(in. Factuality; al. Tatsächlichkeit; it. Fatticita).
Husserl deu esse nome ao modo de ser do fato, enquanto essencialmente “casual”, ou seja, porquanto pode ser diferente do que é (Ideen, I, § 2). Heidegger fez a distinção entre a “factualidade do factum brutum de uma simples presença”, de uma coisa, e a facticidade da existência (Sein und Zeit, § 29). [Abbagnano]
Como pode a facticidade adquirir o caráter de princípio, adquirir o caráter de “ponto de partida” primeiro e determinante? O que significa “fato”, nesse contexto, não é a facticidade dos fatos estranhos, dos quais pensamos ter dado conta à medida que aprendemos a explicá-los. Trata-se da factualidade das crenças, valorações, usos partilhados por todos nós; é o paradigma de tudo que constitui nosso sistema de vida. A palavra grega que designa o paradigma dessas factualidades é o conhecido termo ethos, o ser que se consegue com o exercício e o hábito. Aristóteles é o fundador da ética porque deu realce a esse caráter da factualidade como sendo decisivo. No caso de a possuirmos, a phronesis, essa racionalidade responsável, é a garantia de que esse ethos não é um mero adestramento ou adaptação e nada tem a ver com o conformismo de uma consciência duvidosa. Não é um dom natural. O partilhar uma crença e decisões comuns em intercâmbio com os semelhantes e em convivência na sociedade e no estado não é, pois, conformismo. Constitui a dignidade do [326] ser-próprio e da autocompreensão humanos. A pessoa que não é associai acolhe sempre o outro e aceita o intercâmbio com ele e a construção de um mundo comum de convenções. [Gadamer, VERDADE E MÉTODO II OUTROS 23].