(lat. inceptio; in. Beginning; fr. Début; al. Anfang; it. Cominciamentó).
Propriamente, o início de uma coisa no tempo: que pode coincidir ou não com o princípio ou com a origem da própria coisa. Essa distinção é importante em alguns casos: p. ex., segundo Tomás de Aquino, a criação é matéria de fé enquanto começo do mundo no tempo, mas não enquanto produção do nada por parte de Deus (5. Th., I, q. 46, a. 2). Hegel afirmou que o começo da filosofia é relativo, no sentido de que o que aparece como começo é, de outro ponto de vista, resultado (Fil. do dir., § 2, Zusatz). De qualquer modo, segundo Hegel, o Absoluto encontra-se mais no resultado do que no começo porque este, “da forma como era expresso antes e agora, é apenas universal”, e o universal, nesse sentido, é só o abstrato que não pode valer como concretitude e totalidade; p. ex., as palavras “todos os animais”, que exprimem o universal de que trata a zoologia, não podem valer como toda a zoologia (Phänomen. des Geistes, Intr., II, 1). Apesar disso, a filosofia muitas vezes procurou o começo absoluto para fazê-lo coincidir com o seu próprio “princípio”, donde a procura do “primeiro princípio” do filosofar. [Abbagnano]
Dessas considerações decorre o que entendemos por origem do mundo, e qual o conceito que formamos da relação do homem com o polo inicial. O começo se propõe, portanto, como aurora de um sentimento do divino e do humano, como o desabrochar gradativo das anteposições axiológicas máximas, como o despertar de uma experiência inédita da vida. Esse começo, apesar de acontecer no tempo, retroage sobre o seu momento particular, alargando a perspectiva para um passado ainda mais remoto. Esse começo se apresenta como contendo em si um passado. Os deuses olímpicos gregos reportavam à linhagem teogônica das divindades ctônicas. O cristianismo acrescentou-se ao passado dos livros de Israel. A ideia da origem das coisas, assim compreendida, é um elemento essencial para a compreensão de [224] nossa realidade histórica é cultural. Nesse sentido, podemos dizer que o começo é o verdadeiro plasmador do homem histórico e que o mito é a paideia original da humanidade. Não podemos aceitar a tese platônica, hostil à fundação poética da educação e contra ele vemos em Homero o educador da Grécia.
Com o começo, entendido não como um ponto espaço-temporal, mas como um complexo de pressentimentos e de crenças, como nebulosa mítica, é proposto um destino. Ser-para-o-começo significa abraçar e identificar-se com os grandes modelos e exemplos de um dado círculo de possibilidades históricas. Não devemos pensar, entretanto, que num grupo histórico-cultural exista uma homogeneidade absoluta em relação às normas e valores gerais nele reinantes. Podemos descobrir, na evolução do pensamento grego, concorrentes orientalizantes que prenunciavam os futuros desenvolvimentos neoplatônicos. Nas épocas de maior unidade cultural, essas forças heterogêneas e discordantes parecem ter-se apagado diante da luminosidade das grandes ideias-força. São, entretanto, esses fermentos heréticos os pontos sensíveis a partir dos quais poder-se-ão desenvolver novas sementes culturais e históricas. [VFSTM:224-225]