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Ortega (HG) – PRÓLOGO

sexta-feira 5 de novembro de 2021

  

português

Comecei por afirmar que boa parte das angústias históricas atuais procede da falta de clareza sobre problemas que somente a sociologia pode esclarecer, e que essa falta de clareza na consciência do homem médio se origina, por sua vez, no estado deplorável da teoria sociológica. A insuficiência da doutrina sociológica que hoje está à disposição de quem procure, de boa fé, orientar-se sobre o que é a política, o Estado, o direito, a coletividade e sua relação com o indivíduo, a revolução, a guerra, a justiça, etc., — a saber: as coisas de que mais se fala desde quarenta anos atrás, — estriba-se em que os próprios sociólogos ainda não analisaram suficientemente a sério, radicalmente, isto é, indo à raiz, os fenômenos sociais elementares. Vem daí que todo esse repertório de conceitos seja impreciso e contraditório.

Torna-se urgente esclarecer deveras o que é sociedade, sem [43] o que nenhuma das noções citadas pode possuir clara substância. Não é possível, porém, obter uma visão luminosa, evidente, do que seja sociedade se, previamente, não estamos esclarecidos sobre os seus sintomas, sobre quais são os fatos sociais em que a sociedade se manifesta e em que consiste. Daí a necessidade forçosa de precisar o caráter geral do social.

Mas não foi dito que o social seja uma realidade peculiar. Poderia acontecer que fosse só uma combinação ou resultado de outras realidades, como os corpos não são "em realidade" mais do que combinações de moléculas e estas, de átomos. Se, como se tem acreditado quase sempre, — e com consequências praticamente mais graves no século XVIII, — a sociedade é somente uma criação dos indivíduos que, em virtude de uma vontade deliberada "se reúnem em sociedade"; portanto, se a sociedade não é mais do que uma "associação", a sociedade não tem própria e autêntica realidade e não faz falta uma sociologia. Bastará estudar o indivíduo.

Ora, a questão de ser uma coisa, ou não, própria e ultimamente, realidade, só se pode resolver com os meios radicais da análise e da técnica filosóficas.

Trata-se, pois, de investigar se, no repertório das realidades autênticas, — isto é, de tudo quanto já não é redutível a alguma outra realidade, — existe algo que corresponda a isso que vagamente denominamos "fatos sociais".

Para tanto, temos de partir da realidade fundamental, em que todas as demais, de um modo ou de outro, têm de aparecer. Essa realidade fundamental é nossa vida, a de cada um, e é cada um que tem de analisar se, no âmbito que constitui a sua vida, aparece o social como alguma coisa diferente de tudo mais e irredutível a tudo mais.


O SOCIAL

Na área de nossa vida, — prescindindo do problema transcendente que é Deus, — achamos minerais, vegetais, animais e os outros homens, realidades irredutíveis entre si e, portanto, autênticas. O social aparece-nos adstrito somente aos homens. Fala-se [44] também de sociedades animais, — a colmeia, o formigueiro, o termitário, o rebanho; — sem entrar, porém, em mais considerações, basta a de que o homem, como realidade, não foi reduzido à realidade animal, para que não possamos, por enquanto, ao menos, considerar como sinônima a palavra sociedade, quando falamos de "sociedade humana" e de "sociedade animal". Portanto:

1.° — O social consiste em ações ou comportamentos humanos, — é um fato da vida humana. Mas a vida humana é sempre a de cada um, é a vida individual ou pessoal e consiste em que o EU que cada qual é se encontre tendo de existir em uma circunstância, — o que costumamos chamar mundo, — sem segurança de existir no instante imediato, tendo sempre de estar fazendo algo, — material ou mentalmente, — para assegurar essa existência. O conjunto desses afazeres, ações ou comportamentos, é a nossa vida. Só é, pois, humano, no sentido estrito e primário, o que faço por mim mesmo e em vista de meus próprios fins ou, o que é a mesma coisa, o fato humano é um fato sempre pessoal. Isto quer dizer:

a) — Que é só propriamente humano em mim o que penso, quero, sinto e executo com meu corpo, sendo eu o "sujeito criador disso", ou o que a mim mesmo, como tal eu-mesmo, acontece.

