Filosofia – Pensadores e Obras

ignorância

(lat. ignorantia; in. Ignorance; fr. Ignorance; al. Unwissenheit; it. Ignoranzà).

Imperfeição do conhecimento, mais precisamente a deficiência, inseparável do saber humano e devida às limitações do homem. Kant distinguiu a ignorância em objetiva e subjetiva. AI. objetiva consiste na deficiência de conhecimentos de fato (ignorância material) ou na deficiência de conhecimentos racionais(ignorância formal). A ignorância subjetiva é ignorância douta ou científica (de quem conhece os limites do conhecimento) (V. douta Ignorância) ou ignorância comum, que é a ignorância do ignorante. Kant acrescenta que a ignorância é inculpável nas coisas cujo conhecimento ultrapassa o horizonte comum, mas é culpável nas coisas cujo saber é necessário e atingível (Logik, Intr., VI). Esta observação de Kant ainda hoje é válida. [Abbagnano]


A ignorância (moral) é a carência do necessário conhecimento do valor moral de uma ação, e principalmente da lei (ignorantia iuris, legis), ou de um fato que cai sob a lei (ignorantia facti). Quem, ao contrair matrimônio, não sabe que a bigamia é proibida, tem ignorância da lei; quem não sabe que o consorte já estava casado validamente, tem ignorância do fato. A ignorância moral pode ser superável ou insuperável. A ignorância superável é culpável, na medida em que há ou houve negligência em adquirir o conhecimento exigido. Quem por ignorância insuperável pratica o mal, não é responsável por este em consciência. Contudo, no domínio jurídico externo, apesar da ignorância, não deixam de se apresentar muitas consequências: responsabilidade por danos resultantes, invalidade do matrimônio em virtude de impedimentos ocultos, etc. A ignorância culpável, não exime ante Deus, da responsabilidade pelo mal e por suas consequências, nem portanto de culpa e de merecer castigo. A culpa existe, já antes do fato, na recusa em procurar obter o devido esclarecimento e na leviandade com que se aceitam as más consequências previstas, embora tal previsão seja obscura. — Por ninguém, que esteja de posse do pleno uso da razão, podem, sem culpa, ser desconhecidos os princípios mais universais da moralidade, p. ex., que se deva praticar o bem. O mesmo se diga. das consequências e aplicações próximas (p. ex., devem-se honrar os pais), a não ser que uma educação contrária tenha deformado o juízo natural. Todavia, no que tange às aplicações mais difíceis (p. ex., à iliceidade do suicídio, mesmo em casos excepcionais) não é raro encontrar a ignorância inculpável. — Schuster. [Brugger]


Veja-se os dois diálogos de Sócrates com Clínias no Euthd., 277d-282e e 288d-293a; mas atente-se também em todo o ensinamento sobre a involuntariedade do mal, assimilado à ignorância, colocando assim a procura do bem sob a dependência de uma mais profunda procura do saber, no Protágoras, no Górgias, na Apologia e no Críton. Esta coincidência da excelência e do saber só virá a ganhar pleno esclarecimento com os livros centrais da República, no quadro da descrição do Bem como condição simultânea de todo o saber efetivo e de toda a efetiva excelência (VI, 508c-509c, 511cd, VII, 533bd; cf. 504e-505b, 506a), lição que o Filebo prosseguirá na sua versão mais definitiva e mais clara, através de uma limitação respectiva das pretensões do prazer e do saber à identificação com ίἀγαθόν [iagathon] (cf. 11b, 13e, 19d, 21b, 21d, 55bc, 60de, 65a-67b, e V. especialmente 22c, o apelo para ο ἀληθινόν καὶ θεῖον νοῦν [alethinon kai theion noun] como momento de identificação legítima do saber com o Bem; mas cf. também Phd., 69ae, Lg„ I, 631bd). Para esta última questão e, em especial, para a vinculação dos primeiros diálogos à doutrina do Bem na República, veja-se: P. Shorey, The Unity of Plato’s Thought, Part 1 e Part II, pp. 78-82, bem como What Plato Said, II; Friedländer, Plato, II; mais recentemente, H. Teloh, Socratic Education in Plato’s Early Dialogues, Notre Dame (Indiana), University of Notre Dame, 1986. [MesquitaPlatão:46]