Antoine Faivre — MÍSTICA
A gnose desencadeia a mística, assim como em toda mística há sempre um pouco de gnose. A mística, mais noturna, cultivaria voluntariamente a renúncia; a gnose, mais solar, observaria o desapego e praticaria a estruturação — embora o místico encontre por vezes em seu próprio percurso as mesmas entidades intermediárias que aquelas do gnóstico. Mas enquanto o gnóstico busca a princípio o conhecimento iluminador e salvífico, o místico limita o número tanto quanto pode, e aspira antes de tudo se unir a seu Deus — uma união que, nas três religiões abraâmicas, mantém a separação ontológica entre o homem e Deus. Para o esoterismo assim compreendido se associam procedimentos ou rituais visando provocar a manifestação concreta de certas entidades, tal é a Teurgia.
A atitude esotérica, no sentido de “gnóstica”, logo é uma experiência mística na qual vêm participar a inteligência e a memória, que todas as duas se exprimem sob uma forma simbólica refletindo diversos níveis de realidade. A gnose, segundo uma nota do teósofo Valentim Tomberg, seria a expressão de uma forma de inteligência e de memória tendo efetuado uma passagem através de uma experiência mística. Um gnóstico seria portanto um místico capaz de comunicar a outro suas próprias experiências de uma maneira que retem a impressão das revelações recebidas passando através dos diferentes níveis do “espelho”. Um exemplo de proposição mística é: “Deus é amor”; ou bem: “Eu e meu Pai não fazemos senão um”. Um exemplo de proposição gnóstica no primeiro nível seria: “Deus é Trindade: Pai, Filho e Espírito Santo”; ou bem: “Há muitas moradas na casa de meu Pais”.