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ciência

quinta-feira 25 de janeiro de 2024

  

Antecipemos de início a questão acerca do ἐπιστητόν (do que é sabido), ὑπολαμβάνομεν, ὃ ἐπιστάμεθα, μὴ ἐνδέχεσθαι ἄλλως ἔχειν (b20ss.). “Nós dizemos: o que sabemos não pode ser de outro modo”; ele precisa ser sempre desse modo. Aristóteles começa, portanto, com o modo como o ente é compreendido no sentido mais próprio possível do saber. No sentido do saber, temos o seguinte: ὅ ἐπιστάμεθα, “aquilo que nós sabemos”, do qual dizemos: ele é sempre assim. A ἐπιστήμη (ciência) remonta, com isso, a um tal ente que é sempre. Somente aquilo que é sempre pode ser sabido. Pois se aquilo que pode ser de outro modo, ἔξω τοῦ θεωρεῖν γένηται (b21ss.), “chega a se estabelecer fora do saber”, quando eu não estou agora atualmente junto a ele, ele pode entrementes se alterar. Eu mantenho, porém, a minha posição. Se ele se alterou agora, então minha visão se tornou falsa. Em contraposição a isso, o saber é distinto pelo fato de eu continuar sabendo sempre o ente que eu sei, mesmo ἔξω τοῦ θεωρεῖν, mesmo fora do visar direto respectivamente atual. Pois o ente que é objeto do saber é sempre. E isso significa ao mesmo tempo: saber é, portanto, um ter desencoberto; ele é conservação do ser desencoberto do sabido. Ele é um ser posto em relação com o ente do mundo, que dispõe do aspecto do ente. A ἐπιστήμη (ciência) é um ἕξις do ἀληθεύειν (um estado do desvelamento) (b31). Nessa ἕξις (postura), o aspecto do ente é resguardado. Esse ente que é assim sabido nunca pode ser velado; no velamento, ele nunca pode, por fim, se tornar outro, de modo que o saber, então, não seria mais saber algum. Por isso, esse ente pode: γενέσθαι ἔξω τοῦ θεωρεῖν, sair do visar direto respectivamente atual; e ele é de qualquer modo sabido. O saber, portanto, não precisa ser realizado constantemente; eu não preciso visar constantemente de maneira direta ao ente sabido. Ao contrário, o saber é um estar-junto-ao-ente, um dispor-dele-com-vistas-ao-seu-ter-sido-desencoberto [33], ainda que eu não me encontre diante dele. Como o ente é sempre, meu conhecimento é seguro para mim. Não preciso retornar sempre a ele. Do ente, portanto, que pode ser de outra forma, eu não tenho saber algum – razão pela qual também se diz que o elemento histórico não pode ser propriamente sabido. Esse modo do ἀληθεύειν (desvelamento) da ἐπιστήμη (ciência) é um modo totalmente determinado, para os gregos naturalmente aquele modo que funda a possibilidade da ciência. E por esse conceito de saber que se acha orientado todo o desenvolvimento ulterior e hoje ainda a teoria da ciência.

Esse conceito de ciência não é deduzido, mas obtido a partir do fenômeno pleno do saber. Nisso reside justamente o fato de o saber ser uma preservação do ter sido descoberto do ente, que é totalmente independente dele e que, contudo, dispõe dele. Aquilo que é passível de ser sabido, porém, de que eu disponho, precisa ser necessariamente do modo como ele é; ele precisa ser sempre assim; ele é o ente que é sempre assim, o que não veio a ser, aquilo que nunca não foi e nunca deixará de ser; ele é constantemente assim; ele é o ente propriamente dito. [Heidegger  , GA19:32-33]


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