O espírito fluvial do rio através do leito das coisas. Entretanto, parece que não é o rio que flui nas coisas, mas as coisas que fluem no rio, heracliteanamente. Na urdidura líquida das águas aparecem estranhas figuras e desenhos bizarros que não detêm o seu fluir, mas que deslizam no tempo desse Tempo. Esse rio corre porque só pode correr. O poder-correr de seu correr é uma lei secreta que “ama ocultar-se”. Quem deflagrou esse rio em seu correr? Quem pôs as coisas a correr ou pôs o correr (…)
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Ferreira da Silva, Vicente
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Ferreira da Silva (2010:609-612) – Diálogo do Rio
8 de julho -
Ferreira da Silva (2009:51-53) – Diagnosis
12 de fevereiroA ciência sempre se revestiu de uma serena atmosfera de insenção e de imparcialidade relativamente ao objeto de seu estudo. Dizia ela não pretender mais do que auscultar a linguagem forte e sincera das coisas, captando a sua confissão mais íntima. Apesar dessas demonstrações de equilíbrio e de objetividade, há muito tempo que a reflexão filosófica sobre os fundamentos da ciência revelou quão falsa é essa sua pretensão e quanto de imposição, escolha e elaboração existe no método da ciência. A (…)
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Ferreira da Silva (2009:45-47) – hábitos sociais
13 de janeiroNesse capítulo dos hábitos, devemos incluir o que em sentido lato poderíamos dominar “hábitos sociais”, conjunto de formas consuetudinárias de comportamento e compreensão humanas.
Em grande medida recebemos a vida feita, pois o nosso eu social é um princípio anônimo e objetivo, uma estrutura que independe de nós e que vestimos para nos enquadrar num dado grupo. Apreciamos o mundo não através de nossos próprios sentidos e de uma lógica individual, mas sim através de uma ótica do rebanho. (…) -
Ferreira da Silva (2009:43-45) – hábitos
13 de janeiro, por Cardoso de CastroDe muitas formas pode o homem dissimular diante de si mesmo o sentido de sua existência, negligenciando o tema profundo de sua vida e rompendo todas as suas ligações com o real. Há formas mais espasmódicas e espantosas como o demoníaco, mas a doença pode invadir a alma de maneira mais sutil e insidiosa, produzindo seu mal, sem que nos apercebamos disso. É o caso, por exemplo, da invasão do hábito e do automatismo em nossa existência. “Há algo pior do que possuir uma alma perversa — diz Péguy (…)
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Ferreira da Silva (2009:27-30) – a ideia
26 de junho de 2023Encontramos aqui uma verdadeira doutrina da liberdade e da libertação para a alma oprimida do homem. É a doutrina das Ideias que desempenha essa função desopressiva e arejante, comovendo as muralhas da finitude e dilatando o espaço de nosso exercício espiritual. Essas Ideias, historicamente tão famosas, não devem ser compreendidas como noções abstraídas das realidades sensíveis, da maneira pela qual entendemos comumente as nossas noções e conceitos, pois dessa forma não seriam “originais”, (…)
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Ferreira da Silva: O Andróptero
24 de março de 2022FERREIRA DA SILVA, Vicente. Dialética das Consciências. São Paulo: É Realizações, 2009, p. 25-30.
Qual seria nossa surpresa se encontrássemos, ao abrir uma obra de filosofia, um capítulo dedicado não às formas puras, mas às formas ctônicas da Geografia! É certo que não acharíamos, de golpe, senso algum nessa aproximação, pois que concordâncias estabelecer entre as descrições objetivas e isentas da Geografia e o vulcanismo da alma, entre os cenários milenares dos rios e montanhas e o (…) -
Ferreira da Silva: mito
24 de março de 2022Excerto de Excerto de FERREIRA DA SILVA, Vicente. Transcendência do Mundo. São Paulo: É Realizações, 2010, p. 105-106
A mitologia é a abertura de um regime de fascinação. Ela não pode ser compreendida, como querem muitos, a modo de qualquer criação imaginativa ex homo, ou como qualquer projeção psicológica da mente inconsciente da humanidade. Todo o complexo humano, consciente ou inconsciente, é descerrado simultaneamente com o descerrar-se da totalidade do ente, a partir das potências (…) -
Ferreira da Silva (2010:227-230) — apocalipse
6 de fevereiro de 2022Podemos traçar certas analogias entre essa estrutura da tragédia e a que se refere ao desenvolvimento histórico de um povo que se encaminha para o seu fim. Os fenômenos apocalípticos do fim de uma cultura são precedidos por uma metábase e pelo reconhecimento da existência de forças bárbaras e destruidoras no seio do corpo cultural. A criação dos regimes de massas, com suas formas próprias de atuação e pensamento, constitui um sinal do niilismo invasor. A existência, dentro de uma (…)
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Ferreira da Silva (2010:76-78) — imaginação
7 de janeiro de 2022Em todos os campos das formações culturais, assistimos a essa transfiguração do simplesmente dado a uma livre transformação do material encontrado. Não só, entretanto, nas produções objetivas da cultura deparamos com esse trabalho da fantasia, mas, no mesmo grau, vislumbramos esse poder na vida psicossomática. O nosso corpo, enquanto aparato expressivo fisionômico, o que é senão o teatro de uma contínua atividade imaginativa?
As mãos e o rosto oferecem a esse respeito oportunidades para (…) -
Ferreira da Silva (2010:179-181) – linguagem
14 de dezembro de 2021Hegel denomina “subjetividade concreta” esse universo omnicompreensivo projetado pela linguagem, esse mundo da linguagem, dentro do qual existimos e somos. A linguagem é uma “exteriorização da inteligência” na qual ela se põe dentro de si mesma; em outras palavras, só podemos ter acesso pensante ao que somos e à nossa própria inteligência, usando os meios discursivos da linguagem que é por sua vez uma exteriorização da inteligência. A linguagem, para o nosso filósofo, enquanto pôr-se em obra (…)