b) — Portanto, somente é humano o meu pensar, se penso alguma coisa por minha própria conta, advertindo-me do que significa. SOMENTE É HUMANO AQUILO QUE, AO FAZER, O FAÇO PORQUE TEM PARA MIM UM SENTIDO, A SABER, AQUILO QUE ENTENDO.

c) — Em toda ação humana existe, pois, um SUJEITO do qual ela emana e que, por isso mesmo, é RESPONSÁVEL por ela.

d) — Consequência do anteriormente exposto é que a minha vida humana, que me põe em relação direta com quanto me rodeia, — minerais, vegetais, animais, os outros homens, — é, por essência, solidão. Minha dor de dentes só a mim pode [45] doer. O pensamento que de verdade penso, — e não somente repito mecanicamente por tê-lo ouvido, — tenho de o pensar eu "sozinho" ou eu em minha solidão.

Mas o fato social não é um comportamento de nossa vida humana como solidão; ao contrário, aparece enquanto estamos em relação com os outros homens. Não é, pois, vida humana no sentido estrito e primário.

2.° — O social é um fato, não da vida humana, mas algo que surge na convivência humana. Por convivência, entendemos a relação ou trato entre duas vidas individuais. O que chamamos pai e filhos, amantes, amigos, por exemplo, são formas de convívio. Nessa convivência sempre se trata de que um indivíduo, como tal, — portanto, um sujeito criador e responsável por suas ações, que faz o que faz porque para ele isso tem sentido e ele o compreende, — atua sobre outro indivíduo que tem as mesmas características. O pai, como indivíduo determinado que é, dirige-se a seu filho, que é outro indivíduo determinado e único também. Os fatos de convivência não são, portanto, por si mesmos, fatos sociais. Formam o que deveria chamar-se "companhia ou comunicação", — "um mundo de relações inter-individuais".

Analise-se, porém, toda outra série de fatos humanos, como o cumprimento, como a ação do guarda que nos impede, em certo momento, de atravessar a rua. Neles, a ação, — dar a mão, o ato de o guarda impedir o nosso passo, — não o faz o homem porque lhe haja ocorrido, nem espontaneamente, isto é, sendo ele o responsável pela ação; tampouco é dirigida a outro homem por ser ele tal indivíduo determinado. O homem faz Isso sem sua original vontade e amiúde contra a sua vontade. Além disso, — no caso do cumprimento, está bem claro, — o que fazemos, dar a mão, não o entendemos, não sabemos porque é isso e não outra coisa o que temos de fazer, quando encontramos um conhecido. Essas ações não têm, pois, sua origem em [46] nós: somos meros executores delas, como o gramofone canta o seu disco, como o autômato pratica seus movimentos mecânicos.

Quem é o sujeito originário, do qual essas ações provêm? Por que as fazemos, já que não as fazemos, nem por nossa invenção, nem com a nossa espontânea vontade? Damos a mão ao encontrar um conhecido porque isso é o que "se faz". O guarda detém nosso passo, não porque isso lhe tenha ocorrido, nem por sua conta, mas porque assim "é mandado". Quem é, porém, o sujeito originário e responsável por aquilo que se faz? A gente, os demais, "todos", a coletividade, a sociedade, — isto é: "ninguém determinado".

Eis aqui, pois, ações que são, por um lado, humanas, já que consistem em comportamentos intelectuais ou de conduta especificamente humanos e que, por outro lado, nem se originam na pessoa ou indivíduo, nem este os quer, nem é responsável por eles e com frequência nem sequer os entende.

Aquelas nossas ações que têm essas características negativas e que executamos por conta de um sujeito impessoal, indeterminável, que são "todos" e "ninguém", e que denominamos a gente, a coletividade, a sociedade, são os fatos propriamente sociais, irredutíveis à vida humana individual. Esses fatos aparecem no âmbito da convivência, porém não são fatos de pura convivência.

O que pensamos ou dizemos porque "se" diz; o que fazemos porque "se" faz costuma chamar-se uso.


