Cioran: le destin, la Providence, le jeu de forces

Original

Aux époques où nous prenons conscience de la nullité de nos initiatives, nous assimilons le destin, soit à la Providence, déguisement rassurant de la fatalité, camouflage de l’échec, aveu d’impuissance à organiser le devenir, mais volonté d’en dégager les lignes essentielles et d’y déceler un sens, soit à un jeu de forces mécanique, impersonnel, dont l’automatisme règle nos actions et jusqu’à nos croyances. Cependant ce jeu, si impersonnel, si mécanique soit-il, nous l’investissons malgré nous de prestiges que sa définition même exclut, et le ramenons — conversion des concepts en agents universels — à une puissance morale, responsable des événements et de la tournure qu’ils doivent prendre. En plein positivisme, n’évoquait-on pas, en termes mystiques, /’avenir, auquel on prêtait une énergie d’une efficace guère moindre que celle de la Providence ? Tant il est vrai que se glisse dans nos explications un brin de théologie, inhérent, voire indispensable à notre pensée, pour peu qu’elle s’astreigne à donner une image cohérente du monde.

Attribuer au processus historique une signification, la fît-on surgir d’une logique immanente au devenir, c’est souscrire, plus ou moins explicitement, à une forme de providence. Bossuet, Hegel et Marx, du fait même qu’ils assignent aux événements un sens, appartiennent à une même famille, ou, du moins, ne diffèrent pas essentiellement les uns des autres, l’important n’étant pas de définir, de déterminer ce sens, mais d’y recourir, de le postuler ; et ils y recourent, ils le postulent. Passer d’une conception théologique ou métaphysique au matérialisme historique, c’est changer simplement de providentialisme. Si nous prenions l’habitude de regarder par-delà le contenu spécifique des idéologies et des doctrines, nous verrions que, se réclamer de telle d’entre elles plutôt que de telle autre, n’implique nullement quelque dépense de sagacité. Ceux qui adhèrent à un parti croient se distinguer de ceux qui en suivent un autre, alors que tous, dès l’instant qu’ils choisissent, se rejoignent en profondeur, participent d’une même nature et se différencient seulement en apparence, par le masque qu’ils assument. C’est folie d’imaginer que la vérité réside dans le choix, quand toute prise de position équivaut à un mépris de la vérité. Pour notre malheur, choix, prise de position est une fatalité à laquelle personne n’échappe ; chacun de nous doit opter pour une non-réalité, pour une erreur, en convaincus de force que nous sommes, en malades, en fiévreux: nos assentiments, nos adhésions sont autant de symptômes alarmants. Quiconque se confond avec quoi que ce soit fait preuve de dispositions morbides : point de salut ni de santé hors de l’être pur, aussi pur que le vide.


Thomaz Brum

Nas épocas em que tomamos consciência da nulidade de nossas iniciativas, assimilamos o destino ora à Providência, disfarce tranquilizador da fatalidade, camuflagem do fracasso, confissão de impotência para organizar o devir, mas vontade de resgatar suas linhas essenciais e lhes extrair um sentido, ora a um jogo de forças mecânico, impessoal, cujo automatismo regula as nossas ações e até as nossas crenças. No entanto, este jogo, por mais impessoal e mecânico que seja, nós o involuntariamente envolvemos com prestígios que a sua própria definição exclui, e o restringimos – conversão de conceitos em agentes universais – a uma potência moral responsável pelos acontecimentos e pelo curso que devem tomar. Em pleno positivismo não se evocava em termos místicos o futuro, a que se atribuía um poder de eficácia pouco menor que o da Providência? É portanto inegável que se infiltra em nossas explicações uma gota de teologia, inerente e mesmo indispensável ao nosso pensamento, ainda quando mal se comprometa a apresentar uma imagem coerente do mundo.

Atribuir ao processo histórico uma significação, fazê-la surgir de uma lógica imanente ao devir é admitir, mais ou menos explicitamente, uma forma de providência. Bossuet, Hegel e Marx, pelo próprio fato de atribuírem um sentido aos acontecimentos, pertencem a uma mesma família ou, pelo menos, não diferem essencialmente uns dos outros, já que o importante não é definir, determinar esse sentido, mas recorrer a ele, postulá-lo. E eles recorrem a ele, postulam-no. Passar de uma concepção teológica ou metafísica para o materialismo histórico é simplesmente mudar de providencialismo. Se adquiríssemos o hábito de olhar para além do conteúdo específico das ideologias e das doutrinas, veríamos que se prevalecer de alguma delas mais do que de outra não implica, em nenhuma hipótese, qualquer demonstração de sagacidade. Os que aderem a um partido pensam se distinguir dos que seguem outro, enquanto todos, desde o momento que escolhem, no fundo se assemelham, participam de uma mesma natureza e se distinguem apenas em aparência, pela máscara que assumem. É absurdo imaginar que a verdade consiste na opção, quando toda tomada de posição equivale a um desprezo pela verdade. Para nossa infelicidade, a escolha, a tomada de posição é uma fatalidade a que ninguém escapa. Cada um de nós deve optar por uma não realidade, por um erro, convencidos dele à força, como doentes, febris: nossos assentimentos, nossas adesões são como que sintomas alarmantes. Todo aquele que se confunde com o que quer que seja mostra disposições mórbidas: não existe salvação nem saúde fora do ser puro, tão puro quanto o vazio.


Richard Howard

In periods when we become aware of the nullity of our initiatives, we identify destiny either with Providence — a reassuring disguise for fatality, a camouflage of failure, an admission of our impotence to organize the future, yet a desire to discern its essential contours and determine their meaning — or with a mechanical, impersonal play of forces, the automatism of which controls our actions and even our beliefs. Yet we invest this play of forces, however impersonal and mechanical, with a glamour that its very definition forbids, and we relate it — a conversion of concepts into universal agents — to a moral power responsible for events and the turn they must take. At the height of positivism, did we not invoke, in mystical terms, a Future to which we attributed an energy scarcely less effective than that of Providence? Inveterately there slips into our explanations a wisp of theology, inherent in, even indispensable to, our thought insofar as it undertakes to provide a coherent image of the world.

To attribute a meaning to the historical process, even one derived from a logic immanent to the future, is to subscribe, more or less explicitly, to a form of Providence. Bossuet, Hegel, and Marx, by the very fact that they assign a meaning to events, belong to the same family or at least do not essentially differ from each other, the important thing being not to define or determine this meaning but to resort to it, to postulate it; and they resort to it, they postulate it. To turn from a theological or metaphysical conception to historical materialism is simply to change providentialisms. Were we in the habit of looking beyond the specific content of ideologies and doctrines, we should see that to claim kinship with one of them rather than some other does not at all imply much expenditure of sagacity. Those following one party imagine they differ from those following another, whereas all, once they choose, join each other underneath, participate in one and the same nature, and vary only in appearance, by the mask they assume. It is folly to imagine that truth resides in choice, when any adoption of a position is equivalent to a contempt for truth. To our misfortune, choice, position-taking, is a fatality no one escapes; each of us must opt for a nonreality, an error, obligatory fanatics that we are, sick men, fever victims: our assents, our adherences, are so many alarming symptoms. Whoever identifies himself with anything gives evidence of morbid dispositions: no salvation and no health outside of pure being — as pure as the Void.

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