Cavell1989
Tive a oportunidade de dar mais um passo crítico em outra tentativa com Emerson — um texto chamado “Emerson, Coleridge, Kant”, que trata principalmente do ensaio de Emerson intitulado “Fate”, no qual descobri a Crítica da razão pura invertida: noções de limitação e de condição são tão determinantes em “Fate” quanto o são em Kant, mas é como se tais termos fossem, eles próprios, submetidos à dedução transcendental, como se não só doze categorias mas toda e qualquer palavra em nossa linguagem precisasse da dedução, ou digamos, da derivação. As condições do conceito de condição farão, portanto, parte do que a própria palavra “con-dição” diz — estipulações ou termos sob os quais podemos dizer qualquer coisa que seja uns aos outros, os termos ou custos de cada um de nossos termos; como se a filosofia devesse [80] desenterrar todas as condições de nossa dicção. Sente-se em geral, acredito, que Emerson é um tanto irresponsável quanto a aparentes contradições em sua escrita; mas falo de um sentido em que a contradição, a contra-dicção, é a gênese de sua escrita filosófica. “Aversão” é uma das palavras típicas de Emerson para descrever este “contra”; é aproximadamente sua palavra para aquilo que os outros chamam conversão. “Ditame” é o dialeto emersoniano para aquilo contra o que ele está investindo; outra de suas palavras para isso é “conformismo”. Um desabafo que resume a gênese de sua escrita em “Self-reliance” é: “Cada palavra que eles dizem nos aflige.” A visão de cada palavra na nossa linguagem, na linguagem humana, como que requerendo atenção, como se a linguagem enquanto tal houvesse decaído, ou pudesse aspirar a um estado superior — um estado, digamos, em que o mundo se expressasse com mais perfeição é algo que, suponho, tem em si uma história complexa. Tal concepção em Emerson e em Thoreau é essencial para a visão de ambos de que o mundo em sua totalidade requer atenção, a bem dizer, redenção, que ele está decaído, morto; é, assim, essencial para aquilo que chamamos, neles, de romantismo.
A diferença entre Emerson e outros profetas ou sábios do século XIX (como Matthew Arnold, Schopenhauer, Kierkegaard) e sua afinidade com Austin e Wittgenstein (em contraste a outros filósofos analíticos cuja desconfiança da linguagem humana alia-se a uma visão em que o comum é substituído, não re-habitado) é seu reconhecimento do poder das palavras comuns — por assim dizer, da vocação que elas têm — de serem redimidas, de redimirem-se a si mesmas e, caracteristicamente, de pedir a redenção à (a partir da) filosofia. Emerson dirá, ou mostrará, que as palavras exigem uma conversão, ou transfiguração, ou um novo afeto; ao passo que Wittgenstein dirá que elas devem ser levadas para casa, como se estivessem no exílio.