Cassin2018
Diante dos deuses reunidos, Atena se queixa de que Odisseu, a quem ela protege, seja o único que ainda não retornou para casa. Ele, que deseja ver as fumaças de sua terra, chora à distância e chama pela morte.
Já faz sete anos que Calipso, “a que esconde”, “a que encobre”, o mantém longe de sua ilha e lhe dirige doces palavras de amor para que ele esqueça Ítaca. A ninfa é filha de Poseidon, o deus do Mar, a quem Odisseu ofendeu ao matar o Ciclope e que insiste em negar-lhe o dia do retorno. Mas justamente Poseidon está longe, entre os etíopes, e Atena propõe aproveitar a oportunidade. Zeus diz: “Decretemos seu retorno”, e envia Hermes até Calipso. A ninfa de belos cachos responde que obedecerá ao decreto irrevogável, mas protesta que os deuses invejosos “negam às deusas levar para seus leitos o mortal que seu coração escolheu como companheiro de vida” (V, 119s). O amor e a competição entre amores, a relação entre o novo e o antigo, a maneira como o novo se torna antigo e o impulso do hábito, em suma, o tempo como linha e como ciclo, são uma das chaves da nostalgia.
Eis a cena principal que descreve a saudade de casa. Calipso, obedecendo, vai até Odisseu:
“Quando o encontrou, ele estava no cabo, sempre sentado, os olhos ainda banhados em lágrimas, perdendo a doce vida ao chorar pelo retorno [kateibeto glukus aiôn]. Pois ele já não sentia prazer com a ninfa, à noite era obrigado a voltar para ela, no fundo de suas cavernas. […] Ele dirigia o olhar para o mar infrutífero e derramava lágrimas.” (V, 151-158)
A própria imagem da nostalgia, como em Caspar Friedrich: Odisseu, de costas, em seu promontório, olha para o mar e “faz derreter seu doce aiôn”, dissipando com o “fluxo” de suas “lágrimas” o “suco” e o “tempo” de sua “vida” (pois aiôn diz tudo isso junto).
Calipso, que o ama e vai ajudá-lo, adverte-o uma última vez:
“Mesmo assim, sê feliz. Mas se teu coração pudesse saber quantas dores o destino ainda reserva antes de tua chegada à terra natal, é aqui que desejarias ficar, guardando esta morada e sendo imortal.” (V, 205-210)
A nostalgia é o que faz preferir voltar para casa, mesmo que isso signifique encontrar o tempo que passa, a morte e, pior, a velhice, em vez da imortalidade. Esse é o peso do desejo de retorno, e Odisseu lhe responde:
“Deusa soberana, perdoa-me, por mais sábia que sejas, sei que Penélope, diante de ti, não tem grandeza nem beleza. Pois ela é mortal; tu, não conheces a morte nem a idade. Mas o que quero, o que desejo todos os dias, é voltar para casa e ver o dia do retorno.” (V, 215-220)
Kant afirmava que o nostálgico, incluindo o suíço, estava sempre desapontado porque não era o lugar de sua juventude que ele queria recuperar, mas a própria juventude — “desapontado” e, portanto, acrescentava ele, “curado de seu desejo”. Odisseu prova o contrário: é Penélope, com a idade que tem, que ele quer. Não a juventude eterna, mas o tempo que passa. É verdade, a nostalgia relaciona espaço e tempo. Mas ela escolhe a condição mortal e ancora essa condição em um lugar. O amor por outro lugar, o amor pelo distante, cede ao desejo do mesmo. Mais do que a beleza soberana de Calipso, mais do que a eternidade, a nostalgia escolhe a finitude e oikade, o lar. Voltar para casa é cair na sorte comum: envelhecer, morrer — “viver entre os seus o resto de seus dias”, como suspira Du Bellay. E quando Odisseu parte novamente, é ainda o retorno que o faz suspirar.