Página inicial > Modernidade > Bioética > Beauchamp: Respeito pela Autonomia

Beauchamp: Respeito pela Autonomia

sábado 15 de julho de 2017, por Cardoso de Castro

  

nossa tradução

O respeito pela autonomia está enraizado nas tradições morais e políticas liberais da importância da liberdade e da escolha individuais. Na filosofia moral, autonomia pessoal refere-se à autogovernança pessoal: regramento pessoal de si pela compreensão adequada, mantendo-se livre de controlar interferências de outros e de limitações pessoais que impeçam a escolha. Autonomia significa liberdade da restrição externa e da presença de capacidades mentais críticas, como compreensão, intenção e tomada de decisão voluntária. O indivíduo autônomo age livremente de acordo com um plano escolhido por si próprio, análogo ao modo como um governo independente administra seus territórios e define suas políticas. Uma pessoa de autonomia diminuída, por outro lado, é sob algum aspecto controlada por outros ou incapaz de deliberar ou agir com base em seus desejos e planos.

Respeitar um agente autônomo é reconhecer, com a devida apreciação, as capacidades e perspectivas da pessoa, incluindo seu direito de ter certas visões, fazer certas escolhas e tomar certas ações com base em valores e crenças pessoais. A exigência moral de que respeitemos a autonomia das pessoas pode ser expressa como um princípio de respeito à autonomia que declara uma obrigação negativa e uma obrigação positiva. Como uma obrigação negativa, ações autônomas não devem ser sujeitas a restrições de controle por terceiros. Como obrigação positiva, esse princípio exige tratamento respeitoso nas trocas de informações e em outras ações que promovam a tomada de decisão autônoma.

Muitas ações autônomas não poderiam ocorrer sem a cooperação material de outras pessoas na disponibilização de opções. O respeito à autonomia obriga os profissionais de saúde e pesquisas envolvendo seres humanos a divulgar informações, a sondar e garantir a compreensão e a voluntariedade, além de promover a tomada de decisões adequada. O verdadeiro respeito requer mais do que mera não-interferência nos assuntos pessoais de outras pessoas. Isso inclui, pelo menos em alguns contextos, a construção ou manutenção das capacidades de outras pessoas para a escolha autônoma, ajudando a acalmar os medos e outras condições que destroem ou interrompem suas ações autônomas. O respeito, por esse motivo, envolve reconhecer o valor e os direitos de tomada de decisão das pessoas e capacitá-las a agir autonomamente, enquanto o desrespeito à autonomia envolve atitudes e ações que ignoram, insultam, humilham ou são desatentas aos direitos de autonomia de outras pessoas.

Muitos problemas de ética profissional dizem respeito a falhas no respeito à autonomia de uma pessoa, que vão desde a divulgação insuficiente de informações pertinentes até o não reconhecimento de uma recusa de intervenções médicas. Por exemplo, no debate sobre se pacientes autônomos e informados têm o direito de recusar intervenções médicas, o princípio do respeito à autonomia sugere que uma decisão autônoma de recusar intervenções deve ser respeitada. Embora não tenha sido até o final da década de 1970 que se prestou muita atenção aos direitos dos pacientes de recusar, não há razão para pensar que o respeito à autonomia, como agora entendido, é um princípio recém-adicionado em nossa perspectiva moral. Significa simplesmente que as implicações desse princípio não foram amplamente apreciadas até recentemente.

Problemas controversos com o princípio do respeito à autonomia, como com todos os princípios morais, surgem quando devemos interpretar sua importância para contextos particulares, determinar limites precisos de sua aplicação e decidir como lidar com situações em que ele entra em conflito com outros princípios morais. Muitas controvérsias envolvem perguntas sobre as condições sob as quais o direito à expressão autônoma de uma pessoa exige ações de outras pessoas, bem como perguntas sobre as restrições que a sociedade pode colocar legitimamente nas escolhas de pacientes ou sujeitos quando essas escolhas conflitam com outros valores. Se a restrição da autonomia do paciente estiver em ordem, a justificativa sempre estará em algum princípio moral concorrente, como beneficência ou justiça.

Original

Respect for autonomy is rooted in liberal moral and political traditions of the importance of individual freedom and choice. In moral philosophy, personal autonomy refers to personal self-governance: personal rule of the self by adequate understanding while remaining free from controlling interferences by others and from personal limitations that prevent choice. Autonomy means freedom from external constraint and the presence of critical mental capacities such as understanding, intending, and voluntary decision making. [1] The autonomous individual acts freely in accordance with a self-chosen plan, analogous to the way an independent government manages its territories and sets its policies. A person of diminished autonomy, by contrast, is in some respect controlled by others or incapable of deliberating or acting on the basis of his or her desires and plans.

To respect an autonomous agent is to recognize with due appreciation that person’s capacities and perspectives, including his or her right to hold certain views, to make certain choices, and to take certain actions based on personal values and beliefs. The moral demand that we respect the autonomy of persons can be expressed as a principle of respect for autonomy that states both a negative obligation and a positive obligation. As a negative obligation, autonomous actions should not be subjected to controlling constraints by others. As a positive obligation, this principle requires respectful treatment in informational exchanges and in other actions that foster   autonomous decision making.

Many autonomous actions could not occur without others’ material cooperation in making options available. Respect for autonomy obligates professionals in health care and research involving human subjects to disclose information, to probe for and ensure understanding and voluntariness, and to foster adequate decision making. True respect requires more than mere noninterference in others’ personal affairs. It includes, at least in some contexts, building up or maintaining others’ capacities for autonomous choice while helping to allay fears and other conditions that destroy or disrupt their autonomous actions. Respect, on this account, involves acknowledging the value and decision-making rights of persons and enabling them to act autonomously, whereas disrespect for autonomy involves attitudes and actions that ignore, insult, demean, or are inattentive to others’ rights of autonomy.

Many issues in professional ethics concern failures to respect a person’s autonomy, ranging from manipulative underdisclosure of pertinent information to nonrecognition of a refusal of medical interventions. For example, in the debate over whether autonomous, informed patients have the right to refuse medical interventions, the principle of respect for autonomy suggests that an autonomous decision to refuse interventions must be respected. Although it was not until the late 1970s that serious attention was given to the rights of patients to refuse, this is [38] no reason for thinking that respect for autonomy as now understood is a newly added principle in our moral perspective. It simply means that the implications of this principle were not widely appreciated until recently. [2]

Controversial problems with the principle of respect for autonomy, as with all moral principles, arise when we must interpret its significance for particular contexts, determine precise limits on its application, and decide how to handle situations in which it conflicts with other moral principles. Many controversies involve questions about the conditions under which a person’s right to autonomous expression demands actions by others, as well as questions about the restrictions society may rightfully place on choices by patients or subjects when these choices conflict with other values. If restriction of the patient’s autonomy is in order, the justification will always rest on some competing moral principle such as beneficence or justice. (p. 37-38)


Ver online : STANDING ON PRINCIPLES


[1H. Tristram Engelhardt, Jr., The Foundations of Bioethics (New York: Oxford University Press, 1996), 2nd edition; Jay Katz, The Silent World of Doctor and Patient (New York: The Free Press, 1984); James F. Childress, “The Place of Autonomy in Bioethics,” Hastings Center Report 20 (January/February 1990): 12-16; Rebecca Kukla, “Conscientious Autonomy: Displacing Decisions in Health Care,” Hastings Center Report (March-April 2005): 34-44.

[2Ruth R. Faden and Tom L. Beauchamp, A History and Theory of Informed Consent (New York: Oxford, 1986).