O FATO SOCIAL

Os usos são formas de comportamento humano que o indivíduo adota e cumpre porque, de um modo ou de outro, em uma ou em outra medida, não tem mais remédio. São-lhe impostos pelo seu contorno de convivência: pelos "demais", pela "gente", pela. . . sociedade. [47]

Para a doutrina sociológica que vai ser exposta nestas lições, basta que certos usos, se se querem os casos extremos do uso, se caracterizem por estes traços:

1. ° — São ações que executamos em virtude de uma pressão social. Esta pressão consiste na antecipação, por nossa parte, das represálias "morais" ou físicas que nosso contorno vai exercer contra nós, se não nos comportarmos assim. Os usos são imposições mecânicas.

2. ° — São ações cujo conteúdo preciso, a saber, o que fazemos nelas, é, para nós, ininteligível. Os usos são irracionais.

3. ° — Encontramo-los como formas de conduta, que são ao mesmo tempo pressões, fora de nossa pessoa e de toda outra pessoa, porque atuam tanto sobre o próximo como sobre nós. Os usos são realidades extra-individuais ou impessoais.

Durkheim, por volta de 1890, entreviu os traços 1.° e 3.° como constitutivos do fato social, mas não conseguiu acabar de vê-los bem, nem começou sequer a pensá-los. Basta dizer que não só não viu o traço 2.°, como acreditou tudo ao contrário, a saber: que o fato social era o verdadeiramente racional, porque emanava de uma suposta e mística "consciência social" ou "alma coletiva". Além disso, não advertiu que consiste em usos, nem o que é o uso. Ora, a irracionalidade é a nota decisiva. Quando se entende bem, entende-se que as outras duas características, — ser pressão sobre o indivíduo e ser exterior a este, ou extra-individuais, — quase que só coincidem no vocábulo com aquilo que Durkheim percebeu. De qualquer modo, seja dito em sua homenagem, foi ele quem esteve mais perto de uma intuição certa do fato social.

Ao seguir os usos, comportamo-nos como autômatos, vivemos por conta da sociedade ou coletividade. Esta, no entanto, não é algo humano ou sobre-humano; ao contrário: atua exclusivamente mediante o simples e puro mecanismo dos usos, dos quais [48] ninguém é sujeito criador, responsável e consciente. E, como a "vida social ou coletiva" consiste nos usos, essa vida não é humana, é algo intermédio entre a natureza e o homem, é uma quase-natureza e, como a natureza: irracional, mecânica e brutal. Não há uma "alma coletiva". A sociedade, a coletividade é a grande desalmada, — já que é o humano naturalizado, mecanizado e como que mineralizado. Por isso está justificado que a sociedade se chame "mundo" social. Não é, com efeito, tanto "humanidade" como "elemento inumano" em que a pessoa se encontra.

Não obstante, a sociedade, ao ser mecanismo, é uma formidável máquina de fazer homens.

Os usos produzem no indivíduo estas três principais categorias de efeitos:

I — São pautas do comportamento que nos permitem prever a conduta dos indivíduos que não conhecemos e que, portanto, não são, para nós, tais determinados indivíduos. A relação inter-individual somente é possível com o indivíduo ao qual individualmente conhecemos, isto é, com o próximo de nós. Os usos nos permitem a quase-convivência com o desconhecido, com o estranho.

II — Ao impor, por pressão, um determinado repertório de ações, — de ideias, de normas, de técnicas, — obrigam o indivíduo a viver à altura dos tempos e injetam nele, queira ou não queira, a herança acumulada no passado. Graças à sociedade, o homem é progresso e história. A sociedade entesoura o passado.

III — Ao automatizarem uma grande parte da conduta da pessoa e dar-lhe resolvido o programa de quase tudo que tem de fazer, permitem que essa pessoa concentre sua vida individual, criadora e verdadeiramente humana, em certas direções, o que de outro modo seria impossível ao indivíduo. A sociedade situa o homem em certa liberdade diante do porvir e lhe permite criar o novo, racional e mais perfeito.

