Filosofia – Pensadores e Obras

inconceptibilidade

(in. Inconceivability; fr. Inconcevabilité; al. Unbegreiflichkeit; it. Inconcepibilità).

O critério cartesiano de aceitar como verdadeiro tudo o que é evidente para a razão tem como correlativo negativo o critério de rejeitar o que não parece evidente para a razão ou o que, em geral, é incompatível com a razão. Esse é propriamente o critério das inconceptibilidades. Foi utilizado sobretudo por Leibniz, que o defendeu explicitamente: “Em verdade reconheço que não é lícito negar o que não se entende, mas acrescento que se tem o direito de negar (pelo menos na ordem natural) aquilo que não é absolutamente inteligível nem explicável… A concepção das criaturas não é a medida do poder de Deus, mas a conceptibilidade ou força de concepção delas é a medida do poder da natureza, pois que tudo o que se conforma à ordem natural pode ser concebido ou entendido por alguma criatura” (Nouv. ess., Avant-Propos., Op., ed. Erdmann, p. 202). Em outros termos, pode-se admitir ser real na natureza aquilo que não se entende (que não se saiba explicar), mas não o que é inconcebível, ou seja, “incompatível com a razão”. Mas Leibniz não explicou o que deve ser entendido por incompatibilidade com a razão, o que tampouco fizeram todos os (muitíssimos) que se referiram a esse critério; a primeira crítica a esse critério encontra-se em Lógica de Stuart Mill, com referência ao emprego que dele fizeram Hamilton (Lectures on Metaphysics and Logic, 1859-60) e Spencer (Principles of Psychology, 1855). Stuart Mill notava como os antípodas eram declarados impossíveis pelos antigos, que achavam inconcebível que existissem pessoas cuja cabeça estivesse na direção dos nossos pés, e que um dos argumentos mais difundidos contra o sistema copernicano havia sido a inconceptibilidade do imenso espaço vazio que aquele sistema pressupunha (Lóg., V, 3, § 3; cf. II, 5, § 6; 7, §§ 1-3).

Realmente, a incompatibilidade com a razão, que é a definição de inconceptibilidade, não pode ter outro significado exato senão o de incompatibilidade com o sistema de crenças a que se faz referência. Obviamente semelhante incompatibilidade não pode valer como critério de juízo para a fidedignidade de uma noção qualquer. Se porém por inconceptibilidade se entende a contraditoriedade (como por vezes acontece), é preciso lembrar que o juízo sobre a contraditoriedade ou não de duas asserções deve referir-se a um campo determinado, no qual estejam implícita ou explicitamente definidas as regras da coerência ou da compatibilidade. Pode acontecer, p. ex., que não seja contraditório em física aquilo que seria contraditório em matemática ou vice-versa; p. ex., a física não julga contraditório conceber os fenômenos eletromagnéticos ao mesmo tempo como corpusculares e como ondulatórios. Mas para estes significados restritos e específicos de contraditoriedade, a palavra inconceptibilidade, em seu significado absoluto, é totalmente imprópria. Portanto, a filosofia contemporânea deixou de usá-la, não insistindo mais na antítese racional-inconcebível, mas na antítese significância-insignificância (v. significado). [Abbagnano]