Filosofia – Pensadores e Obras

demonstração

(gr. apodeixis; lat. demonstratio; in. Demonstration; fr. Demonstration; al. Demonstration; it. Dimostrazione).

Em sentido estrito (1), é o raciocínio de premissas verdadeiras e certas, mediante o qual um objeto, anteriormente discutível se torna conhecido não só como logicamente conexo com elas, mas como verdadeiro e certo. Em sentido mais amplo (2), recebe o nome de demonstração toda operação mental que, por um método diferente do raciocínio, apresenta como certo ou provável um enunciado ou objeto discutível. Verifica-se isto na passagem imediata de uma proposição a outra (exemplos: oposição, modalidade) ou quando se mostra a evidência imediata de uma proposição por meio da análise e comparação de conceitos. Toda demonstração é uma fundamentação, na medida em que por ela se indica a razão ou fundamento em que se apoia o assentimento do entendimento ao objeto. Só no caso de se dirigir a determinado adversário, é válido o argumentum ad hominem, que fundamenta um objeto partindo das pressuposições daquele. — Enquanto a demonstratio quia indica apenas a razão ou fundamento do conhecimento, a demonstratio propter quid dá também a conhecer a causa da coisa. Quanto às restantes classes de demonstração: (demonstração indireta, dedução, indução, a priori, a posteriori). — Incorre no sofisma chamado metabasis eis allo genos (“passagem para outro gênero”), quem, numa demonstração, passa de um domínio logicamente fechado a outro, p. ex., da ordem da possibilidade à ordem da realidade. — Santeler. [Brugger]


Na teoria platônica, a demonstração é essencialmente a definição, demonstra-se que uma coisa é o que é quando se torna patente que é essa coisa. Para Aristóteles, a demonstração equivale a mostrar que algo é necessário. Por este motivo, a demonstração é o processo por meio do qual se manifestam os princípios das coisas e, como processo, é superior à simples definição. O instrumento mais apropriado da demonstração é o silogismo baseado no saber, cujas premissas são verdadeiras e, além disso, imediatas. A teoria aristotélica da demonstração baseia-se, pois, numa busca das causas pelas quais uma coisa é o que é, e permite descobrir , além disso, que não é possível que a coisa seja diferente daquela que é. Por isso, o estudo da demonstração equivale à investigação sobre os princípios da ciência.

Os escolásticos aderiram em geral à tese segundo a qual a demonstração é uma argumentação mediante a qual se extrai uma conclusão de premissas certas. Portanto, a demonstração efetua-se também, como em Aristóteles, por meio do silogismo. Durante a época moderna, propuseram-se muitos tipos de demonstração. Podem classificar-se em dois grupos: o tipo empírico e o tipo racional. O primeiro efetua a demonstração pela passagem da observação do objeto singular à sua ideia mental, a qual representa o modo como a mente reflete a “apresentação” da coisa. O segundo tende a basear qualquer demonstração na relação princípio-consequência, reduzindo inclusive a ela a relação causa-efeito. [Ferrater]


O termo demonstração e seu conceito (gr. apodeixis, lat. demonstratio) foram introduzidos na Lógica por Aristóteles (Top., I, 100 a 27; An. post., I, 2 e passim) como silogismo que deduz uma conclusão de princípios primeiros e verdadeiros ou de outras proposições deduzidas silogisticamente de princípios primeiros e evidentes. Sua estrutura formal é a do silogismo; distingue-se, porém, do silogismo dialético porque, como dirão os lógicos medievais, facit scire, é demonstrativa da essência das coisas através do conhecimento das suas “causas”. Substancialmente é esse o conceito de demonstração que passou para a filosofia moderna. Mas, enquanto do ponto de vista gnosiológico se acentuaram os caracteres de necessidade e evidência intuitiva da demonstração (Descartes, Kant), do ponto de vista lógico evidenciou-se o caráter de dedução formal a partir de premissas (Descartes, Leibniz), o que distingue a demonstração (cujo tipo ou ideal continua sendo a demonstração matemática) de outros gêneros de prova. Na Lógica contemporânea, o termo demonstração não é muito usado: em geral designa uma sequência de enunciados tais que cada um deles é um enunciado primitivo ou então é diretamente derivável de um ou mais enunciados que o precedem na sequência (Carnap, Logical Syntax of Language, § 10). Durante muito tempo a demonstração foi considerada a própria essência da ciência. [Abbagnano]


A natureza da demonstração.

Na trilha de Aristóteles, a filosofia tradicional conservou duas definições da demonstração: a primeira por sua causa final; a segunda, que se liga à precedente, por sua causa material ou por seus elementos constitutivos.

Definição da causa final.

A demonstração é essencialmente um silogismo, e um silogismo que conduz à ciência.
Demonstratio est syllogismus faciens scire.

É, portanto, a noção de ciência ou de “saber” que comanda a própria noção de demonstração. Ora, a ciência é definida de maneira geral, por Aristóteles, como o conhecimento pelas causas.

Scire est cognoscere causam propter quam res est, quod hujus causa est, et nora potest aliter se habere.