Original

AL reanudar ahora las «Lecciones sobre el hombre y la gente», dadas la primavera pasada, se hace imprescindible tener claro y presente lo que en aquéllas se logró. A fin de descargar las cuatro lecciones que el ciclo de este año comporta, del resumen inevitable en que los conceptos obtenidos y aclarados en la serie anterior renovasen su presencia en la mente de los que van a escucharme y poder desde luego proceder a nuevos temas de mi doctrina sociológica, he creído que fuera bueno concentrar en estas páginas lo más inexcusable.

Partí de afirmar que buena parte de las angustias históricas actuales procede de la falta de claridad sobre problemas que sólo la sociología puede aclarar, y que esta falta de claridad en la conciencia del hombre medio se origina, a su vez, en el estado deplorable de la teoría sociológica. La insuficiencia del doctrinal sociológico que hoy está a disposición de quien busque, con buena fe, orientarse sobre lo que es la política, el Estado, el derecho, la colectividad y su relación con el individuo, la nación, la revolución, la guerra, la justicia, etc. —es decir, las cosas de que más se habla desde hace cuarenta años—, estriba en que los sociólogos mismos no han analizado suficientemente en serio, radicalmente, esto es, yendo a la raíz, los fenómenos sociales elementales. De aquí que todo ese repertorio de conceptos sea impreciso y contradictorio.

Se hace urgente poner, de verdad, en claro lo que es sociedad, sin lo cual ninguna de las nociones antedichas puede poseer clara sustancia. Pero no es posible obtener una visión luminosa, evidente de lo que es sociedad si previamente no se está en claro sobre sus síntomas, sobre cuáles son los hechos sociales en que la sociedad se manifiesta y en que consiste. De aquí la forzosidad de precisar el carácter general de lo social.

Pero no está dicho que lo social sea una realidad peculiar. Podría acaecer que fuese sólo una combinación o resultado de otras realidades, como los cuerpos no son «en realidad» más que combinaciones de moléculas y éstas de átomos. Si, como se ha creído casi siempre —y con consecuencias prácticamente más graves en el siglo XVIII—, la sociedad es sólo una creación de los individuos que, en virtud de una voluntad deliberada, «se reúnen en sociedad»; por lo tanto, si la sociedad no es más que una «asociación», la sociedad no tiene propia y auténtica realidad y no hace falta una sociología. Bastará con estudiar al individuo.

Ahora bien, la cuestión de si algo es o no, propia y últimamente, realidad sólo puede resolverse con los medios radicales del análisis   y la técnica filosóficos.

Se trata, pues, de averiguar si en el repertorio de las realidades auténticas —esto es, de cuanto no es ya reductible a alguna otra realidad— hay algo que corresponda a eso que vagamente llamamos «hechos sociales».

Para eso tenemos que partir de la realidad fundamental en que todas las demás, de uno u otro modo, tienen que aparecer. Esa realidad fundamental es nuestra vida, la de cada cual, y es cada cual quien tiene que analizar si en el ámbito que constituye su vida aparece lo social como algo distinto de e irreductible a todo lo demás.

En el área de nuestra vida —prescindiendo del problema trascendente que es Dios— hallamos minerales, vegetales, animales y los otros hombres, realidades irreductibles entre sí y, por tanto, auténticas. Lo social nos aparece adscrito sólo a los hombres. Se habla también de sociedades animales —la colmena, el hormiguero, la termitera, el rebaño—, pero sin entrar en más consideraciones, basta la de que el hombre, como realidad, no ha podido ser reducido a la realidad animal para que no podamos, por lo pronto al menos, considerar como sinónima la palabra sociedad cuando hablamos de «sociedad humana» y de «sociedad animal». Por tanto:

