eu ideal. Filosofar é o fundamento de todas as outras revelações. A decisão de filosofar é uma solicitação ao eu efetivo [[A primeira versão era: “uma solicitação do eu efetivo”.]], de que ele tome consciência [[A expressão “tomar consciência” está traduzindo sich besinnen, que também pode significar “voltar a si”, e dá origem à palavra Besonnenheit. Cf. nota 37 às Observações entremescladas.]], desperte e seja espírito. Sem filosofia não há genuína moralidade, e sem moralidade nãofilosofia.

Schefer

21. Il y a en nous certaines compositions qui semblent très différentes des autres, car elles s’accompagnent du sentiment de la nécessité, quoiqu’aucune raison extérieure ne les fonde. L’homme a le sentiment d’être impliqué dans un dialogue et d’être merveilleusement exhorté par quelque être spirituel et inconnu à développer les pensées les plus évidentes. Il faut que cet être soit de nature spirituelle, car la relation qu’il a avec l’homme ne peut être le fait d’un être phénoménal — Il doit lui être homogène, car il le traite en être spirituel et ne l’exhorte que très rarement à l’auto-activité. Ce Moi d’un genre supérieur se reporte à l’homme comme celui-ci à la nature, ou le sage à l’enfant. L’homme aspire à lui ressembler, de même qu’il cherche à faire ressembler le N[on]-M[oi] à lui-même.

Ce fait est indémontrable. Chacun doit en faire par lui-même l’expérience. C’est un fait d’un genre supérieur que seul l’homme supérieur va rencontrer. Mais les hommes doivent s’efforcer de le produire en eux-mêmes. La science qui en résulte est la D[octrine] de la S[cience] supérieure. < Ici la proposition : le Moi détermine le N[on]-M[oi] est le principe théorique, et celle selon laquelle : le Moi est déterminé — est le principe de la partie pratique. > La partie pratique contient l’auto-éducation du Moi permettant cet échange — la partie théorique — les critères d’un authentique échange. Les rites font partie de l’éducation.

Chez Fichte, la partie théorique comprend les critères d’une véritable représentation — la partie pratique comprend l’éducation et la formation du N[on]-M[oi] qui doit permettre d’influencer véritablement le Moi et d’être véritablement en communauté avec lui — [elle contient aussi] l’auto-éducation parallèle du Moi. La moralité appartient par conséquent aux deux mondes ; ici, comme finalité — là, comme moyen — et elle est le lien qui les articule.

22. Le philosopher est ce dialogue avec soi-même, évoqué plus haut — une authentique autorévélation — l’irritation du moi réel à travers le Moi idéal. Le philosopher est au fondement de toutes les autres révélations. La décision de philosopher vient d’une exhortation du moi réel à se réfléchir, à s’éveiller et à devenir esprit. Sans philosophie, pas d’authentique moralité, et sans moralité, pas de philosophie.

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