Como essas são noções absolutamente essenciais ao aristotelismo, vamos voltar, com algumas precisões a mais, a estas definições da ciência e de seu instrumento próprio, o silogismo demonstrativo (cf. Aristóteles, II Anal., I, C. 2, 71 b 9. Com. de Tomás de Aquino, 1, 4, n. 2).

O termo ciência tomou entre os modernos um significado ao mesmo tempo mais geral e mais vago: poder-se-ia estendê-lo praticamente a todo o conhecimento metódico, organizado e dotado de um grau suficiente de certeza. Entre os antigos, scientia pode ter, às vezes, seu sentido ampliado, porém, em aristotelismo, deve-se restringi-lo, como já o dissemos, a um objeto muito mais limitado e preciso, o conhecimento pelas causas: “Estimamos possuir a ciência de uma coisa de uma maneira absoluta, e não à maneira dos Sofistas, que é uma maneira puramente acidental, quando estamos certos de que conhecemos a causa pela qual a coisa é, quando sabemos que essa causa é a causa dessa coisa, e que além disto;, não é possível que a coisa seja diferente do que ela é.

De acordo com este texto, o conhecimento científico supõe três condições: o conhecimento da causa; a percepção de sua relação com o efeito ou de sua aplicação a este; e, consequentemente, a necessidade da coisa que se acha causada e que não pode ser de outro modo senão como é.

Que é que se deve entender aqui exatamente pelo termo causa? Exatamente aquilo que, comumente, a gente pensa quando fala de causa! A causa é o que faz uma coisa existir, quod dat esse rei alterium, e isto acontece dentro das quatro linhas clássicas de causalidade. Se analisarmos o fato mais detidamente, observaremos que a causa designa, em primeiro lugar, um elemento ontológico objetivo: a causa é aquilo que faz ser. Considerada porém em sua relação com a inteligência, a causa passa a ter, igualmente, valor de razão explicativa. t; por isso que a causa intervém na demonstração: considera-se uma coisa demonstrada quando se percebe a razão de seu ser.

O caráter próprio desse conhecimento pela causa é o de poder-se chegar ao necessário. Segundo esta concepção, o contingente como tal, ou o mero provável, não figuram como objeto da ciência, que se vê muito restringido, por este fato. As ciências da natureza, em grande parte, também lhes escapam. Só resta, em seu conjunto, o domínio das matemáticas e, em um nível superior, o da metafísica.

Vê-se agora porque o silogismo é o processo lógico que mais exatamente se proporciona à ciência. A ciência é o conhecimento pela razão de ser; ora, fazer um silogismo não é outra coisa senão justificar, por um termo médio explicativo, a dependência de um predicado a um sujeito, quer dizer, explicar pela causa. A ciência aristotélica será essencialmente composta de silogismos que chegam a conclusões necessárias, seguindo um processo de causalidade ao mesmo tempo metafísico e lógico.

Definição pela causa material.

Os elementos de que uma coisa é constituída dependem de seu fim. Se uma casa é construída com tais materiais, é porque ela é destinada a nos abrigar das intempéries. A natureza dos elementos do silogismo demonstrativo acha-se do mesmo modo determinada por sua finalidade: chegar a conclusões científicas ou necessárias. Donde, a definição de Aristóteles que explicita as condições de tal silogismo:

Demonstratio est syllogismus constans ex veris, primis, immediatis, prioribus, notioribus, causisque conclusionis.

Sem entrar na explicação detalhada destas condições, que iremos reencontrar mais adiante digamos simplesmente que as três primeiras dentre elas, vens, primis, immediatis, se relacionam imediatamente com o caráter de verdade que deve ter o raciocínio demonstrativo, enquanto que as três últimas condições, prioribus, notioribus, causisque interessam à anterioridade das premissas sobre a conclusão.

Os elementos da demonstração.

O capítulo 1. dos II Analíticos é consagrado ao estudo do que é necessário conhecer antes da demonstração, de proecognitis, e frequentemente Aristóteles volta a esse assunto neste livro. Antes de precisar com ele a natureza desse pré-conhecimento, observemos três coisas.

Pode-se tratar de pré-conhecimento seja dos elementos necessários para que haja demonstração (e é do que se tratará aqui), seja do pré-conhecimento da conclusão (a conclusão é virtualmente conhecida nos princípios antes de o ser atualmente no termo da demonstração).

Há dois modos possíveis de pré-conhecimento, como aliás de todo conhecimento: o pré-conhecimento da natureza de uma coisa, quid sit, e o de sua existência an sit (quia est).

Como toda demonstração consiste em atribuir uma propriedade, passio propria, a um sujeito, subjectum, por meio de premissas representando o papel de princípios, principia, dever-se-á colocar a questão do pré-conhecimento relativamente a cada um desses elementos. Trataremos sucessivamente do pré-conhecimento do sujeito, da propriedade e dos princípios, depois relacionaremos com este último ponto tudo o que Aristóteles disse dos princípios, nos Segundos Analíticos (Cf. Texto IX B, p. 209). [Gardeil]