1.º Lo social consiste en acciones o comportamientos humanos— es un hecho de la vida humana. Pero la vida humana es siempre la de cada cual, es la vida individual o personal y consiste en que el yo que cada cual es se encuentra teniendo que existir en una circunstancia —lo que solemos llamar mundo— sin seguridad de existir en el instante inmediato, teniendo siempre que estar haciendo algo —material o mentalmente— para asegurar esa existencia. El conjunto de esos haceres, acciones o comportamientos es nuestra vida. Sólo es, pues, humano en sentido estricto y primario lo que hago yo por mí mismo y en vista de mis propios fines, o lo que es igual, que el hecho humano es un hecho siempre personal. Esto quiere decir:

a) que sólo es propiamente humano en mí lo que pienso, quiero, siento y ejecuto con mi cuerpo, siendo yo el sujeto creador de ello o lo que a mí mismo, como tal mí mismo, le pasa;

b) por tanto, sólo es humano mi pensar si pienso algo por mi propia cuenta, percatándome de lo que significa. Sólo es humano lo que al hacerlo lo hago porque tiene para mí un sentido, es decir, lo que entiendo;

c) en toda acción humana hay, pues, un sujeto de quien emana y que, por lo mismo, es responsable de ella;

d) consecuencia de lo anterior es que mi humana vida que me pone en relación directa con cuanto me rodea —minerales, vegetales, animales, los otros hombres—, es, por esencia, soledad. Mi dolor de muelas sólo a mí me puede doler. El pensamiento que de verdad pienso —y no sólo repito mecánicamente por haberlo oído— tengo que pensármelo yo solo o yo en mi soledad.

Mas el hecho social no es un comportamiento de nuestra vida humana como soledad, sino que aparece en tanto en cuanto estamos en relación con otros hombres. No es, pues, vida humana en sentido estricto y primario; es

2.º lo social un hecho, no de la vida humana, sino algo que surge en la humana convivencia. Por convivencia entendemos la relación o trato entre dos vidas individuales. Lo que llamamos padres e hijos, amantes, amigos, por ejemplo, son formas del convivir. En ella se trata siempre de que un individuo, como tal —por tanto, un sujeto creador y responsable de sus acciones, que hace lo que hace porque tiene para él sentido y lo entiende—, actúa sobre otro individuo que tiene los mismos caracteres. El padre, como individuo determinado que es, se dirige a su hijo, que es otro individuo determinado y único también. Los hechos de convivencia no son, pues, por sí mismos hechos sociales. Forman lo que debiera llamarse «compañía o comunicación» —un mundo de relaciones interindividuales.

Pero analícese toda otra serie de hechos humanos, como el saludo, como la acción del vigilante que nos impide en cierto momento atravesar la calle. En ellos, la acción —dar la mano, el acto de cortar nuestro paso el vigilante— no la hace el hombre porque se le haya ocurrido a él, ni espontáneamente, es decir, siendo él responsable de ella; ni va dirigida a otro, hombre por ser tal individuo determinado. Hace el hombre eso sin su original voluntad y a menudo contra su voluntad. Además —en el caso del saludo está bien claro—, lo que hacemos, dar la mano, no lo entendemos, no tiene sentido para nosotros, no sabemos por qué es eso y no otra cosa lo que hay que hacer cuando encontramos un conocido. Estas acciones no tienen, pues, su origen   en nosotros: somos de ellas meros ejecutores, como el gramófono canta su disco, como el autómata practica sus movimientos mecánicos.

¿Quién es el sujeto originario de quien esas acciones provienen? ¿Por qué las hacemos, ya que no las hacemos ni por nuestra invención ni con nuestra espontánea voluntad? Damos la mano al encontrar a un conocido porque eso es lo que se hace. El vigilante detiene nuestro paso, no porque a él se le haya ocurrido ni por cuenta suya, sino porque está mandado así. Pero ¿quién es el sujeto originario y responsable de lo que se hace? La gente, los demás, «todos», la colectividad, la sociedad— es decir: nadie determinado.

He aquí, pues, acciones que son por un lado humanas, pues consisten en comportamientos intelectuales o de conducta específicamente humanos, y que, por otro lado, ni se originan en la persona o individuo ni éste los quiere ni es responsable de ellos y con frecuencia ni siquiera los entiende.

Aquellas acciones nuestras que tienen estos caracteres negativos y que ejecutamos a cuenta de un sujeto impersonal, indeterminable, que es «todos» y es «nadie», y que llamamos la gente, la colectividad, la sociedad, son los hechos propiamente sociales, irreductibles a la vida humana individual. Esos hechos aparecen en el ámbito de la convivencia, pero no son hechos de simple convivencia.

