A individuação é singular
Hottois1993
Não se trata, como no esquema hilemórfico, de matéria amorfa que particulariza a forma ideal, sobrecarregando-a com imperfeições. A singularidade do processo de individuação vem do fato de que ele é o encontro ativo e complexo de sistemas de energia reais, mais ou menos estáveis, já tendo sua própria história de individuação (o modelo simples de fôrma e argila), e não a junção de uma matéria absolutamente aleatória e uma forma radicalmente pura. O que é singular, a cada vez, é o próprio processo de individuação, porque ele é eminentemente concreto. Isso explica as peculiaridades dos indivíduos, mas essas não são imperfeições a serem avaliadas em termos de um arquétipo ideal; elas são a marca de uma historicidade real que constitui a profundidade do processo de individuação. Dois tijolos feitos com a mesma fôrma e a mesma argila nunca são exatamente iguais, porque o processo de sua produção, considerado a partir do próprio coração do processo de individuação (essa dinâmica complexa e fina de interações entre tal e tal pedaço de argila, a fôrma e os gestos de trabalho, que Simondon analisa no primeiro capítulo de GSIG), nunca são absolutamente idênticos. O “verdadeiro princípio” é “a singularidade do hic et nunc da operação completa” — há “entre a forma e a matéria, uma zona de dimensão média e intermediária — a das singularidades que são o início do indivíduo na operação de individuação” (GSIG, p. 64).
O “lugar central” reservado para “a singularidade, desempenhando o papel de informação ativa” (GSIG, p. 65) é, obviamente, tanto mais importante quanto maior e mais complexa for a metaestabilidade, e quanto mais longo e aberto for o processo de individuação. As singularidades que distinguem os seres humanos são, portanto, maiores do que aquelas que distinguem os tijolos, e seu papel é infinitamente mais importante. No entanto, a singularidade e, portanto, a historicidade da individuação é sublinhada por G. Simondon tão cedo quanto os processos físicos (no caso dos tijolos). Simondon já nos processos físicos (notadamente a cristalização) ou técnicos. Portanto, mais uma vez, uma continuidade analógica é fornecida do cristal para a sociedade.