Lo que pensamos o decimos porque se dice; lo que hacemos porque se hace, suele llamarse uso.

Los hechos sociales constitutivos son usos.

Los usos son formas de comportamiento humano que el individuo adopta y cumple porque, de una manera u otra, en una u otra medida, no tiene remedio. Le son impuestos por su contorno de convivencia: por los «demás», por la «gente», por… la sociedad.

Para la doctrina sociológica que se va a exponer en estas lecciones basta con que ciertos usos, si se quiere los casos extremos del uso, se caractericen por estos rasgos:

1.º Son acciones que ejecutamos en virtud de una presión social. Esta presión consiste en la anticipación, por nuestra parte, de las represalias «morales» o físicas que nuestro contorno va a ejercer contra nosotros si no nos comportamos así. Los usos son imposiciones mecánicas.

2.º Son acciones cuyo preciso contenido, esto es, lo que en ellas hacemos, nos es ininteligible. Los usos son irracionales.

3.º Los encontramos como formas de conducta, que son a la vez presiones, fuera de nuestra persona y de toda otra persona, porque actúan sobre el prójimo lo mismo que sobre nosotros. Los usos son realidades extraindividuales o impersonales.

Durkheim, hacia 1890, entrevió los rasgos 1.º y 3.º como constitutivos del hecho social, pero ni logró acabar de verlos bien ni empezó siquiera a pensarlos. Baste decir que no sólo no vio el rasgo 2.º, sino que creyó todo lo contrario, a saber: que el hecho social era el verdaderamente racional, porque emanaba de una supuesta y mística «conciencia social» o «alma colectiva». Además, no advirtió que consiste en usos ni lo que es el uso. Ahora bien, la irracionalidad es la nota decisiva. Cuando se la ha entendido bien se cae en la cuenta de que los otros dos caracteres —ser presión sobre el individuo y ser exterior a éste o extraindividuales— casi sólo coinciden en el vocablo con lo que Durkheim percibió. De todas suertes, sea dicho en su homenaje, fue él quien más cerca ha estado de una intuición certera del hecho social.

Al seguir los usos nos comportamos como autómatas, vivimos a cuenta de la sociedad o colectividad. Pero ésta no es algo humano ni sobrehumano, sino que actúa exclusivamente mediante el puro mecanismo de los usos, de los cuales nadie es sujeto creador responsable y consciente. Y como la «vida social o colectiva» consiste en los usos, esa vida no es humana, es algo intermedio entre la naturaleza y el hombre, es una casi-naturaleza, y, como la naturaleza, irracional, mecánica y brutal. No hay un «alma colectiva». La sociedad, la colectividad es la gran desalmada —ya que es lo humano naturalizado, mecanizado y como mineralizado. Por eso está justificado que a la sociedad se la llame «mundo» social. No es, en efecto, tanto «humanidad» como «elemento inhumano» en que la persona se encuentra.

La sociedad, sin embargo, al ser mecanismo, es una formidable máquina de hacer hombres.

Los usos producen en el individuo estas tres principales categorías de efectos:

1.º Son pautas del comportamiento que nos permiten prever la conducta de los individuos que no conocemos y que, por tanto, no son para nosotros tales determinados individuos. La relación interindividual sólo es posible con el individuo a quien individualmente conocemos, esto es, con el prójimo ( = próximo). Los usos nos permiten la casi-convivencia con el desconocido, con el extraño.

2.º Al imponer a presión un cierto repertorio de acciones —de ideas, de normas, de técnicas— obligan al individuo a vivir a la altura de los tiempos e inyectan en él, quiera o no, la herencia acumulada en el pasado. Gracias a la sociedad el hombre es progreso e historia. La sociedad atesora el pasado.

3.º Al automatizar una gran parte de la conducta de la persona y darle resuelto el programa de casi todo lo que tiene que hacer, permiten a aquélla que concentre su vida personal, creadora y verdaderamente humana en ciertas direcciones, lo que de otro modo sería al individuo imposible. La sociedad sitúa al hombre en cierta franquía frente al porvenir y le permite crear lo nuevo, racional y más perfecto.